Dois anos após a histórica greve de 21 dias realizada em fevereiro de 2020, considerada a maior mobilização protagonizada pelos petroleiros desde maio de 1995, a categoria prepara novo embate contra a privatização
[Por Alessandra Murteira, da imprensa da FUP]
Terça-feira, 21 de janeiro de 2020. O dia amanhece quente em Araucária, região metropolitana de Curitiba. Petroquímicos da Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados (Fafen-PR) acampam na entrada da fábrica, em protesto contra a decisão da Petrobras de fechar a unidade e de demitir cerca de mil trabalhadores.
De norte a sul do país, a categoria petroleira se mobiliza, aprovando nas assembleias de base uma greve nacional a partir da zero hora do dia primeiro de fevereiro.
Sexta-feira, 31 de janeiro de 2020. Quatro dirigentes da FUP e um diretor do Sindiquímica-PR se dirigem à sede da Petrobras, no Rio de Janeiro, e, em reunião com o RH, cobram a suspensão das demissões na Fafen-PR e o cumprimento do Acordo Coletivo, cujas cláusulas estavam sendo sumariamente desrespeitadas. Sem retorno dos gestores, a representação da FUP ocupa a sala de reunião 01 do quarto andar do Edise.
Sábado, 01 de fevereiro de 2020. As unidades operacionais do Sistema Petrobras amanhecem em greve em todo o pais, com adesão crescente da categoria.
Há dois anos, petroleiros e petroleiras protagonizaram o primeiro grande enfrentamento da classe trabalhadora no governo Bolsonaro. Foram 21 dias de ocupação do Edise e de paralisações nas bases operacionais e 31 dias de ocupação na Fafen-PR. A categoria e as entidades sindicais resistiram às tentativas de criminalização do direito legítimo e constitucional de greve, enfrentando perseguições políticas, assédios, punições, demissões e retaliações para quebrar a organização dos trabalhadores.
Foi uma greve histórica e emblemática, que ganhou apoio nas ruas e nas redes sociais, em um movimento nacional de solidariedade à luta da categoria em defesa dos empregos, por preços justos para os combustíveis e contra as privatizações que sangram a Petrobras.
Leia também: #SomosTodosPetroleiros lidera assuntos mais comentados no Twitter
No terceiro dia de greve um grande acampamento foi montado pelos movimentos sociais em frente à sede da estatal, na Avenida Chile, no Rio, onde petroleiros, petroquímicos e diversas organizações populares permaneceram em vigília, dia e noite, até o final da greve, realizando diversas atividades em apoio e solidariedade à luta da categoria contra as demissões e em defesa da soberania energética.
As ações solidárias dos petroleiros, com doações e venda subsidiada de combustíveis a preço justos, tiveram início com a greve de fevereiro de 2020 e se transformaram em símbolo da luta que a FUP e seus sindicatos travam contra a política de preço de paridade de importação (PPI) que enriquece os acionistas da Petrobras e empobrece cada vez mais a população.
Leia também: Caravanas de todo Brasil chegam ao Rio de Janeiro para ato na sede da Petrobrás
No entanto, mesmo com a forte resistência da categoria e apesar das denúncias feitas pela FUP e seus sindicatos, a gestão da Petrobras seguiu adiante com o projeto de desmonte e desnacionalização da empresa. O fechamento da Fafen-PR impactou a vida de mil famílias de trabalhadores, que foram demitidos nos meses seguintes. Muitos deles até hoje ainda estão sem um emprego formal. O fechamento da fábrica também afetou a economia da região de Araucária e aumentou a dependência do Brasil das importações de fertilizantes nitrogenados.
Leia também: “Não eram cinco, eram 20 mil naquela sala”, afirma petroleira
Ao longo dos dois últimos anos, mesmo com a crise humanitária causada pela pandemia da Covid-19, o governo Bolsonaro intensificou o desmonte do Sistema Petrobras: vendeu refinarias, terminais, campos de petróleo e diversos outros ativos; privatizou integralmente a BR Distribuidora e acelerou a saída da empresa do Nordeste.
O resultado dessa política nefasta é o aumento do desemprego, o avanço da desindustrialização, o empobrecimento de municípios e estados brasileiros e a disparada dos preços dos combustíveis, o que fez a inflação saltar de 4,31% em 2019 para 10,06%, em 2021.
O preço médio do litro da gasolina, que beirava os R$ 4,50 em janeiro de 2020, hoje gira em torno de R$ 7,00, com o combustível ultrapassando esse valor em muitas regiões do país. O botijão de gás de cozinha, que custava em média R$ 85,00 no início de 2020, chega a ser comercializado hoje a R$ 130,00.
Nova greve no radar
O enfrentamento que os petroleiros e petroleiras fazem ao governo Bolsonaro e seus gestores na Petrobras traz em cada ação o capital político e o legado de resistência da greve de fevereiro de 2020.
No final de dezembro, a categoria aprovou parar por tempo indeterminado se o governo enviar ao Congresso Nacional um projeto de lei para privatização da Petrobras, como vem ameaçando desde outubro passado.
Bolsonaro chegou a declarar à imprensa que o projeto está sendo construído junto com o ministro da Economia, Paulo Guedes, e com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL).
“Eles que não tenham essa audácia, caso contrário responderemos à altura, como fizemos em fevereiro de 2020. Há dois anos, nos levantamento contra o fechamento da Fafen PR, assim como fizemos outras greves depois contra a venda das refinarias e a privatização da PBio. A categoria petroleira tem um histórico de luta e resistência, que nos faz referência nacional. Estamos em estado de greve e é bom que Bolsonaro esteja atento a isso”, avisa o coordenador geral da FUP, Deyvid Bacelar.