A engenheira geóloga Rosângela Buzanelli, eleita pelos trabalhadores para o Conselho de Administração da Petrobrás, comenta estudo recentemente repercutido pela mídia sobre o encolhimento nos quadros técnicos de empresas estatais de ponta, como a Petrobrás, e os impcatos na redução dos salários
[Do blog de Rosangela Buzanelli]
Na semana passada, algumas reportagens divulgadas pela imprensa falavam sobre o encolhimento do efetivo e a queda de salário dos trabalhadores da Petrobrás. Uma das matérias, baseada em dados do Panorama das Estatais, do Ministério da Economia, registra que cinco grandes estatais federais do país — Banco do Brasil, Correios, Caixa, Petrobrás e Eletrobrás — perderam mais de 111 mil empregados entre o início de 2015 e março deste ano.
A matéria informa ainda que as maiores baixas estão concentradas na Eletrobrás (-45,8%) – em vias de ser concedida à iniciativa privada – e na Petrobrás (-42%). A empresa petrolífera fechou 2020 com 41.485 empregados na holding e 49.050 no Sistema Petrobrás, com a previsão de saída de mais 6 mil trabalhadores ao longo deste ano.
Com relação à massa salarial, levantamento realizado pelo Instituto Latino-Americano de Estudos Socioeconômicos (Ilaese) constata que o salário médio anual dos trabalhadores da Petrobrás é um dos mais baixos entre as empresas concorrentes no mercado mundial de petróleo. A pesquisa comparou a renda dos empregados da Petrobrás com os da norueguesa Equinor, da britânica BP, da italiana Eni, da espanhola Repsol, da francesa Total e das chinesas Cnooc e Petrochina e a conclusão é que a cada ano aprofunda-se mais o abismo entre os salários da Petrobrás e de suas concorrentes. “Na última década, em todas as empresas consideradas no estudo, houve crescimento nominal da remuneração média dos trabalhadores. A única exceção foi a Total. Mas, enquanto na empresa francesa a retração dos salários foi de 9,94%, na Petrobrás a redução chegou a 37%. Ou seja, uma diferença quase quatro vezes maior”, destaca a pesquisa.
Ficou evidente no estudo a tendência de crescimento da remuneração nas empresas internacionais e a queda contínua da média salarial do trabalhador da Petrobrás, na última década.
Essa é a política governamental inaugurada em 2016 e acentuada em 2019, de redução do Estado. Política que se traduz nas instituições e empresas estatais federais, através do corte dos investimentos e privatizações, além da diminuição e desvalorização do corpo de funcionários que, ironicamente, são acompanhadas de discursos públicos de valorização dos trabalhadores e do aumento exponencial da remuneração variável da alta gestão.
Como argumentou o professor da Unicamp, o economista Márcio Pochmann, essa é a lógica da privatização, entregar ao capital internacional as empresas com menor custo e maior receita.
O corpo técnico das estatais é sabidamente bem preparado e uma mão de obra cobiçada pela iniciativa privada. No caso da Petrobrás, vários cursos de formação são necessários para complementar a formação acadêmica de seus técnicos, sejam de nível médio ou superior, administrativos ou operacionais.
Os cortes de centenas de funções especialistas (consultores técnicos), de salários e benefícios, levaram muitos a aderir aos Programas de Demissão Voluntária (PDV) que, em muitos casos, sequer respeitaram as datas de desligamento acordadas, acelerando unilateralmente a saída em até dois anos, descontinuando projetos em andamento e a transferência do conhecimento.
Essa lógica traz graves consequências para a Petrobrás, que perde mão de obra especializada e experiente, deixando uma lacuna na transferência do conhecimento e ameaçando o excepcional desempenho da empresa, que a alçou ao podium das maiores e melhores do mundo no setor, com vários prêmios internacionais. Esse capital intelectual não se adquire pronto, ao contrário, são décadas de investimento na formação e atualização desses profissionais que não devem ser descartados com base em critérios “contábeis”. Uma mão de obra muito especializada e cara que se transformou em mercadoria, muitas vezes vendida juntamente com um ativo, outras vezes tratada como balanço contábil: custo de indenização para demissão voluntária versus “economia” em salários e benefícios.
Uma visão míope que custará muito à Petrobrás e ao Brasil.