11ª Plenafup

“A transição energética é uma tentativa de resposta da sociedade para um problema global”, diz especialista do INEEP

Foto: Alessandra Murteira/FUP

Quarta mesa temática da 11ª Plenafup revela como crise climática aprofunda as desigualdades de gênero, de raça e de classe social

 [Por Rita Cardoso, da comunicação do Sindipetro RS]

A mesa 4, realizada na tarde do dia 28 de agosto na programação da 11ª PlenaFUP apresentou o tema da “Transição Energética Justa, Machismo, Racismo Energético e Ambiental”. Para falar sobre o tema foram convidados para a Mesa, que teve a mediação da presidenta do Sindipetro-RS, Miriam Cabreira, o Diretor Técnico do INEEP (Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis Zé Eduardo Dutra), Mahatma Ramos dos Santos, e Michelle Ferreti, do Instituto Alziras.

Abrindo as falas, o especialista do INEEP lembrou que em qualquer época, é sempre difícil conciliar o capitalismo com a democracia e, agora, num momento que se fala em transição energética, não é diferente. “O Instituto aborda a questão da transição energética justa a partir de como esses movimentos todos contribuem para se pensar a assimetria e desigualdades de um processo multifacetado e de alta complexidade na vida das populações atingidas pelas crises climáticas e os desafios para o movimento sindical a partir das transformações econômicas, sociais e ambientais que atingem o Brasil”, pontuou ele.

Mahatma, que é um dos autores do livro “Transição Energética: geopolítica, corporações, finanças e trabalho” disse que, de acordo com uma pesquisa realizada pelo INNEP com a CUT entre representantes do Estado, do setor público, da academia, de movimentos sociais e uma gama de atores nas regiões norte e nordeste do Brasil durante cinco anos para mapear os impactos que os atingidos pela crise climática já percebem, apontou as contradições e os interesses que se dão a partir da economia política e como esses interesses se mobilizam. Para ele, conhecer este cenário é importante para construir um diagnóstico, levantar hipóteses e entender o que está acontecendo.

Foto; Alessandra Murteira/FUP

Mahatma falou, ainda, de outra dimensão da transição energética justa, que passa pela organização dos trabalhadores. “É preciso estar atento, articulando de que forma a sociedade vai se organizar para passar por estas múltiplas transições, apesar da crise climática ser o principal vetor da transição energética há interesses econômicos gigantescos por trás deste processo de descarbonização. E a Petrobrás precisa pensar o processo de descarbonização de maneira séria”, acrescentou. O especialista lembrou que entre os principais desafios da Companhia está o de construir a concertação política e mediações em torno dos múltiplos interesses, alguns incompatíveis, especialmente para quem sempre ganhou com a destruição do meio ambiente. “O sul global pode garantir a construção de uma rota tecnológica mais orgânica, do hidrogênio verde, e o norte global sabe disso. Por isso, há restrição de financiamentos do norte para o sul global”.

Ele destacou que nesta transição o Brasil não pode ser mais uma vez virar exportador de commodity, mas construir um projeto nacional com pesquisa, inovação e desenvolvimento de ponta e, acrescenta, a Petrobrás tem condições de fazer isso como nenhum outro país.

CONCERTAÇÃO POLÍTICA

Um dos desafios destacado pelo técnico do INEEP é trabalhar a concertação política para a transição energética, fazendo o enfrentamento com o capital internacional, a burguesia nacional e negacionista climática, que não quer gastar com qualquer nível de investimento que não seja na exploração e produção de petróleo. Mas a Petrobrás, como a maior indústria brasileira, tem que ser a liderança e isso é uma responsabilidade da estatal, mas também do movimento sindical brasileiro. “Há uma real oportunidade política da FUP, dos petroleiros, do INEEP de ajudar a construir parâmetros desse novo desenvolvimento, uma tarefa importante para a categoria e suas entidades. Esse é o futuro da economia brasileira”, acrescentou.

Foto: Paulo Neves/FUP

Antes de finalizar, Mahatma frisou que a agenda da transição energética é uma tentativa de resposta da sociedade global para um problema global, que afeta de maneira desigual os territórios, as pessoas, o gênero, a raça, em um processo de reprodução das desigualdades que ocorre sempre que o capital está em crise. “O capital sempre se reinventa, promovendo reformas, guerras, e este momento não é diferente. Não há negacionismo, é uma situação imperativa na qual temos uma responsabilidade gigante. No Brasil, diferente do mundo, o grande vilão do efeito estufa é 75% o manejo e uso da terra, o agronegócio e desmatamento, enquanto a indústria é responsável por 11% das emissões. E se isso diz alguma coisa, é de que é o nosso papel é colocar os interesses dos trabalhadores, da população, comunidades quilombolas, indígenas e outros segmentos sociais na agenda da transição para buscar uma solução. É isso que o movimento sindical precisa reivindicar para uma transição justa”, finalizou.

Crise climática aprofunda as desigualdades de gênero, de raça e de classe social

A segunda palestrante da mesa, Michelle Ferreti, do Instituto Alziras (ONG que objetiva ampliar e fortalecer a presença de mulheres, em toda sua diversidade, na política e na gestão pública), iniciou sua fala lembrando a importância de incorporar a perspectiva de gênero e raça nos debates sobre a transição energética e lembrou que as conferências do clima são espaços importantes, mas são mediados por muitos interesses. Para ela, a atuação do movimento sindical nesta agenda é muito importante para uma transição justa.

Foto: Alessandra Murteira/FUP

Ela lembrou que o planeta é compartilhado, mas os efeitos do aquecimento global são diferentes para diferentes regiões e populações. “O que está havendo é um aprofundamento das desigualdades de gênero, de raça e de classe social, ampliando os abismos que já vivemos no mundo, por isso surgem uma série de conceitos como o racismo ambiental, porque as populações que estão nas periferias são as que mais sofrem. Justiça climática é outro exemplo, de um debate de fundo que vem sendo feito pelo movimento sindical, conectando a luta do racismo ambiental, com a questão fundiária do país e a soberania energética”. Ela lembrou que na tragédia climática do RS, as mulheres, por exemplo, são as que mais estão sendo afetadas e entre elas, a população negra. A sobrecarga aumentou e foram elas que perderam os empregos.

Uma realidade ainda difícil, num país que tem pessoas sem acesso à energia em suas casas, enquanto em outros, como a Alemanha, os sindicatos conseguiram compromisso do estado de zero demissões frente a transição energética e o compromisso de que, se o trabalhador perder o emprego, o estado alemão assumirá a recolocação ou a diferença salarial que possa vir a ocorrer. Acrescentou que o Brasil tem uma oportunidade política e geopolítica, para construir uma agenda em torno de uma industrialização, uma oportunidade de construir relações diplomáticas. “O ano que vem o Brasil sedia a COP 30 e ninguém melhor do que os petroleiros, a Petrobrás, para fazer este debate. Só a categoria petroleira tem condições de olhar para essa questão além dos seus próprios interesses, olhando para os demais trabalhadores e por uma transição justa para todo mundo”, finalizou.

POSSIBILIDADE DE AVANÇAR NO DEBATE

Durante as falas dos participantes, foram muitas as colocações dos petroleiros e petroleiras sobre o tema. A presidenta do Sindipetro-RS, Miriam Cabreira, que participou representando a FUP da reunião do Clima, em Dubai, em 2023, lembrou a dimensão do debate. Para a dirigente, há muitos aspectos para o mundo do trabalho e o movimento sindical debater sobre a transição energética. Ela alertou que crise climática é uma bandeira invocada para justificar a emergência da transição, mas o que há, acrescentou, é uma disputa pela nova fronteira do desenvolvimento tecnológico. “No norte global, como nos EUA, Alemanha e Espanha, os trabalhadores fazem parte dos planos de transição energética, e no Brasil, no sul global, estamos lutando para manter as empresas estatais frente a uma bandeira de desestatizar para descarbonizar, um projeto de privatização que quer manter o sul global em uma estrutura de trabalho de colônia e colonizados. Quando descobrimos o pré-sal, tivemos como exemplo a Noruega para utilização dos recursos desta riqueza e sofremos um golpe e foi muito difícil enraizar este discurso importante na sociedade. Na transição energética temos uma possibilidade de avançar no debate com a sociedade”, finalizou ela.