Desde que o reajuste dos combustíveis começou a ser vinculado à equivocada política de Preço de Paridade de Importação (PPI), implementada no governo Michel Temer, em outubro de 2016, e mantida por Bolsonaro, os brasileiros, sobretudo os mais pobres, foram perdendo seu poder de compra, com aumentos desenfreados nos preços da gasolina, do diesel, do gás de cozinha (GLP).
O PPI reajusta os preços tendo como parâmetro a variação do dólar, o preço do barril do petróleo no mercado internacional e custos de importação de derivados.
Levantamentos do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese/subseção Federação Única dos Petroleiros-FUP), com base em preços acompanhados pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), comprovam que, entre janeiro de 2019 e dezembro de 2022, ou seja, durante a gestão bolsonarista, a relação entre poder aquisitivo do salário mínimo e compra de combustíveis perdeu fôlego. Nesse período, o preço do gás de cozinha aumentou 62% para o consumidor, passando de R$ 69,20 o botijão para R$ 112,13, em média. Com isso, o GLP subiu mais do dobro da inflação, fazendo com que as famílias mais carentes lançassem mão de lenha para cozinhar.
O mesmo ocorreu com o diesel, que teve aumento de 95%, em média, com impactos diretos sobre o custo do frete e, consequentemente, sobre a inflação de alimentos, que acumulou altas recordes no pós plano Real. Enquanto isso, o salário mínimo, sem ganho real, teve reajuste de 21,4% no período.
Em paralelo, a Petrobrás, com gordos lucros nos últimos anos, sustentados em grande parte pela alta nas receitas de venda de derivados, distribuiu mega dividendos a acionistas, sobretudo acionistas minoritários estrangeiros.
Agora, com a eleição do presidente Lula, uma nova era se instaura na Petrobrás.
Jean Paul Prates, aprovado pelo conselho de administração da empresa para o comando da estatal, possui vasta experiência nas áreas de petróleo, gás, energia renovável e meio ambiente. Sua gestão estará comprometida com o crescimento e a retomada do papel da Petrobrás como indutora do desenvolvimento econômico e social do país.
Nessa direção, propostas defendidas pela FUP foram apresentadas pelos petroleiros ao presidente Lula e ao novo presidente da Petrobrás. Entre elas, o fim do PPI, com a adoção de mecanismo de reajuste de preços que leve em conta os custos em reais da produção de petróleo – o que o presidente Lula chama de ‘abrasileirar’ os preços dos combustíveis -, suspensão das privatizações de ativos da Petrobrás, e investimentos no parque de refino, a fim de ampliar a capacidade de processamento de derivados de petróleo do país.
Ao lado de Prates, participei do Grupo de Trabalho de Minas e Energia do governo de transição. Lá, foram sugeridas medidas para a implementação de uma política de preços justos para os combustíveis, que tenha como parâmetro de preços não só o mercado internacional, mas também os custos e a sustentabilidade da indústria nacional. O gás de cozinha, a gasolina e o óleo diesel devem ter tratamento diferenciado, devido à importância destes itens no custo de vida da família brasileira.
A implantação de um estoque regulador de derivados; a criação de um imposto sobre exportação de petróleo cru, de modo a capitalizar um fundo moderador dos preços de derivados (com a participação da sociedade e dos trabalhadores na gestão) e o fim da do PPI são elementos da política de preços defendida pela FUP.
A FUP ratificou suas propostas na primeira reunião (no último dia 27), que teve com Prates, após ele ter sido aprovado na presidência da Petrobrás. Entendemos que a Petrobrás deve paralisar todas as privatizações de ativos em andamento e constituir um processo de investigação com ampla participação da sociedade para analisar os movimentos de venda realizados nos últimos cinco anos. Nesse contexto, criamos um calendário de reuniões para a apresentação de contribuições da FUP para a construção de um novo Plano Estratégico para a Petrobrás.
O Estado brasileiro deve criar as condições para a construção de uma Petrobrás 100% pública, em que a União detenha a totalidade do capital social, tendo como foco principal a retomada das ações alocadas na Bolsa de Valores de Nova Iorque. É importante também voltar a ter uma empresa integrada, com atuação em todo o território nacional, com o retorno de investimentos em tecnologia, pesquisa e inovação, privilegiando parcerias com as universidades públicas.
Sabemos que são enormes os desafios para o cumprimento dessa agenda, principalmente diante dos interesses do capital financeiro. Mas esta é uma agenda possível e necessária para recuperar o protagonismo da estatal na economia brasileira, na indústria nacional. Lembrando que foi nos governos do PT que a Petrobrás se consolidou como uma empresa integrada de energia, atuando do poço ao poste, com investimentos crescentes também em energias renováveis.
[Por Deyvid Bacelar, coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros]