Em entrevista à Rede Brasil Atual, o economista Cloviomar Cararine, técnico do Dieese que assessora a FUP, explicou que preços importados não fazem o menor sentido num país que está entre os dez maiores produtores de petróleo do planeta
[Da redação da CUT, com informações da RBA]
O ex-presidente Lula vem dizendo com mais frequência nos útlimos dias que, se, se eleito neste ano, vai “abrasileirar” os preços dos combustíveis. Lula tem insistido no tema, em especial desde o último mega-reajuste promovido pela Petrobras, em 10 de março.
Para justificar o reajuste, a Petrobras alegou a disparada dos preços internacionais dos combustíveis provocada pela guerra da Rússia contra a Ucrânia, mas o fato é que os reajustes vêm acelerando desde 2016, quando a estatal adotou a Política de Preços Internacionais (PPI), que usa o valor internacional dos barris de petróleo, que é cotado em dólar, como referência para aumentar os preços no Brasil.
O repórter Tiago Pereira, da RBA, foi ouvir o economista Cloviomar Cararine, da subseção do Dieese na Federação Única dos Petroleiros (FUP), para entender como é possível “abrasileirar” os preços dos combutíveis. De acordo com o economista, “abrasileirar” os preços dos combustíveis é ter uma Petrobras fortalecida, e não fatiada.
“É preciso ter uma presença estatal forte no setor, produzindo petróleo com um custo menor”, disse Cloviomar, que defende, por exemplo, a reversão da privatização da BR Distribuidora e das refinarias. “Para que possamos ter, da produção ao refino, até a distribuição, numa só empresa estatal, para que o Estado possa proteger a população, com preço menor”.
Não faz o “menor sentido”, segundo o economista, um país que está entre os dez maiores produtores de petróleo se comportar como se importasse todo o combustível consumido. O parque de refino brasileiro também está entre os maiores do mundo. E 94% do petróleo refinado no país é de origem nacional, segundo estudo divulgado pela FUP. Além disso, os custos de extração e refino caíram 8,5%, nos últimos três anos. Em dólares, a queda nos custos de produção do barril de derivados chega a 32%.
“Nos países que são grandes produtores de petróleo, a política é sempre orientada para proteger a população, reduzindo o preço ao consumidor. Basta pegar, por exemplo, o que está acontecendo agora nos Estados Unidos”, disse Cloviomar Cararine, de acordo com a reportagem. O governo estadunidense anunciou nesta semana que vai liberar 30% das suas reservas estratégicas para tentar conter a alta do petróleo no mercado internacional.
“No caso brasileiro a gente viu o absurdo do governo anunciar aumento da produção de petróleo, segundo o ministro de Minas e Energia, mas a intenção não é reduzir o preço na bomba. O objetivo é aumentar a produção pra exportar pros americanos”, criticou Cararine. “O Brasil nesse caso é uma jabuticaba. Tem condição de ter um preço menor, mas não faz isso”
Custos em reais, venda em dólar
Uma das funções do PPI, de acordo com Cararine, é justamente tornar as refinarias da Petrobras atraentes para eventuais compradores. O petróleo extraído pela própria Petrobras, quando é repassado às refinarias, é cotado em dólar. “Hoje a refinaria ‘compra’ petróleo da Petrobras a preço internacional, com a influência do dólar. Não era pra isso acontecer. Isso só acontece por conta dessa estratégia de praticar preços internacionais pra poder favorecer a venda das refinarias.
Ao mesmo tempo, os custos de produção, segundo o especialista, são quase 100% em reais. “Porque você utiliza os trabalhadores do Brasil, que recebem reais. Nas refinarias, todo o seu custo de energia elétrica, água, bem como os impostos, são em reais”, afirmou. “Como os custos de produção e refino vem caindo, a gente deveria ver nesse momento uma redução do preço da gasolina, do diesel. E isso não acontece.”
Cloviomar Cararine também cita, com base em relatório da Agência Nacional de Petróleo (ANP), que o Brasil precisaria de pelo menos mais três refinarias de grande porte. É preciso ampliar principalmente a capacidade de refino do diesel, já que 30% do combustível consumido no país é importado. Ele lembra que desde 1997, com a Lei do Petróleo aprovada durante o governo FHC, o capital privado pode atuar no refino. No entanto, “nenhuma outra empresa, além da Petrobras, construiu refinarias nesse país”, ressaltou. “Porque se trata de um investimento altíssimo, e quem faz é o Estado. Portanto, é o Estado que deveria gerir depois”.
Embate político
De acordo com Cararine, resgatar a Petrobras como empresa integrada, “do poço ao posto”, passa pelo enfrentamento político aos acionistas da estatal. Porque tanto a venda de ativos como a dolarização dos preços dos combustíveis garantiram lucros exorbitantes para esses grupos nos últimos anos. No último ano, a rentabilidade da Petrobras é a segunda maior do mundo, atrás apenas da saudita Aramco.
“Vale destacar que 40% desses acionistas são estrangeiros. Mas os investidores hoje têm o controle do Conselho de Administração da Petrobras. É o mercado que dirige a estatal. Então eles não vão querer abrir mão desses lucros imensos”, afirmou.
Outro empecilho é o próprio governo, segundo ele. “A leitura que esse governo faz, e isso já vem desde o Temer, é que setor de petróleo que tem que ser concorrente. Só que não existe concorrência nesse setor em lugar nenhum do mundo”, criticou. “O Estado hoje encara a economia como se fosse um mercado, todos em concorrência. Mas não é assim. Essa é a outra grande dificuldade que a gente precisa enfrentar”.