Demandas históricas negligenciadas

FUP denuncia omissões e cobra respostas da Petrobrás em reunião da Comissão de SMS de 2025

Em meio a um cenário crítico para a segurança operacional e o bem-estar dos trabalhadores e trabalhadoras da Petrobrás, a Federação Única dos Petroleiros (FUP) e seus sindicatos participaram de reunião da Comissão Corporativa de Saúde, Meio Ambiente e Segurança (SMS), realizada no dia 25 de abril com gestores do RH da empresa. Representantes da categoria de várias bases do país reforçaram a urgência de respostas concretas às demandas históricas negligenciadas.

 

Entre os principais pontos da pauta (confira documento abaixo), destacaram-se questões como a piora nas condições dos casos de saúde mental entre os trabalhadores e trabalhadoras, a falta de efetivo, a precarização dos treinamentos e falhas nos exames ocupacionais. A FUP cobrou medidas efetivas da Petrobrás, acusando a empresa de inércia diante de problemas estruturais que vêm se acumulando há anos. “Desde os governos anteriores, vemos a dificuldade de termos avanços concretos nessas pautas. E agora, com as recentes fatalidades e acidentes graves, como a explosão na plataforma Cherne 1, fica evidente que algo precisa mudar com urgência”, afirmou Cibele Vieira, diretora da FUP.

 

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A fala mais comovente da reunião veio de Sérgio Borges, diretor da FUP e coordenador geral do Sindipetro NF, que se pronunciou visivelmente emocionado e profundamente abalado com os impactos do recente acidente na plataforma. “O clima é de insegurança nas plataformas da Bacia de Campos, de tristeza em ver mais uma vez diversos trabalhadores acidentados, feridos, numa explosão seguida de incêndio numa plataforma da Petrobrás”, declarou. Sérgio relatou com pesar que trabalhadores tiveram que atravessar fogo e fumaça porque rotas de fuga estavam interditadas. Um deles, já ferido, precisou se lançar ao mar para sobreviver. “E para piorar, o resgate dele foi extremamente dificultado por conta de problemas no bote de resgate, que deveria estar funcionando, e não estava. Mais uma vez, dirigentes sindicais têm que lidar com a dura tarefa de atender um familiar e dizer que seu ente querido está na lista dos acidentados.”

 

A emoção se transformou em revolta quando Sérgio apontou que o acidente não foi um caso isolado, mas resultado de um “padrão de sucateamento” das plataformas. “É a falta de efetivo que a gente denuncia, que sobrecarrega os trabalhadores, são os problemas de treinamento e os contratos horríveis que a empresa tem feito. Basta. A gente não pode mais tolerar esse tipo de coisa. A saúde e a vida dos trabalhadores têm que ser prioridade para essa empresa”, afirmou. Borges concluiu com um apelo direto à gestão da estatal: “Se a Petrobrás não parar com o que causa queimadura e com o que causa morte, quem vai parar somos todos nós, trabalhadores e trabalhadoras.”

 

Em sua fala durante a reunião, o assessor jurídico Adilson destacou a postura recorrente da Petrobrás em relação à apuração de acidentes, comparando a situação atual com o ocorrido no acidente da P-36, em 2001. “Normalmente, a postura da Petrobrás foca nas causas e não nos efeitos. E aí, mais uma vez, fazemos história. Precisamos lembrar do acidente da P-36, onde os trabalhadores tiveram que entrar com uma ação judicial para garantir a participação das entidades sindicais na apuração do acidente. E agora, mais uma vez, estamos vendo o futuro repetir o passado. Após aquela ação, foi construída uma liminar para permitir a participação na apuração do acidente, mas mesmo assim seguimos sempre com dificuldades, como a falta de acesso a documentos”, afirmou Dr. Adilson.

 

Saúde mental tem impacto direto na vida laboral dos trabalhadores

 

A FUP exige a retomada e ampliação do programa de saúde mental da companhia, incluindo as subsidiárias como a Transpetro e a PBio. A federação propõe a incorporação de indicadores psicossociais na política de prevenção, além de apoio aos trabalhadores transferidos compulsoriamente que enfrentam sofrimento psíquico.

 

O diretor da FUP, Paulo Neves, destacou que é fundamental retomar as pesquisas de ambiência que haviam sido prometidas desde maio de 2023, com a inclusão de temas como saúde física e mental, ergonomia, condições sanitárias e exposição a riscos. “Tudo isso precisa ser avaliado dentro dessas pesquisas, porque tem impacto direto na vida laboral dos trabalhadores”, afirmou. Ele defende ainda que essa pesquisa esteja incluída como meta de desempenho de todos os gestores da Petrobrás, como forma de comprometê-los com a qualidade do ambiente de trabalho.

 

Paulo Neves também lembrou que a última revisão da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1) elevou os riscos psicossociais ao mesmo patamar dos demais riscos de trabalho, o que exige, segundo ele, uma postura compatível por parte da empresa. “Essa equivalência precisa ser tratada com seriedade, não apenas na Petrobrás, mas também nas subsidiárias, que devem criar programas específicos de saúde mental”, reforçou. O diretor ainda fez um alerta sobre os impactos profundos nos trabalhadores transferidos: “Muitos enfrentam isolamento geográfico, saudade da família e até xenofobia nos novos ambientes. Isso precisa ser tratado com humanidade.”

 

Em resposta às cobranças da FUP, a Petrobrás informou que está promovendo um evento nos dias 29 e 30 de abril, no Centro de Pesquisas da companhia, com foco em temas como saúde mental no ambiente de trabalho, ergonomia e a nova NR-1, que passou a reconhecer os riscos psicossociais como equivalentes aos demais riscos ocupacionais. Segundo a empresa, o evento contará com duas palestras — uma interna e outra com especialista externa — e pretende abrir espaço para o debate com os representantes sindicais. A Petrobrás também comunicou que o Ministério do Trabalho e Emprego publicou oficialmente a cartilha sobre a nova Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1) e destacou que o padrão interno de ergonomia da companhia já contempla aspectos como organização do trabalho e exigências cognitivas — temas que serão aprofundados durante o evento promovido pela empresa.

 

Representantes da FUP cobraram a implementação integral e imediata das diretrizes da NR-1, especialmente para os novos temas. Segundo os dirigentes sindicais, algumas dúvidas que ainda persistiam foram esclarecidas apenas com o lançamento da cartilha de autoria do Ministério. Como a cartilha foi divulgada apenas na véspera da reunião, isso acabou atrasando a aplicação de alguns pontos da norma. Ainda assim, foi reforçada à empresa a urgência em adotar todas as medidas previstas. A empresa divulgou que a pesquisa de ambiência, que foi uma cobrança da FUP, vai começar nos próximos meses de maio e junho e todos os trabalhadores vão poder responder.

 

Efetivo insuficiente compromete a segurança

 

A falta de efetivo foi mais uma vez apontada como um dos principais fatores de risco à segurança operacional na Petrobrás. Um exemplo citado foi o caso de um empregado na Repar que, sozinho, acumulou 1.700 horas extras em apenas um ano — um retrato alarmante da carência de efetivo. A FUP alertou que a reposição por meio de concursos públicos tem sido insuficiente diante do alto número de saídas motivadas por aposentadorias, planos de demissão e transferências, gerando sobrecarga nos trabalhadores remanescentes. A federação também denunciou falhas no chamamento regional de concursados e cobrou a reprimeirização de áreas estratégicas ainda operadas por empresas terceirizadas.

 

A Petrobrás se comprometeu a organizar fóruns permanentes para debater o tema junto aos gestores das áreas, com participação das entidades sindicais, incluindo representantes das subsidiárias, como Transpetro e PBio. A expectativa é que esses espaços contribuam para a construção de soluções concretas, reais e estruturadas para o problema crônico da falta de efetivo.

 

Caso FAFEN PR: infraestrutura de emergência insuficiente coloca trabalhadores em risco

 

Outro ponto grave levantado pela FUP durante a reunião foi a situação da Fafen Paraná, recentemente reaberta, que enfrenta sérios problemas em sua infraestrutura de emergência. De acordo com a federação, a unidade está sem ambulância e sequer dispõe de um ambulatório minimamente equipado com os recursos básicos necessários para a realização de um resgate adequado em caso de acidente. A falta de equipamentos essenciais, como materiais de primeiros socorros e uma ambulância funcional, expõe os trabalhadores a um risco ainda maior. A FUP exigiu providências imediatas por parte da Petrobrás para garantir condições de segurança nas unidades operacionais.

 

FUP denuncia práticas de assédio e gestão autoritária

 

Durante a reunião, os diretores da FUP também denunciaram práticas recorrentes de assédio moral dentro da Petrobrás, destacando que, em muitos casos, ferramentas como o GD (Gestão de Desempenho) têm sido utilizadas como instrumentos de pressão e punição. A federação criticou duramente o modelo de gestão adotado pela companhia, que, segundo os dirigentes, perpetua um ambiente nocivo à saúde mental dos trabalhadores. “Os mesmos gestores que contribuíram para o adoecimento psicológico da força de trabalho seguem ocupando cargos estratégicos, como se nada tivesse acontecido”, apontaram. Como exemplo, relataram o caso recente de uma reunião em uma termelétrica, na qual um supervisor declarou abertamente não concordar com a política de gestão humanizada da empresa — sem qualquer contestação por parte da gerente de RH presente no encontro. Para a FUP, esse tipo de postura evidencia a conivência da gestão com práticas autoritárias e reforça a urgência de mudanças profundas na cultura organizacional da Petrobrás.

 

Treinamentos ineficazes e risco à segurança

 

Durante a reunião, Miriam Cabreira, diretora da FUP que coordena a pasta de SMS, também criticou o modelo atual de treinamentos adotado pela Petrobrás, apontando que muitos são oferecidos em formato de Ensino a Distância (EAD) e em horários inadequados, o que compromete sua efetividade. Alertou que esses cursos, muitas vezes, são realizados durante o expediente, com o trabalhador simultaneamente responsável por seu posto de trabalho — o que inviabiliza a devida dedicação ao conteúdo. “O trabalhador precisa estar totalmente focado no curso, sem rádio, sem interferências, e não acumulando funções enquanto tenta se capacitar.”.

 

A federação defendeu que treinamentos voltados à área operacional, como os de espaço confinado, brigada de emergência e outros cursos normativos, devem ser realizados presencialmente, com a presença de instrutores especializados, para garantir a elucidação de dúvidas e efetiva assimilação dos conteúdos. Em resposta, a Petrobrás se comprometeu a reorientar as áreas internas quanto à necessidade de garantir exclusividade de tempo para os treinamentos, além de retomar o formato presencial para os cursos técnicos e operacionais considerados mais sensíveis.

 

Denúncias sobre exames periódicos e punições

 

Outro ponto sensível foi a denúncia de punições indevidas a trabalhadores com atrasos nos ASOs (Atestados de Saúde Ocupacional). A FUP qualificou como “inadmissível” a prática de advertências mesmo quando os exames foram agendados com antecedência. A diretora da FUP Nalva Faleiro abordou uma série de preocupações relacionadas à saúde e segurança dos trabalhadores, destacando a falta de um plano de ação específico para lidar com problemas identificados nas atividades laborativas. “Não há um plano de ação eficaz para os casos que envolvem questões de saúde e segurança. Isso se reflete, por exemplo, nas clínicas contratadas para realizar os exames periódicos, que muitas vezes são de baixa qualidade. Um exemplo claro disso está nas audiometrias realizadas em Minas Gerais, que indicaram perda auditiva, mas as clínicas alegaram erro nos exames”, explicou Nalva.

 

Ela também criticou a postura punitiva adotada pela empresa, citando recente divulgação da empresa que orientava a punição de trabalhadores por atraso nos exames periódicos. “Ficamos surpresos com a divulgação, pois, em uma reunião recente da Comissão de SMS, nada foi mencionado sobre isso. Além disso, a gestão passou a ter ferramentas para perseguir os trabalhadores após a publicação do documento”, afirmou. Nalva questionou a filosofia punitiva adotada pela Petrobrás, ressaltando que a empresa deveria adotar uma política mais proativa e humanizada para garantir que os trabalhadores tivessem os meios necessários para realizar seus exames dentro do prazo, sem punições. “A saúde e segurança devem ser tratadas com seriedade, e não com uma abordagem punitiva centrada em penalidades. A empresa precisa agir para resolver os problemas operacionais que estão dificultando a realização desses exames”, concluiu.

 

Tezeu Bezerra, diretor da FUP finalizou sinalizando que a base dos problemas apresentados durante a reunião revela um ponto crítico: a necessidade de responsabilização da Petrobrás por suas próprias ações normativas. Na prática, as determinações da empresa não são padronizadas ou devidamente aplicadas pelos gestores nas unidades operacionais, o que evidencia falhas graves de gestão. Os diretores da FUP enfatizaram que o padrão atual precisa ser urgentemente revisto e, acima de tudo, cumprido.

 

Os diretores da federação também reforçaram a cobrança pelo cumprimento do Acordo Coletivo de Trabalho (ACT), que assegura a participação dos trabalhadores nas comissões de investigação de acidentes, mas que tem sido sistematicamente desrespeitado. “Estamos lidando com falhas que colocam a vida de nossos colegas em risco”, alertaram. A FUP afirma que seguirá pressionando a gestão da Petrobrás até que as reivindicações deixem de ser tratadas apenas no discurso e passem a se concretizar em políticas reais e eficazes para a proteção da vida, da saúde e da dignidade dos trabalhadores e trabalhadoras da companhia. A Petrobrás, por sua vez, ficou de apresentar uma resposta formal às novas cobranças.