Em nota divulgada em seu blog, a representante dos trabalhadores no Conselho de Administração da Petrobrás, Rosângela Buzanelli, chama a atenção para a correlação entre as medidas paliativas que não atacam o PPI e o discurso de privatização da empresa
[Por Rosângela Buzanelli]
Revisitemos a história recente. Alvo da cobiça internacional, especialmente após a descoberta do pré-sal, a Petrobrás foi um dos principais focos do golpe de 2016. Temer então nomeia para a presidência da empresa o rei do apagão, Pedro Parente, que imediatamente adota o PPI (Preço de Paridade de Importação) para o petróleo e seus derivados, além de outras medidas combinadas com o Congresso no sentido de fatiar e entregar as riquezas descobertas e construídas pela estatal.
Mantido o PPI pelo atual governo, aliado à alta no valor do barril do petróleo com o reaquecimento da economia mundial, associado ao descontrole do câmbio, os preços no Brasil, país produtor e exportador de petróleo, dispararam. Baseados na paridade de importação e não nos custos reais, os preços estão instáveis e altíssimos, afetando a economia e fomentando a alta da inflação.
Um quadro desesperador para milhões de brasileiros, que não suportam mais o alto custo de vida, onde os principais atores políticos do país ensaiam, em perfeita harmonia orquestral, a sinfonia da privatização da Petrobrás como “solução” para os altíssimos preços dos combustíveis e do gás de cozinha.
Nesse cenário de caos econômico, social, sanitário e ambiental, que Bolsonaro e sua equipe mergulharam o Brasil, envolvendo a alta dos combustíveis e da inflação, o presidente declarou à imprensa, na semana passada, que tem “vontade” de privatizar a Petrobrás. O seu vice, Hamilton Mourão, afirmou pouco depois que concorda com a venda da companhia “no futuro”. O “gênio” da economia, Paulo Guedes, já havia deixado bem claro seu desejo de negociar a Petrobrás e cogita perder o frágil controle governamental da empresa, negociando suas ações ordinárias para “fazer programas sociais”, afinal, 2022 está chegando. E os presidentes da empresa combatem o “controle” de preços com exemplos que demonstram o contrário do que tentam provar.
Com críticas frequentes à alta dos combustíveis, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, declara ser favorável à venda da empresa. Aprovou na semana passada na Câmara uma questionável, econômica e juridicamente, proposta eleitoreira para “abaixar” os preços atacando os impostos estaduais, em sintonia com a “vontade” presidencial, inalterados há anos, cuja ineficácia será comprovada rapidamente porque o problema dos preços é estrutural.
Mas privatizar a Petrobrás não é uma tarefa tão fácil, é preciso convencer a opinião pública. Como a Petrobrás tem uma relação história muito forte e simbólica com o povo brasileiro, pois por ele foi criada e a ele bem serviu por mais de 60 anos, marcando presença em todo o país com programas socioambientais e culturais amplos e importantíssimos, logicamente sempre foi defendida por essa população. O governo FHC tentou e não conseguiu privatizar a Petrobrás em função da reação popular, mas pavimentou, junto ao Congresso, vias legais para sua destruição enquanto estatal.
Era preciso, então, destruir essa relação de décadas para privatizá-la com algum apoio popular e sem prejuízo eleitoral. A sinfonia começa com a Lava Jato, apoiada pela grande mídia, que se encarrega de imprimir na empresa o carimbo de corrupta. Até hoje quando se fala em corrupção no Jornal Nacional, o pano de fundo são dutos enferrujados jorrando dólares, mesmo que os envolvidos não tenham nenhuma relação com petróleo.
A partir de Temer, e mais intensamente com Bolsonaro, a empresa passa a ser gerida como se privada fosse. Vira as costas para sua missão original, de servir o Brasil e a sociedade brasileira, e passa a almejar o insaciável apetite dos grandes acionistas privados.
Com o PPI, a gestão da empresa esfola a população brasileira, no melhor “estilo Guedes”, e engorda, indecentemente, os dividendos dos seus acionistas que são, importante fato, em sua maioria, fundos de investimentos estrangeiros. O Estado brasileiro, acionista controlador e não majoritário, fica com cerca de um terço desses dividendos.
Com essa política, o discurso da privatização se torna muito mais palatável para a população que não vê retorno de sua estatal e se descobre prejudicada pelos preços dos derivados e gás de cozinha, enquanto fartos dividendos são patrocinados e pagos também às suas custas.
O discurso do presidente da República de que não pode interferir nos preços é só mais uma falácia, pois enquanto acionista controlador, o governo tem maioria no Conselho de Administração, que nomeia a diretoria e define os preços nas refinarias, a partir da diretriz governamental.
A Petrobrás foi criada pelo povo brasileiro para descobrir, produzir, refinar e abastecer o Brasil de petróleo e derivados. Superou em sua trajetória gigantescos desafios e cumpriu brilhantemente sua missão. Hoje somos um país produtor e exportador de petróleo. Conquistamos a autossuficiência que nos libertou da dependência das importações, meta de todo país que busca se tornar energeticamente soberano. Produzimos, a custos muito mais baixos que os internacionais, a absoluta maioria dos derivados que consumimos, importando pequena parcela. Portanto, não precisamos pagar preços de importação. É inquestionavelmente possível praticar preços mais justos e acessíveis à população brasileira.
A Petrobrás é do povo brasileiro, não do governo de plantão. E enquanto operou como estatal sempre garantiu o abastecimento do país a preços mais justos, cumprindo seu papel de indutora do desenvolvimento nacional e gerando lucro. A solução para os preços dos combustíveis e do gás de cozinha não é privatizar a empresa, ao contrário, é fortalecer a Petrobrás enquanto estatal brasileira, gerindo-a como tal, com a missão de servir ao Brasil e aos brasileiros.