As ocorrências cada vez mais frequentes de acidentes nas refinarias, plataformas e terminais remontam aos anos de 1990, quando as gestões neoliberais da Petrobrás cortaram investimentos, reduziram drasticamente os efetivos e terceirizaram atividades essenciais, em meio ao desmonte da empresa. A história se repete, desta vez intensificada pelas privatizações
[Da imprensa da FUP|Foto: Tania Rego/Agência Brasil]
Em menos de 48 horas, dois trabalhadores perderam a vida em acidentes na Petrobrás, evidenciando a insegurança crônica que coloca diariamente em risco a categoria nas unidades operacionais. O primeiro óbito ocorreu no sábado, 25, durante um treinamento de lançamento de bote de serviço na embarcação Astro Tamoio, que atende a Bacia de Campos. O cabo do bote rompeu quando três trabalhadores da empresa Astromarítima participavam da simulação. Erick Gois, de apenas 26 anos, ficou preso e não resistiu aos ferimentos. Os outros dois trabalhadores foram resgatados e passam bem.
Na segunda-feira, 27, outro acidente, desta vez na Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, causou a morte de um instrumentista da QWS, durante a manutenção de um equipamento na Unidade de Ar Comprimido da Casa de Força. Segundo o Sindipetro PE/PB, o trabalhador, que estava há apenas seis meses na refinaria, foi atingido por ar comprimido em alta pressão.
Tanto o Sindipetro NF, quanto o Sindipetro PE/PB cobraram participação nas comissões de investigação dos acidentes.
As ocorrências cada vez mais frequentes de incidentes e acidentes nas refinarias, plataformas e terminais remontam aos anos de 1990, quando as gestões neoliberais da Petrobrás cortaram investimentos, reduziram drasticamente os efetivos e terceirizaram atividades essenciais, iniciando um processo de desmonte, que só foi estancado ao longo dos anos 2000, com a retomada dos concursos públicos e a reestruturação da empresa.
Entre 1995 e 2002, os acidentes no Sistema Petrobrás mataram 179 trabalhadores, dos quais 138 eram terceirizados, segundo levantamento da FUP e sindicatos. Entre os mortos, estão os 11 trabalhadores da P-36, plataforma que afundou em março de 2001 e que se transformou em símbolo do desmonte da Petrobrás naquela época.
Tragédias como a da P-36 poderiam ter sido evitadas, como a FUP e seus sindicatos sempre alertaram, ao denunciar os impactos que o processo de desmantelamento da empresa causam na vida dos trabalhadores, nas comunidades vizinhas e no meio ambiente. A história novamente se repete e agora ainda mais grave, diante da dimensão das privatizações que já foram feitas e das que estão em curso.
O risco iminente de um grande acidente ampliado nas instalações da Petrobrás aumenta a cada dia, como comprova um estudo realizado pelo corpo gerencial da empresa, ao qual a FUP teve acesso em junho. No estudo, as próprias gerências alertam para os riscos de acidentes operacionais e de danos aos trabalhadores e ao meio ambiente, em consequência de “problemas operacionais por falta de pessoal ou por falta de capacitação das pessoas”.
O levantamento aponta questões graves que a FUP e seus sindicatos vêm denunciando há tempos, como a falta de treinamento adequado, a multifunção, o excesso de dobras nas unidades operacionais e a perda de conhecimento técnico. O estudo chama atenção, por exemplo, para o “processo de otimização do número de pessoas e sem perspectiva de reposição, com perda de profissionais experientes” como um dos fatores de risco, assim como a “ausência de realização de treinamento decorrentes do não atendimento das exigências legais e normativas para atuação dos empregados em determinadas atividades, podendo gerar multas para a companhia, danos à saúde dos empregados”.
Redução drástica de efetivos
Segundo dados levantados pela equipe da Petrobrás que elaborou um plano de ação corporativo para mitigar os “riscos empresariais” da falta de efetivo, a probabilidade de acidentes e de danos aos trabalhadores e ao meio ambiente é altíssima. Como revelam as próprias gerências da empresa, a saída em massa dos trabalhadores nos planos de desligamento (PIDVs e PDVs) ofertados causou um “provimento inadequado de efetivo”, gerando a necessidade de “revisão do planejamento da demanda de mão de obra própria, podendo resultar em lacunas de efetivo necessário à consecução do Plano Estratégico da Companhia, com destaque para as atividades operacionais”.
Somente no governo Bolsonaro, a gestão da Petrobrás fechou 37.610 postos de trabalho na holding e nas subsidiárias, ao retirar dos quadros da empresa 14.311 trabalhadores próprios e 23.299 terceirizados. De janeiro de 2019 a dezembro de 2020, houve uma redução de 22,6% no número de trabalhadores concursados, que caiu de 63.361 para 49.050. Entre os terceirizados, a queda foi de 20,1%, com a redução de 116.065 para 92.766 empregados contratados.
O levantamento dos “riscos empresariais” decorrentes da redução de efetivos da Petrobrás foi apresentado em maio deste ano e aponta uma estimativa de prejuízos na ordem de 750 milhões de dólares em “custos não programados, perdas advindas de parada de produção, impactos na reputação da Companhia e na segurança operacional”, incluindo “questionamentos legais referentes ao não cumprimento de efetivos mínimos legais” e “multa diária de órgãos de controle externo (MPT, marinha, ANP, IBAMA…)”.
Mas, em vez de priorizar a segurança, a gestão da Petrobrás só se preocupa em otimizar o lucro dos acionistas privados, mesmo que às custas da vida dos trabalhadores e do meio ambiente.