Ataques do dono da rede social X (ex-Twitter) ao ministro do STF, Alexandre de Moraes, reacendem a discussão sobre o que de fato é democracia na internet
[Por André Accarini, da CUT]
O tema ‘liberdade e democracia nas redes sociais’ voltou aos holofotes no último fim de semana, após o bilionário americano, dono da rede social ‘X’ (antigo Twitter), Elon Musk, atacar o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, por meio da própria rede, afirmando que Moraes promoveria censura no Brasil. O motivo seria o bloqueio de contas da plataforma que disseminam fake news e discursos de ódio
“Por que tanta censura?” questionou o bilionário, postando, na sequência, que o ministro “tem traído repetida e descaradamente a Constituição e o povo do Brasil”, ao mesmo estilo – quase as mesmas palavras – das inúmeras frases ditas pelo ex-presidente brasileiro, Jair Bolsonaro em seus ataques às instituições democráticas brasileiras.
Não contente, Musk ainda sugeriu impeachment ou renúncia do ministro, ameaçou desrespeitar decisões judiciais brasileiras reativando perfis e postagens. Do outro lado, após os ataques, o ministro determinou multa diária de R$ 100 mil por perfil, em caso de reativação.
Moraes ainda incluiu o magnata como investigado no inquérito das milícias digitais, que apura a existência de uma organização criminosa, de atuação digital e com núcleos de produção, publicação, financiamento e político, com a finalidade de atentar contra a democracia e o Estado de Direito.
Interesses escusos
A liberdade reclamada pelo bilionário, no entanto, tem por detrás – mais uma vez – uma ofensiva da extrema direita em desestabilizar a ordem democrática no país, tão duramente atacada nos últimos anos pelos súditos do ex-presidente brasileiro.
“É nítido que se trata de uma tática para inflar os ânimos, tentar mobilizar a opinião pública e servir de pólvora para os bolsonaristas incendiarem a internet questionando as decisões judiciais brasileiras e atentando contra a real democracia”, diz o secretário-adjunto de Comunicação da CUT, Tadeu Porto.
O dirigente vai além afirmando que, apesar das evidências, ainda é difícil ‘cravar’ o que de fato é motivação para os ataques de Musk, visto que a tentativa de ascensão da extrema direita é um “movimento mundial de grandes proporções”.
“Há uma crise geopolítica mundial por conta dessa investida do fascismo. No Estados Unidos, Donald Trump quer o poder de volta e isso pode ter uma relação com os ataques. Para a extrema direita de lá é interessante que a extrema direita daqui se fortaleça. E para isso, Elon Musk usa esses ataques visando fortalecer o Bolsonaro”, diz Tadeu Porto lembrando que o ex-presidente está inelegível, mas tem poder de eleger seus candidatos.
O sindicalista ainda cita o presidente Luiz Inácio Lula da Silva como uma ameaça para o extremismo.
“Tem o medo deles também. Medo de Lula, que cresceu internacionalmente. O ‘guru’ de Bolsonaro, Steve Banon, já havia dito que Lula é o homem mais perigoso do mundo [para a extrema direita] porque é um líder nato, carismático, um trabalhador, que veio do povo e tem grande poder de mobilização para enfrentar o sistema”, disse.
E ele complementa, afirmando que “um fortalecimento de Bolsonaro, na visão da extrema direita, frearia Lula que os ataques de Elon Musk são, na verdade, uma ofensiva contra a democracia brasileira”.
A real democracia
Tadeu Porto explica que a democracia, de fato, é baseada no respeito, na boa convivência e no debate honesto de ideias, sem mentiras, sem violência, ao contrário do conteúdo propagado pela extrema direita que o antigo Twitter permitia que fosse publicado.
Ele reforça ainda que as redes sociais são um instrumento para ampliar a voz das pessoas e “sendo instrumento de amplificação e sendo essa voz um instrumento que pode machucar, ferir pessoas, as redes sociais tem que estar preparadas para não permitir e não estimular discursos de ódio”.
“Isso é democracia”, ele pontua.
No entanto, ainda hoje, mesmo com restrições impostas pela Justiça brasileira, são comuns postagens com as características não democráticas da extrema direita.
Para o dirigente, a chamada ‘liberdade de expressão’ tão alardeada pelos fascistas, ao contrário de democracia, é uma arma letal que tenta impedir a existência de diferentes pensamentos, ideologias e posicionamentos.
Liberdade de expressão não pode se traduzir em cada um falar o que quer, sem critérios, sem base, sem verdade nas suas posições. Quando alguém vai até uma rede social e promove um ataque aos direitos fundamentais em nome de liberdade de expressão, na verdade, está tentando cercear a existência do outro. Isso não é democracia”, reforça Tadeu.
Ele lembra ainda que a rede social X é um território onde a extrema direita atua de forma constante e massiva. “É um reduto bolsonarista”, ele diz, explicando que qualquer ação de regulamentação da plataforma será questionada por seu dono que, nunca é demais lembrar, é alinhado à extrema direita.
Democratização da comunicação no Brasil e defesa da CUT
Lembra o dirigente que a CUT foi fundada em 1983 tendo entre seus pilares a liberdade de expressão. O país ainda vivia o período da ditadura militar (1964-1985) e as lutas da Central tinham como foco direitos e liberdade.
Mas tal liberdade, inclusive nas redes sociais, como apontou Tadeu Porto, é fundamentada no respeito aos direitos humanos, na solidariedade, na igualdade, na fraternidade e na compaixão. É com esses elementos, diz Tadeu, que uma sociedade consegue estabilidade e justiça social.
A comunicação entra nesse contexto com papel de promotora de democracia por meio da formação de cidadania. Por isso, não pode ficar a mercê de interesses econômicos e políticos de determinados grupos, que não defendem os interesses dos trabalhadores e trabalhadoras.
Nessa luta pela democratização da comunicação, que inclui a necessária regulamentação das plataformas de redes sociais no Brasil, a CUT integra o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC).
A entidade nasceu em 1991, formada por diversos setores da sociedade civil, em especial organizações sindicais, com quem consolidou a atuação para combater a concentração econômica na mídia e as violações à liberdade de expressão.
PL da regulação das mídias sociais
O chamado PL das Fake News propõe a regulamentação de plataformas como as redes sociais, para evitar que conteúdo abusivo, inverídico, violento e manipulador seja veiculado sem nenhum tipo de controle.
Atualmente está nas mãos do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL). De acordo com fontes ouvidas pelo G1, ele afirmou que parlamentares estão tendo pautar, mas que o texto não passa.
O embate se dá pela exigência de lideres de bancadas conservadores para que o texto seja alterado e que o relator do projeto, deputado Orlando Silva (PCdoB) seja substituído.
Leia mais: Regulação das redes sociais ainda não tem aprovação garantida no Congresso