Uma questão de inteligência

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Geraldo Hernandes Domingues, o Gegê, é coordenador do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia e diretor adjunto do Sindicato dos Engenheiros do Estado de São Paulo

 

Mede-se a inteligência, de pronto, pela sua capacidade de manter duas idéias opostas, e ainda assim manter a capacidade de funcionar.

(F. Scott Fitzgerald)

Estatal ou privado? O debate sobre a questão polarizou-se de tal modo que chega a depor contra a inteligência, no sentido proposto pelo escritor Scott Fitzgerald, na fase acima citada. Reescrita de maneira mais pragmática e menos elegante, a mesma frase poderia ser “todo o radicalismo é burro”. Há também duas afirmativas implícitas na frase. Uma, de forma indireta diz que é próprio dos cérebros de pouca inteligência, a incapacidade de conviver com idéias opostas. A outra afirmação, de forma direta, diz que a inteligência pode ser avaliada pela capacidade que se tem de buscar a verdade e o equilíbrio entre coisas opostas.

No debate da estatização versus privatização, radicalismo éo que não falta e o bom senso é o artigo de luxo. Posições extremadas chegam a ponto tal que não estranharemos se alguém defender a estatização das barraquinhas de cachorro-quente e carrinhos de pipoca, num dos extremos. Nem que, da mesma forma, outros, defendam a terceirização da vigilância dos quartéis do exército. Para estes radicais ou temos que privatizar tudo, ou termos que estatizar tudo.

Excluindo-se os que agem por má fé e movidos por interesses próprios e descompromissados com o bem público, há muito de verdadeira burrice em tudo que se houve falar no grande debate concernente à privatização ou estatização. Claro, que há aqueles que não falam pela própria boca. São apenas ecos e repetidores daquilo que não entendem patavina, mas assim talvez fazem por considerar que possam melhor exibir-se como pessoas cultas, sábias, atualizadas e desta forma, consigam acariciar a própria vaidade.

Dado que é de extrema burrice meter-se a falar do que não se entende, temos aí um fenômemo curioso. Quando o nosso inconsequente vaidoso se põe a repassar burrices, temos matemáticamente uma potenciação. Chegamos à burrice elevada ao quadrado!
Pobres cérebros, que talvez encontrem dificuldades imensas em fazer um simples joguinho na Loteria Esportiva. Ali encontramos mais do que duas, temos três opções! Como fazer? Jogar-se tudo na coluna um ou na coluna dois? E o que se faz com aquela outra coluna que está lá nomeio – só para atrapalhar mais ainda?

Tal mentalidade não alcançaria a complexidade de nuances que envolvem o debate do estatal e do privado. O fato é que há estatais que deram certo e são exemplos de eficiência, como também há as que são verdadeiros descalabros. Do mesmo modo, há companhias privadas excelentes ehá as que são, talvez, as maiores causadoras de boa parte dos males nacionais.

Podemos  citar aPETROBRÁS, o BANCO DO BRASIL, o VALE DO RIO DOCE, os CORREIOS e outras tantas como empresas estatais da mais alta qualidade. Ao seu lado encontramos outras como a REDE FERROVIÁRIA FEDERAL por exemplo, em situação quase oposta. Encontramos empresas  excelentes como a VARIG, FREIOS VARGA, FIAT, apenas para citar algumas, bem como encontramos outras que fazem parte do time de empreiteiras que nos fazem o grande serviço de institucionalizar a corrupção no País, de acabar com a credibilidade do Congresso, de demolir nossas instituições, enfim de quase nos inviabilizar como Nação.

 Qual o esquema empresarial que causa o maior mal? Aquele em que o Estado monopoliza atividades, e as exerce ineficientemente, de forma corrompida por práticas como
empreguismo, por exemplo, que oneram os cofres públicos e prejudicam a grande maioria dos cidadãos não diretamente beneficiados? Ou aquele em que as atividades são terceirizadas ou repassadas para empresas especializadas em corromper, cuja força tarefa mais importante são os tais lobistas – melhor  seria dizer corruptistas –, que  vivem da obtenção do superfaturamento e da “execução” de obras desnecessárias? O que é pior a socialização da corrupção através do estatismo, ou a oligopolização da mesma, através do privatismo?

 É difícil dizer qual dos dois esquemas é pior. Nesta competição da ruindade, ambos ter que ser derrotados. Devemos ser inteligentes, devemos lutar contra os dois e não previlegiar um ou outro lado. Devemos lutar contra a institucionalização da corrupção, venha de onde vier e levar  para o campo da inteligência o debate sobre qual deve ser a participação do Estado na economia, considerando-se acima de outros interesses, o bem público.

No campo da inteligência ficará claro que não há solução radical. Teremos atividades em que deverá haver forte participação do Estado e outras em que deverá estar ausente. Outras ainda poderão ser desenvolvidas pelo Estado e pela empresa privada. Às mentes despojadas de preconceitos e de interesses inconfessáveis, não é difícil distinguir quais
são. Evidentemente não interessará à economia do País que o Estado fabrique agulhas ou pneus. É também evidente que deverá estar na Saúde e Educação.

Nisto até os privatistas mais exacerbados concordam, quando afirmam que o Estado deve sair de outras áreas para previlegiar investimentos nestas de Saúde e Educação. Mas isto não significa que se deva excluir a empresa privada destas áreas. Ao contrário, deve-se deixá-las como opção aos que não quizerem usar os serviços do Estado.

Há, ainda, as áreas estratégicas em que a presença do Estado deve ser muito forte. Principalmente naquelas em que a soberania nacional possa ser atacada, adotando-se até o monopólio nestes casos. É este indiscutívelmente o caso do petróleo, cujo monopólio estatal nasceu da vontade popular, após ser dado como inviável e desistimulado por todos os “especialistas” das mega-empresas do setor petrolífero, ou dos que a seu serviço se colocaram.

Neste particular, são importantes as declarações do Ministro Paulino Cícero, de que só deixará de considerar o petróleo como estratégico quando os Estados Unidos deixarem de gastar setenta dólares por barril em guerras e ações paralelas, para garantir seu suprimento energético. É preciso não esquecer e sobretudo informar ostensivamente, que os E.U.A agem assim por pura necessidade, para não dizer desespero, já que possuem reservas de petróelo tão somente suficientes para 5,7 anos de consumo, enquanto o Brasil as possui para 19,3 anos. É muito ingenuidade, quando não for má fé, imaginar que as empresas americanas virão para cá para  nos favorecer e atender nossos interesses, deixando os seus de lado!

Não há dúvidas que o estratégico se sobrepõe ao ecônômico, e isto justifica o excessivo gasto indireto que os americanos tem com o petróleo. Este entendimento aliás é universal. Tirando-se os E.U.A que tem o domínio do setor, através das gigantescas seis irmãs, os demais países (mesmo alguns em que o liberalismo é fortemente dominante), possuem
suas estatais de petróleo como a Alemanha, o Japão, Suécia, Itália, México, Canadá e a França – esta última, por sinal, possui DUAS companhias estatais de petróleo!

Assim, se o monopólio estatal do petróleo estiver sendo mal executado pela PETROBRAS, o que cabe é eliminar distorções, e não eliminá-lo. Cabe, isto sim, analisar a PETROBRÁS, e verificar aonde pode a mesma melhorar sua atuação. Certamente não será tirando-lhe a PETROBRÁS DISTRIBUIDORA – líder na distribuição de derivados, detendo 36% do mercado em livre concorrência com a SHELL, ESSA, ATLANTIC, TEXACO, apesar de ter ficado por dois anos proibida pelo governo de recorrer à publicidade. É fácil de se ver porque é assim. Basta ver os indicadores de eficiência da PETROBRÁS DISTRIBUIDORA e da SHELL!  Comparem obterão a resposta. Evidente e cristalina!

 A propósito do desempenho da PETROBRÁS, como tudo no mundo, poderá e deverá ser melhorado, ainda que esteja em bom nível, como poderemos constatar através da leitura de publicações estrangeiras. A propósito, é intrigante o quanto se fala mal da PETROBRÁS no Brasil, enquanto lá fora tanto se fala bem!

Consultando-se publicações estrangeiras, verifica-se que a despeito da ambiência geral desfavorável que o País apresenta, a PETROBRÁS consegue destaque no cenário mundial do petróleo. Situa-se como “a empresa de petróleo que mais cresceu nos últimos cinco anos” (Petroleum Inteiligence Weekly). A “quinta melhor empresa do mundo entre as suas congêneres segundo os critérios de gerenciamento geral e gerenciamento financeiro” (Petroleum Economist). A única empresa brasileira entre 500 maiores do mundo” Fortune).  “Empresa que menos poluiu em 1992 o meio marinho” (Mackenzie Guide). “Melhor tecnologia do mundo na exploração em águas profundas” (Offshore Technoloy Conference -Houston/Texas).

Há muitos destaques mais: 18ª companhia do mundo no setor, 10ª companhia no refino de petróleo, 2ª frota de petroleiros do mundo, recordista mundial na extração em águas profundas (781m), menores custos de refino no mundo, menores custos de extração no mundo, primeira companhia de petróleo do mundo a eliminar o poluidor chumbo tetraetila da gasolina, preços dos derivados entre os mais baratos do mundo, e o que é de enorme importância, não chama um tostão de aporte de capital desde 1974, pagando sempre dividendos a seus acionistas – dos quais a maior beneficiada é a União, que detém 70% do capital da PETROBRAS.

Mas não procurem porém por estas informações no País. Por incrível que pareça procurem-nas nas publicações estrangeiras, que lá as encontrarão abundantemente!

Perguntem aos grandes interesses internacionais se não lhes agradaria ficar com a PETROBRÁS, a mesma que alguns “bons” brasileiros tem tanta pressa em deitar fora! Eles não a querem simplesmente. Eles a cobiçam com imensa volúpia! E fica difícil entender qual a lógica em livrar-se de algo que todos pretendem e cobiçam! Excluidos os ingênuos e bobocas usados como meras estações repetidoras, só vemos os seguintes interesses ao lado de tais posições: os que teriam ganhos pessoais com as grandes negociatas que envolveriam estas questões, e os que consideram que o montante apurado na entrega, parcial ou total, seria útil no pagamento dos compromissos. que afogam o País. Esta última na realidade, uma posição autofágica e suicida, similar à do sujeito que devora seus próprios órgãos para aplacar sua fome!

 Para tudo isso, é preciso se discuta amplamente esta questão do estatal e do privado, considerando-se soluções inteligentes, não radicais e não viciadas. É preciso dar ao Estado sua verdadeira dimensão econômica, que não pode e nem deve ser monstruosa, mas também não pode e nem deve ser raquítica. É preciso lutar contra a corrupção estatal e privada! E, sobretudo, é preciso levar o debate para o campo da inteligência!