Na mesa de abertura do Congresso da Federação Única dos Petroleiros, ex-presidente denunciou interesses norte-americanos na Petrobrás, criticou desmonte do Estado pelo atual governo, mas afirmou: “a única luta que a gente perde é aquela que a gente não tem coragem de fazer”
Por Guilherme Weimann*, do Sindipetro Unificado-SP
*Com a colaboração de Andreza de Oliveira
“Nós estamos nos tornando uma republiqueta. Exportando óleo cru e importando derivados, de péssima qualidade como foi o caso da gasolina estragada de avião”. Esta foi uma das afirmações feitas pelo ex-presidente Luiz Inácio nesta quarta-feira (15), durante a mesa de abertura do 18º Congresso da Federação Única dos Petroleiros (Confup).
Além do ex-presidente, o painel denominado “Conjuntura, democracia brasileira e desafios da esquerda” também contou com a participação da ex-ministra de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Tereza Campello, do ex-coordenador da Federação Única dos Petroleiros (FUP), José Maria Rangel, e de outros integrantes da diretoria recém eleita.
Devido à pandemia do novo coronavírus, pela primeira vez na história o Confup está sendo realizado de forma totalmente digital. Pela manhã, os delegados habilitados votaram na chapa única que ficará à frente da entidade nos próximos três anos (2020-2023). A responsabilidade da coordenação foi assumida pelo diretor do Sindipetro Bahia e petroleiro da Refinaria Landulpho Alves (RLAM), Deyvid Bacelar.
Lula, logo no início da sua fala, resumiu seu sentimento pela estatal: “eu tenho orgulho da minha relação com a Petrobrás”. O ex-presidente também chamou atenção para o entendimento que promoveu sobre a companhia durante seus governos, nos quais a presença se estendeu dos poços de exploração aos postos de combustíveis. “Eu nunca tratei a Petrobrás como empresa de petróleo. Eu sempre tratei como uma indústria geradora de desenvolvimento, como carro chefe em pesquisa, inovação e produção de novas tecnologias”, pontuou.
Nesse sentido, o ex-presidente apontou a sua prisão e o golpe sofrido pela ex-presidenta Dilma Rousseff, em 2016, como partes de uma estratégia para retirar o pré-sal do controle do Estado brasileiro. “Eles prepararam uma mentira com a Lava Jato. Era preciso desmoralizar a Petrobrás para atender aos interesses dos norte-americanos de desmontar o regime de partilha. Por isso, era preciso desmoralizar o PT e tirar a Dilma, para que o Lula não pudesse ser candidato de novo. Tudo para privatizar a Petrobrás aos pedaços e fazer o país importar gasolina dos Estados Unidos”, explicou.
O recém eleito coordenador da FUP, Deyvid Bacelar, reforçou essa relação entre o judiciário brasileiro e norte-americano. “Acompanhando o Twitter do Lula, verificamos que hoje foi feita uma postagem com uma provocação interessante sobre a Lava Jato e o Departamento de Justiça dos Estados Unidos. Na minha opinião, faz todo o sentido, há um relacionamento íntimo da Lava Jato e o governo norte-americano. Isso fica comprovado quando analisamos a linha do tempo dos últimos anos, de 2003 até hoje”, assegurou Bacelar.
No ano seguinte ao golpe, em 2017, a Petrobrás diminuiu a produção de derivados e as importações dispararam. De acordo com a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), houve um crescimento nas importações de gasolina e diesel de 53% e 63%, respectivamente. Por outro lado, o fator de utilização das refinarias da Petrobrás foi de apenas 72,5% – com capacidade de 2,4 milhões de barris por dia de petróleo, produziram somente 1,74 milhões. Essa tendência se mantém no governo de Jair Bolsonaro (sem partido).
Diante deste cenário, Lula acredita que a categoria petroleira precisa fazer um esforço para estender a luta contra a privatização da Petrobrás a toda população brasileira. “Os petroleiros têm o dever de contar essa história para a sociedade brasileira. Os petroleiros não podem falar apenas com os petroleiros, têm que falar com o país. Não produzam boletins para petroleiros, produzam boletins para a sociedade. Para que todos saibam o que está acontecendo na maior empresa estratégica desse país”, opinou.
O que precisa ser comunicado, de acordo com o ex-presidente, é a privatização da maior empresa nacional. “Defender a Petrobrás é uma coisa de 210 milhões de brasileiros. Temos de gritar todos os dias: o Brasil não está à venda, o Brasil não é mais colônia”, avaliou.
Apesar da conjuntura difícil, Lula saudou o papel de resistência que a categoria petroleira tem desempenhado e foi enfático na mensagem que deve prevalecer na luta popular no próximo período: “a única luta que a gente perde é aquela que a gente não tem coragem de fazer”.
A saudação da ex-ministra Tereza Campello também caminhou no mesmo sentido. “Vocês, petroleiros e petroleiras, são orgulho muito grande para nós no Brasil, pois sempre tiveram à frente da luta nesse processo de resistência”, afirmou Campello.
Desafios
Durante o debate o ex-coordenador da FUP, José Maria Rangel, afirmou que a entidade tem três desafios principais para a próxima gestão. “A direção da FUP que assume tem desafios fundamentais. Primeiro, a luta da democracia no Brasil, já que hoje o país namora com o fascismo. E lutar pela democracia é lutar também pela retomada dos direitos políticos do ex-presidente Lula. Ainda temos o dever de lutar pelos direitos, que foram retirados nos últimos anos pela reforma trabalhista e da previdência, por exemplo. E, por fim, lutar pela defesa da Petrobrás”, elencou Rangel.
Já a diretora do Sindicato Unificado dos Petroleiros do Estado de São Paulo (Sindipetro Unificado-SP) e recém eleita secretária de Administração e Finanças da FUP, Cibele Vieira, chamou atenção para as demissões em massa dos últimos anos. “Se pegarmos o que isso representou em número de trabalhadores, A gente chegou a ter 446 mil trabalhadores, 360 mil terceirizados e 86 mil próprios, em 2013. Somente em 2014, com a paralisação das obras devido à Lava Jato, houve a redução de 69 mil trabalhadores terceirizados e 6 mil próprios. De 2013 para hoje, são 285 mil trabalhadores a menos”, detalhou Vieira.
Outro efeito colateral do golpe na Petrobrás foi sentido nos postos de combustíveis. Segundo a diretora do Sindipetro do Rio Grande do Sul (Sindipetro-RS) e da FUP, Miriam Cabreira, a política de paridade dos preços internacionais elevou exponencialmente a partir de 2017. “Na população, o impacto do golpe foi a mudança na política de preços dos combustíveis. Quer dizer que o povo brasileiro está pagando um preço semelhante ao vendido internacionalmente, somados ao custo de importação”, assinalou.
Além disso, a diretora do Sindipetro do Rio Grande do Norte e da FUP, Fafá Viana, também destacou outras áreas que estão sendo foco das políticas de privatização do governo. “O governo Bolsonaro tem sido o principal obstáculo para as ações de preservação da vida. Ele se aproveitou da pandemia para retirar a Petrobrás do Nordeste, para privatizar a água, para acelerar todas as medidas que comprometem a soberania nacional. Essa situação pode nos levar a dois extremos: uma barbárie ou uma saída positiva”, indicou Viana.
Confup
O 18º Confup reúne 272 delegados, 40 suplentes, 32 observadores, além de assessores, jornalista e convidados, num total de 481 participantes. Os debates prosseguem até domingo (19), com uma intensa programação, que inclui cinco painéis com transmissão ao vivo pelos canais da FUP no Youtube e no Facebook.
Veja aqui a programação completa: https://18confup.com.br/