São José, São Francisco, Lula e a transposição da esperança

 

 

Este domingo (19) foi dia de São José, padroeiro das chuvas e das águas para os nordestinos, muito especial. Depois de uma das piores secas que afetou a região – cinco ou seis anos, mas sem mortes de pessoas ou de animais, menos ainda saques e imigração –, a  população saiu a festejar a chegada das águas do Rio São Francisco e os responsáveis por isso.

Lula foi expulso da sua região para o sul do pais, pelas secas dos anos 1950. Agora ele volta, como o presidente mais querido da história do Brasil, para molhar suas mãos de operário mecânico nas águas do Velho Chico que sua tenacidade trouxe para o semiárido do sertão.

Ele saiu com sua mãe e os irmãos que sobreviveram rumo a São Paulo. Foi um dos milhões de “cabeças-chata”, de “baianos”, como eram chamados na capital, trabalhando e morando, grande parte deles, como peões da construção civil, vivendo nas próprias construções. Foram os principais responsáveis pela imensa riqueza produzida em São Paulo. Lula perdeu um dedo em um dos tantos acidentes de trabalho que inscrevem, no próprio corpo dos operários, a superexploração capitalista.

Agora Lula voltou, acompanhado da presidenta que ele elegeu – e que complementou o trabalho que ele tinha iniciado –, do povo da Paraíba e de todo o nordeste, que o seguiu, na inauguração popular da transposição do rio São Francisco. Feito que nem fazia parte da sua plataforma eleitoral, ao contrário dos seus antecessores, que todos haviam prometido e nunca sequer a iniciaram.

O fervor do povo que acompanhou Lula e Dilma é das mais extraordinárias expressões de agradecimento e apoio que um líder político brasileiro já teve. Presenciar isso é uma das mais lindas experiências que alguém pode ter na sua vida. “Obrigado, Lula”, “Lula, o pai da transposição”, “A transposição tem pai e mãe.” “Somos todos Lula”, foram algumas das tantas frases escritas manualmente em cartazes feitos pelas pessoas para expressar seus sentimentos. Um sentimento mais forte ainda nos 12 milhões de nordestinos que serão diretamente beneficiados pela transposição do Velho Chico.

Fomos esperar Lula e Dilma no aeroporto de Campina Grande. Dali saímos em caravana de vans na direção de Monteiro, um viagem de cerca de 2 horas e meia, na direção da segunda maior cidade do Cariri, no semiárido paraibano.

Ninguém quer estar fora dessa épica manifestação. O governador da Paraíba nos conta que até mesmo uma prefeita – entre tantos outros – do DEM, ligou para dizer que estava mandando dois ônibus e três carros com gente para a manifestação.

Antes de chegarmos à cidade, cercados pelas manifestações de milhares de pessoas na beirada das estradas saudando a passagem de Lula e Dilma, com suas bandeiras do PT, suas camisas vermelhas,  seus cartazes, paramos na beira do São Francisco. Depois de longos trechos de vegetação rala, marcada pela seca, pela prolongada falta de chuvas, de repente aparece um rio caudaloso, como por mágica, como que caído do céu.

Um rio cercado por dezenas de milhares de pessoas, para ver Lula banhar-se no rio que, como dizem alguns cartazes, agora é um rio que passa na vida deles, graças ao Lula e à Dilma. Uma avalanche de pessoas cercam os dois, os tocam, tiram fotos, os beijam e os abraçam.

Dali eles sobem a uma caminhonete, seguido por milhares de pessoas que caminham lentamente dois quilômetros e meio até o centro da cidade, numa espécie de procissão, de romaria, que coreia os gritos de “Lula-lá”, “Fora Temer”, “Dilma, guerreira do povo brasileiro”.

Na praça central da cidade foi montado o palanque, onde sobem Lula, Dilma, os governadores da Paraíba, da Bahia, do Piauí, senadores, deputados, prefeitos, tanta gente que quase não cabemos no palanque. Chico Cesar canta, o povo canta com ele. A praça está repleta, há povo a perder de vista. Qualquer cálculo não tem precisão, mas certamente havia várias de dezenas de milhares de pessoas.

Gente do povo, de todas as idades, vindo de lugares distantes, das mais diferentes formas. Não queriam perder a possibilidade de se encontrar de novo com Lula e Dilma, ainda mais em um momento tão especial, da chegada do Velho Chico, do prometido fim definitivo da indústria da seca.

Até ali Lula era uma marca profunda na vida daquelas pessoas, no passado recente delas. Agora, com a mudança definitiva das suas vidas, Lula já está inscrito no futuro delas. Mais que uma transposição de um rio, foi uma transposição de um passado sofrido para um futuro de esperanças.

O ato não poderia ser mais simbólico. Um nordestino, retornando à sua região, compartilhando com o povo do nordeste a chegada das águas. No estado de Josué de Castro, de Celso Furtado, de Ariano Suassuna.

 

VIA Rede Brasil Atual