Reforma Política: contribuições da CUT para o plebiscito popular

Em carta enviada à presidenta Dilma Rousseff nesta terça-feira (2), o presidente da CUT, Vagner Freitas, propõe questões essenciais para decisão do povo brasileiro, entre elas, o fim do financiamento eleitoral por empresas privadas. Leia a íntegra do documento abaixo:

Reforma Política:  Fortalecimento e aperfeiçoamento da democracia direta e participativa:

I-Introdução:

            A Central Única dos Trabalhadores congratula a iniciativa da vossa Excelência Dilma Rousseff,  presidente  da República, de propor “um debate sobre a convocação de um plebiscito que autorize o funcionamento de um processo constituinte específico para fazer a reforma política  de que o país necessita".

Como consta das Resoluções do 11º. Congresso Nacional da CUT (julho de 2012), “a CUT constata que a relação de forças no atual Congresso Nacional bloqueou até mesmo a tímida reforma eleitoral que se discutia, o que coloca em pauta a questão da convocação de uma Assembléia Constituinte Soberana que dê a palavra ao povo brasileiro, como instrumento que supere os obstáculos levantados pela classe dominante a qualquer transformação de fundo no nosso país.   A CUT, ao defender uma reforma política alternativa à democracia parlamentar e corporativa e, ao questionar a hegemonia da economia privada ou mista, defende uma nova relação entre transformação política e econômica”. (grifo  nosso)

Em nossa plataforma, aprovada há um ano, reafirmamos a necessidade de uma Reforma Política ampla e profunda, que contemple o aperfeiçoamento da democracia representativa e o fortalecimento da democracia participativa do povo brasileiro. Esse é o desejo inequívoco demonstrado nas recentes manifestações populares e em recentes pesquisas de opinião.   São itens indispensáveis para isso:

1-      Fim do financiamento privado das campanhas eleitorais, que macula indelevelmente o processo eleitoral, e que é fonte importante de corrupção;

2-      Voto proporcional em lista partidária, com alternância de sexo, definidas em convenções partidárias democráticas e  transparentes, a partir de critérios públicos;

3-      Fidelidade partidária e programática;

4-      Diminuição do número de assinaturas para projetos de Iniciativa Popular e mecanismos de facilitação de coleta;

5-      Tramitação diferenciada e prioritária dos projetos de lei de Iniciativa Popular;

6-      Inclusão de mecanismos para a democratização do Poder Judiciário e impedimento de judicialização dos conflitos;

7-      Combate à corrupção tornando-a crime inafiançável;

8-      Fim da imunidade parlamentar para crimes penais e de corrupção;

9-      Fim do Senado;

10-  Proporcionalidade de representação dos Estados da Federação;

11-  Eliminação de cláusulas de barreira;

12-  Institucionalização do caráter deliberativo das Conferências de políticas públicas e dos Conselhos Nacionais;

13-   Estabelecimento de limite mínimo de 18 anos de idade para concorrer a cargos eletivos, permitindo uma saudável e necessária renovação geracional.

Tais propostas pressupõem um fórum constituinte novo, especificamente eleito para essa finalidade, tendo em vista a comprovada incapacidade de o atual Congresso Nacional levar a cabo qualquer reforma política ampla e profunda. O Brasil está mudando; é preciso aproveitar a oportunidade para consolidar novas formas de organizar a sociedade e o Estado. O Brasil necessita de reformas estruturais de caráter democrático e popular, estruturadas em processos de democracia direta e participativa, na construção de um novo marco ético-político.  A reforma política é caminho essencial para aperfeiçoar as relações entre Estado e sociedade e solucionar os graves problemas enfrentados pelos poderes constituídos.

II- Plebiscito ou Referendo

No entanto, na eventual impossibilidade de um processo constituinte especifico, tendo em vista as alternativas colocadas pelos diversos partidos políticos,  agentes sociais e governamentais, como o plebiscito e o referendo, acreditamos que a proposta de referendo não se coaduna com a vontade de participação e de mudança política expressa pelas ruas. Referendo é apenas um sim ou não a  propostas previamente aprovadas por um Congresso Nacional  que se mostrou incapaz, até o momento, de viabilizar essa transformação da política brasileira. O povo brasileiro quer participar mais ativamente dos rumos da vida política nacional, como demonstrado, e, diante dessas duas alternativas, o Plebiscito pode ser um mecanismo  possível, neste momento, de dar voz ao povo que quer mudanças na vida política nacional,  na representação política no Congresso Nacional e no comportamento dos parlamentares e políticos eleitos.

Desta maneira, uma vez convocado o Plebiscito, cremos serem essenciais as seguintes questões para decisão do povo brasileiro:

* Fim do financiamento eleitoral por empresas privadas.

O financiamento eleitoral é central no modelo eleitoral brasileiro, pois  conta majoritariamente com recursos privados, de pessoas físicas e jurídicas  – cerca de 90% – e  com recursos do fundo partidário.  Grandes empresas e conglomerados econômicos injetam valores expressivos nas campanhas partidárias, alterando substancialmente a correlação de forças e as chances de eleição de candidatos ligados ao movimento sindical ou popular. Os  altos custos das campanhas eleitorais tornam os parlamentares e políticos eleitos reféns do poder econômico, e não mandatários da vontade da população que os elegeu . Desta maneira, o mecanismo atual favorece a corrupção e a influência do poder econômico nos destinos na nação. As campanhas eleitorais devem ter financiamento exclusivamente público,  definido de maneira pública e transparente, observando-se critérios para o acesso aos recursos, como a densidade eleitoral dos partidos, e igualmente  divididos entre homens e mulheres.

* Voto proporcional em lista partidária, com alternância entre homens e mulheres, definidas em convenções partidárias democráticas e transparentes, a partir de critérios tornados públicos

O voto proporcional e nominal do atual sistema, no qual  o voto direto em um candidato soma-se à quantidade de votos do partido e/ou coligação e, ao final, a proporcionalidade de votos válidos de cada partido/coligação para fins de fixação do número de vagas, distorce a composição dos legislativos e consequentemente a representatividade. É assim que partidos com baixa representatividade na sociedade ampliam o seu número de cadeiras nos legislativos, a partir da votação massiva nos chamados “puxadores de votos”, por vezes sem a necessária identificação e comprometimento partidário. Ou  seja,  permite a figura do “partido de aluguel”, em que troca-se de partido como quem troca de roupa, o que não é admissível numa democracia. A pessoa eleita tem que comprometer-se com um ideário, com o qual seus eleitores se identificaram e por isso nele votaram.  A lista partidária, definida em convenções partidárias democráticas e transparentes, a partir de critérios tornados públicos, favorece a fidelidade partidária e programática, evitando-se a troca de partidos por interesses privados ou pessoais. De um lado favorece a formação de partidos mais sólidos e comprometidos com projetos e propostas e, de outro, democratiza as relações partidárias internas, evitando a burocratização das direções partidárias, com critérios de definição de listas públicos e transparentes.

* Diminuição do número de assinaturas para projetos de Iniciativa Popular e tramitação diferenciada e prioritária dos projetos de lei de Iniciativa Popular

O país demonstrou nas ultimas semanas sua vontade de construir o protagonismo popular na construção das políticas públicas e na definição de rumos. É preciso portanto criar mecanismos que favoreçam os projetos de lei de iniciativa popular, aproximando o povo das casas legislativas.

" Fim do Senado

O sistema atual, bicameral, em que ao Senado compete o papel revisor em relação aos projetos iniciados na Câmara de Deputados, agrava a ausência de proporcionalidade e sobrevaloriza o papel do Senado na produção legislativa. O Senado, assim, acaba por apropriar-se de prerrogativas da Câmara, aumentando o seu poder. O modelo, ao contrario de preservar o equilíbrio federativo, tende a subvertê-lo, afastando-se ainda mais das questões que interessam a população.

 * Inclusão de mecanismos para a democratização do Poder Judiciário e impedimento de judicialização dos conflitos

Também faz parte da necessária mudança da vida pública brasileira criar mecanismos de democratização do Poder Judiciário brasileiro e para o fim da judicialização dos conflitos. No nosso país, os Poderes Executivo e Legislativo possuem mecanismos constitucionais, ainda que insuficientes ou necessitando aprimoramento , que garantem algum tipo de participação popular  e controle social, como a realização de  eleições regulares por exemplo. O único Poder em nosso país em que não se prevê nenhum tipo de participação popular ou controle social é o Judiciário. Um país verdadeiramente democrático não pode conviver com essa exceção, também é preciso avançar na adoção de mecanismos democráticos e de transparência no Poder Judiciário.

III – Considerações finais

Caso o Plebiscito seja a maneira escolhida  para a definição dos caminhos centrais da reforma política externamos ainda uma  preocupação. Preocupa-nos a formulação das perguntas, pois a dubiedade na pergunta ou perguntas que induzam respostas podem deslegitimar o próprio processo plebiscitário e seu caráter democrático. Em nossa opinião,  as perguntas para o plebiscito devem ser objetivas e concentradas de 3 a no máximo 5 grandes temas (perguntas).

Nesse momento, conclamamos a todos os governantes, o Congresso Nacional e os partidos a ficar  atentos às necessidades do país por mudanças profundas, que atendam aos interesses de toda a sociedade e não aos de uma pequena parcela composta pelos detentores do capital.

A reforma política é a mãe de todas as outras possíveis reformas, pois garante transparência no processo eleitoral brasileiro.

O fim do financiamento privado para as campanhas eleitorais, entre outras medidas, coíbe a corrupção e coloca obstáculos na intervenção do poder econômico das grandes empresas e corporações nas eleições, é fundamental para que essa mudança ocorra. Hoje é o dinheiro que ganha as eleições. O cidadão e a cidadã comuns não têm possibilidade de concorrer, muito menos vencê-las, porque não têm recursos. Com o fim do financiamento privado, os recursos serão divididos de forma democrática nos partidos, ou seja, as disputas serão de igual para igual, possibilitando que a diversidade e pluralidade da sociedade brasileira estejam representadas nas esferas públicas, em todos os níveis.

Atenciosamente,

Vagner Freitas de Moraes

Presidente Nacional da CUT