Por João Felício, Secretário de Relações Internacionais da CUT
Há um ditado que diz que o peixe morre pela boca. A recente declaração do candidato do PSDB à presidência da República, Aécio Neves, de que não vacilará em tomar “medidas impopulares” – caso seja eleito – fala por si.
Na verdade, o anúncio feito sem cerimônia aos banqueiros e grandes empresários na capital paulista é totalmente coerente com a trajetória do tucano, privatista e neoliberal de fio a pavio, contrário a toda e qualquer política de distribuição de renda.
Como presidente da Câmara no biênio 2001-2002, Aécio esteve à frente da mais brutal e infame investida do capital contra o artigo 618 da Consolidação das Leis do Trabalho. Com o ataque à CLT, a quem acusavam de “atrasada” e “populista”, o PSDB e seus aliados buscavam dar às entidades sindicais o duvidoso direito de negociar direitos. Na mesa do banquete oferecido ao capital, o direito a férias, 13º salário e descanso semanal remunerado. Na avaliação da CUT, este recuo seria o primeiro passo para acabar com as demais conquistas, como a licença-maternidade e a licença- paternidade, extinguindo direitos da classe trabalhadora.
Eu era o presidente da CUT na época e me lembro perfeitamente bem de um diálogo com Aécio na direção da Câmara, quando um sindicalista lhe disse: “Deputado, não manche sua carreira política com esta decisão”. Ao que o tucano respondeu: “Não se preocupe comigo”. Fizemos uma campanha de rua vitoriosa e o que havia sido votado na Câmara sofreu um desgaste tão grande na base que, com a proximidade das eleições, os senadores não quiseram votar. Logo Lula venceu a disputa presidencial e, a pedido da CUT, engavetou a medida. Para nossa Central, o que consta na lei nunca deve ser objeto de negociação, como propõem vários projetos que se encontram no Congresso Nacional.
Agora, ao lado do príncipe da privataria, Fernando Henrique Cardoso, e do ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga – que serviram como avalistas das promessas de campanha – Aécio volta a defender o retrocesso com ares de bom moço. Garfos e facas na mão, aplausos e sorrisos dos comensais seguiram o convidativo “preparem os seus dentes” porque o retrocesso vem aí. FHC foi chamado de “craque” e Armínio, de triste lembrança para o país e o povo brasileiro, cotado para ser o novo ministro da Fazenda.
No menu estampado por Aécio, o arrocho do salário mínimo, “que cresceu muito nos últimos anos” com a política de valorização acordada com as centrais sindicais – que redistribui renda; a redução do papel do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), “que vem se agigantando, fazendo empréstimos a taxas muito baixas”; a “autonomia operacional do Banco Central” – que na prática tem se configurado como estímulo àpolítica de juros altos, que impõe câmbio favorável às importações, inviabiliza o aumento da produção e a verdadeira estabilidade.
Finalmente, como cereja do bolo, para não deixar margem a dúvidas, o tucano expressa que “toda a política externa do Brasil precisa ser repensada” e que “o país precisa se engatar nas grandes locomotivas mundiais". Nem precisamos aprofundar a boçalidade do argumento em um momento em que a crise internacional descarrilha alguns dos vagões vistos como santuários pelos neoliberais.
A realidade se impõe, reduzindo os argumentos do tucano – e sua carreira – a pó. Simples assim.