Por José Maria Rangel
Estamos no momento de fazer as escolhas centrais para dar prosseguimento a uma política de desenvolvimento no Brasil. Neste sentido, precisamos recorrer aos estudos de importantes intelectuais que pensam o Brasil como um país forte e desenvolvido. Sendo assim, é importante lembrar as ideias defendidas por Celso Furtado e por Maria da Conceição Tavares, sempre preocupados com um projeto de país, respeitando a realidade e os dilemas que nos cercam.
O Brasil tem problemas estruturais e históricos que precisam ser resolvidos, como continuar avançando na distribuição de renda da população brasileira, gerando mais empregos e, de melhor qualidade, além de investir em educação e saúde. Por outro lado, existem grupos que enxergam estas questões por outra vertente e, na busca pelo lucro fácil, acham que o Brasil não pode se desenvolver.
Para exemplificar, podemos citar o Jornal O Globo, que em sua edição do dia 15/09, relata os principais debates acorridos no evento Rio Oil & Gas, apresentando uma rica experiência de como alguns setores nacionais vivem a síndrome do “vira-lata”. Ou seja, na leitura que fazem do Brasil, não temos condições de produzir máquinas e equipamentos no país e precisamos importar. O jornal faz a mesma leitura em relação ao petróleo produzido nacionalmente. Para eles, devemos exportar óleo cru, sem refina-lo, logo, não gerando riqueza para o país.
Coincidência ou não, o presidente do IBP, João Carlos de Luca e os executivos da Shell Brasil, André Araujo, foram “duros” em criticar a política de conteúdo local adotada no Brasil. Vejamos o que esses senhores estão criticando:
O Governo Lula, desde seu início, adotou o projeto que tudo que pode ser produzido no país, deve ser feito aqui e não fora. Isso continuou com o Governo Dilma e, como efeito dessa política, antigos estaleiros foram reativados e novos foram e estão sendo construídos. Além disso, foi criado o Programa de Modernização e Expansão da Frota da Transpetro (Promef), hoje um dos principais instrumentos de ação do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). As encomendas do Promef somam 49 navios de grande porte. As premissas do Promef resultaram em grande impulso à nossa indústria, estimulando que os navios devem ser construídos no Brasil e com índice de nacionalização de 65% na primeira fase e de 70% na segunda, além da exigência de que sejam competitivos internacionalmente.
Apesar destas medidas e investimentos do governo representarem diversos benefícios para o país, houve e, ainda há, várias críticas a essa determinação. Dizem que na era da globalização seria mais barato fazer as encomendas à China, Indonésia ou à Coreia. O Governo dizia que o Brasil tinha um parque ocioso enorme e que não poderíamos deixar todo o conhecimento adquirido se perder no tempo. O que os críticos não consideravam também é que as compras feitas internamente retiram um peso negativo da balança comercial, mobilizam um sem-número de outras empresas, geram dezenas de milhares de empregos diretos e indiretos para brasileiros, que se tornam consumidores e passam a demandar todo tipo de produto para a sua vida diária, girando e estimulando toda a economia. Esta política, além de revitalizar os estaleiros antigos, gerou a construção de novos, como o maior da América Latina e o Pólo Naval de Rio Grande. Atualmente, além do RS, existem atividades no setor nos estados do PR, RJ, ES, BA e PE.
A indústria naval brasileira chegou a ser a segunda maior do mundo, empregando, em 1979, 39 mil trabalhadores. Na época, apenas o Japão nos superava. Nas décadas seguintes, quando os navios e plataformas de exploração passaram a ser importados, o setor começou a definhar até quase virar pó, com o número de empregados caindo para 1.900 no ano de 2000, durante o Governo FHC.
Hoje, no entanto, a indústria naval está renascendo das cinzas. O setor já superou em muito o número de empregados da época áurea, empregando atualmente 80 mil trabalhadores e podendo chegar, segundo cálculos do Sindicato da Indústria Naval, a 100 mil até o fim de 2017. Essa recuperação é fruto das grandes encomendas da Petrobrás com exigências de conteúdo nacional e da disponibilidade de financiamento pelo Programa de Fundo de Marinha Mercante, que cresceu 784% em termos reais, entre 2002 e 2013.
Como resultado concreto destes movimentos e da descoberta do Pré-sal, a carteira de encomendas colocadas nos estaleiros nacionais é a quarta do mundo, considerados os navios de transporte e a primeira do mundo consideradas as embarcações offshore. No período 2013-2020, são 88 navios petroleiros e de transporte de produtos, 28 sondas de perfuração, 38 plataformas de produção de petróleo e 146 barcos de apoio, totalizando US$ 100,1 bilhões.
Além disso, as criticas aos investimentos nacionais não se limitam aos executivos citados acima, pois a candidata do PSB à Presidência da República, Marina Silva, também deixa claro em seu programa de governo, que o petróleo é um mal necessário e dedica apenas uma linha ao pré-sal. Nos debates e encontros com empresários, o coordenador da campanha da candidata, que também é o seu principal articulador político, o ex-deputado do PSDB, Walter Feldman criticou o modelo de partilha do pré-sal e o papel da Petrobrás como operadora única. “A figura do operador único não é benéfica para a Petrobrás, nem para a indústria brasileira. Precisamos de multiplicidade de atores”, revelou. O ex-tucano também classificou a atual política de conteúdo nacional como “doutrinária”, fazendo coro com os empresários que participaram da Rio Oil&Gas e bateram duro nesta decisão acertada do governo brasileiro e que tem sido estratégica para a indústria nacional.
Marina Silva já deixou claro que irá fazer a “revisão em profundidade de todos os programas atuais que demandem incentivos e proteção, incluindo os casos em que é aplicada a política de conteúdo nacional”, como destaca na página 73 do seu programa de governo.
Então, a pergunta que fica é: quais os reais interesses de alguém ser contra uma política que, visivelmente, esta desenvolvendo o país?