Produção a qualquer custo. E nossa vida, importa?

alt

alt

Por Arthur “Bob” Ragusa, diretor do Sindipetro Unificado-SP

Na madrugada da última terça-feira, 29/07, mais um acidente potencialmente letal ocorreu no Sistema Petrobrás. Na Unidade de Coque da Replan, dois operadores faziam a manobra de troca do filtro da corrente de Gasóleo Pesado, devido à observação de que o filtro em utilização apresentava vazamento em seu dreno. Durante a manobra, a tubulação deste dreno se rompeu junto ao filtro. Um dos operadores recebeu um jato direto do produto, aquecido a mais de 300°C e teve queimaduras no rosto, nos braços e na barriga, cuja intensidade pode variar de primeiro a segundo grau. O outro operador e os demais trabalhadores, além de socorrer o companheiro, debelaram a emergência, que por milagre não se transformou em incêndio e mortes.

A segurança no Sistema Petrobrás é um problema filosófico. O peão é contratado. Recebe a farda novinha, a bota de bico rígido ainda lustrosa. Tem medo da unidade. Hesita, pensa, elabora várias vezes a abordagem pra botar a mão no equipamento. Um comportamento lúcido, adequado para um ambiente onde as pressões, temperaturas, toxicidade e outros riscos são de ordem letal.
Mas o trabalho da operação não está concebido para quem tem este tipo de conduta. Ele está concebido para manter a produção. De preferência, em níveis muito acima dos recomendados, dos projetados e, principalmente, dos seguros.

Assim, dia após dia, naturalizamos ações perigosas, pra não dizer ilógicas: deixamos de partir do princípio de preservar as vidas envolvidas, ao custo que for em termos de produção, para preservar a continuidade operacional, a qualquer custo, inclusive de vidas. Nossas próprias vidas.

Os princípios da “Gestão Sem Lacunas” são parte da falácia da disciplina operacional. Uma falácia que está produzindo suicidas em potencial, todos os dias, de forma cruel e calculada. O que dizer de uma gestão que impõe ao trabalhador a responsabilidade de estar “sempre no seu melhor ‘eu'” para evitar as possíveis falhas humanas nos procedimentos, mas ao mesmo tempo o pressiona para obter resultados cuja finalidade é dourar a pílula de gerentes?

Tudo isso considerado, temos o fato de que, no acidente em questão, NÃO HOUVE FALHA OPERACIONAL. Uma tubulação que, em tese, deveria suportar as condições de pressão, temperatura e composição química do produto, se ROMPEU. E o cenário desolador dessa madrugada de 29 de julho se desenvolve a partir daí.

A empresa já dá um sinal muito claro da sua gestão esquizofrênica ao iniciar os trabalhos da comissão de investigação do acidente sem avisar e garantir a presença do representante indicado pelo Sindicato. Afinal, a mesma lógica que produz os suicidas da Operação produz os homicidas dos Projetos e das Paradas de Manutenção, cada vez mais pressionados para atingir metas de custo e prazos de entrega.
Some a essa engrenagem psicótica a corrupção intrínseca à terceirização universal de atividades de manutenção, inspeção e mesmo operação e o resultado só pode ser tão inflamável quanto o gasóleo fervente que vitimou mais um petroleiro.

Reiteramos nossa completa solidariedade e apoio de toda ordem aos familiares deste companheiro. Não vamos nos deter no burocrático relatório que vai emergir da investigação, da qual participaremos, sim, ao custo que for e à revelia de manobras escusas da chefia da refinaria. A parada da Unidade de Coque será em breve. Fazemos um chamado e um alerta à Petrobrás: não toleraremos mais a filosofia do suicídio e do homicídio de noss@s trabalhador@s.