Rede Brasil Atual
O inglês Guy Ryder toma posse hoje (1º) na direção geral da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em Genebra. Será o primeiro representante vindo do movimento sindical a ocupar o cargo máximo da entidade, criada em 1919, como parte do Tratado de Versalhes, ao fim da Primeira Guerra Mundial. Para representantes dos sindicalistas, a vitória de Ryder representa o fortalecimento da luta contra a retirada de direitos – uma outra modalidade de guerra, econômica, travada particularmente desde o final dos anos 1970, com a ascensão de governos liberais contrários à política do Estado do bem-estar social. A crise atual deu gás à ofensiva conservadora, e a eleição da OIT, nesse sentido, tem componente simbólico.
Ryder foi eleito em maio com apoio unânime da representação dos trabalhadores no Conselho de Administração da OIT, órgão executivo da OIT. O empresário francês Giles de Robien teve apoio integral da bancada empresarial. Com 14 votos para cada lado, o desempate coube à representação dos governos – foram 16 a favor de Ryder e 12 para Robien, resultando no placar final de 30 a 26. Entre os latino-americanos, Brasil, Argentina, Colômbia e El Salvador votaram no inglês, que também teve o apoio de Estados Unidos, China e Rússia. Dos 28 postos governamentais, a OIT lembra que dez são reservados aos membros “de maior importância industrial” (Alemanha, Brasil, China, Estados Unidos, França, Índia, Itália, Japão, Reino Unido e Rússia).
Para o secretário de Relações Internacionais da CUT, João Felício, a eleição representou uma vitória dos setores progressistas, em um cenário de ataque a direitos trabalhistas e sindicais. “Sabemos que a OIT sofre ataque de governos conservadores, que querem esvaziá-la, deixá-la sem força política. E tem também uma bancada patronal conservadora”, afirma, citando a dificuldade existentes para que os governos acatem as normas elaboradas pela organização. “São dezenas de convenções que procuram humanizar o mundo do trabalho”, diz Felício.
O sindicalista considera crucial fortalecer a OIT, especialmente em um período de crise. “Vamos entrar em uma fase de muito conflito, muita disputa. O que está acontecendo na Europa é uma crise tão forte que estão tirando direito não só da categoria profissional, mas da organização sindical. Depois de toda aquela fase positiva dos anos 1950, 1960, até 1970, de fortalecimento de direitos, estamos vivendo uma fase profundamente adversa. A OIT vai ter de cumprir um papel importante nesse processo, e vamos ter de fazer alianças com os governos progressistas”, afirma Felício. Ele observa que os 14 votos dos trabalhadores no Conselho de Administração são insuficientes para as deliberações internas do órgão.
“A crise que está assolando o mundo será usada para tentar fazer reformas aqui também”, acredita o dirigente, classificando de “balela” o discurso de que é preciso mudar a legislação para que o país se torne mais competitivo. “O problema do Brasil ainda é um salário médio baixo. E temos de ampliar o debate: precisamos discutir modelo econômico, diálogo social.” Felício lembra da 1ª Conferência Nacional de Emprego e Trabalho Decente, realizada em agosto, como exemplo dos problemas enfrentados aqui – a representação patronal não participou da plenária final do encontro. “Percebeu-se claramente lá as dificuldades que os empresários colocam para impedir qualquer avanço, inclusive no que se refere à representação sindical.”
Nascido em Liverpool em 1956, Guy Ryder começou a atuar no movimento sindical como assistente no Departamento Internacional do Trades Union Congress (TUC), central inglesa. Foi dirigente da antiga Confederação Internacional de Organizações Sindicais Livres (Ciosl) e chegou à OIT em 1999 – em 2010, foi nomeado diretor-executivo do Departamento de Normas e Princípios Fundamentais no Trabalho. O primeiro sindicalista na direção da OIT vai substituir o primeiro latino-americano no posto, o chileno Juan Somavia, que em 2003 assinou com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva um memorando de entendimento para promover uma agenda de trabalho decente no Brasil. O país foi o primeiro a promover uma conferência específica sobre o tema.