Por Emilio Chernavsky, doutor em Economia pela USP
Apenas um mês após promover, em 27 de setembro, a 14° rodada de licitações de áreas para exploração de petróleo e gás no regime de concessão, a ANP realizou os leilões da 2° e 3° rodadas para exploração do pré-sal no regime de partilha.
Para estes leilões foi definido um bônus de assinatura inferior, em termos reais, à metade daquele fixado para o leilão de Libra promovido em 2013 pelo governo Dilma, e participações mínimas do excedente em óleo para a União situadas entre um quarto e metade daquelas então fixadas.
Além disso, foi eliminada a exclusividade da operação dos campos pela Petrobras e a obrigatoriedade de sua participação nos consórcios e foi reduzida fortemente a exigência de conteúdo local na exploração e produção. Menos de duas semanas mais tarde, foi aprovada em reunião extraordinária do Conselho Nacional de Política Energética presidido pelo Ministro de Minas e Energia a realização de nova rodada de licitações em março (concessão) e junho (partilha) de 2018.
A aceleração dos leilões é condizente com a afirmação em recente artigo do Ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco, de que “o tempo urge. Se nada fizermos ou se formos lentos, perderemos uma grande oportunidade histórica”[1]. Ou seja, para ele, o governo deveria correr para trazer os enormes investimentos para o setor e acelerar a exploração do petróleo no país. Mas essa pressa faz mesmo sentido para a maior parte de população brasileira?
Esta é beneficiada quando a exploração do petróleo leva ao aumento: 1. dos lucros e dividendos distribuídos pelas empresas a residentes no país, 2. dos salários pagos por essas empresas a seus trabalhadores, também no país, 3. dos tributos, incluindo royalties e participações, pagos ao governo brasileiro diretamente pelas petroleiras e também pelas empresas que lhes fornecem bens e serviços.
Ocorre que os lucros, salários e tributos pagos no Brasil têm sido impactados negativamente pelas mudanças introduzidas pelo governo nos últimos leilões. A redução da parcela da Petrobras na operação dos campos e sua substituição por empresas estrangeiras implica na queda dos lucros e dividendos distribuídos no Brasil e no aumento das remessas e lucros retidos no exterior, não apenas em razão da redução dos lucros da própria Petrobras como também pela dos seus fornecedores, que perdem espaço para estrangeiros com quem as petroleiras possuem laços de longo prazo.
A diminuição das exigências de conteúdo local nos leilões assim como o aumento na velocidade da realização desses leilões acima da expansão da capacidade de fornecimento no país, por sua vez, favorece o aumento da importação de bens e serviços produzidos por trabalhadores que recebem seus salários no exterior em detrimento daqueles produzidos no Brasil. Finalmente, a queda dos lucros e salários pagos no país, a redução dos bônus de assinatura e, quando os leilões são pouco competitivos[2], a redução das participações mínimas do excedente em óleo para a União, gera perdas diretas na arrecadação do governo.
Essas perdas devem ainda aumentar se a medida provisória n° 795 que pode ser votada a qualquer momento no Congresso for aprovada, uma vez que ela, por um lado, ao elevar as deduções da base de cálculo do Imposto de Renda e da CSLL, reduz o valor dos tributos a serem pagos pelas empresas e, pelo outro, suspende o pagamento do imposto de importação sobre produtos importados usados no setor, aumentando a vantagem destes diante dos nacionais.
A exploração do petróleo pode de fato contribuir decisivamente para o desenvolvimento do país e para o aumento do bem-estar da população. Mas para isso é preciso que o investimento das empresas do setor se transforme em lucros retidos e distribuídos e, especialmente, salários e tributos pagos principalmente no Brasil, e não no exterior.
As regras que o governo Temer tem implantado vão justamente em sentido contrário, deixando aqui uma parcela da renda do petróleo muito menor do que ocorria até pouco tempo atrás. O ministro Moreira Franco disse no artigo citado que o “petróleo não explorado, que fica debaixo da água e da terra, não produz riqueza”; é verdade. Mas se a pressa do governo em extrair essa riqueza significa que em sua maior parte ela seja enviada ao exterior, aqui deixando apenas uma parcela pequena, concentrada em poucas mãos e pouco tributada, é preferível que ela fique enterrada até que um governo preocupado com o país saiba utilizá-la.
[1] http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2017/10/1931077-aposta-no-brasil.shtml.
[2] Esse foi o caso de dois dos oito campos ofertados nos últimos leilões do pré-sal, cedidos em troca das participações mínimas, muito inferiores às de Libra. Nos leilões dos demais campos, os ágios tão comemorados pelo governo somente foram possíveis em razão da ação decisiva da Petrobras.
Via Portal Vermelho