Pré-sal terá modelo de partilha e nova estatal

Está pronto o arcabouço de regras para a exploração de petróleo da camada pré-sal. Três projetos…

Valor Econômico

Está pronto o arcabouço de regras para a exploração de petróleo da camada pré-sal. Três projetos de lei, com pedido de tramitação em urgência constitucional, serão encaminhados ao Congresso Nacional em agosto: o primeiro para o estabelecimento de uma nova estatal (haverá mesmo uma empresa, e não autarquia, vinculada ao Ministério de Minas e Energia); o segundo para a criação de um fundo de responsabilidade ou proteção social (com investimentos em educação, saúde e habitação popular); e o terceiro com mudanças em artigos na lei 9.478/97, a Lei do Petróleo, com a introdução de um sistema misto de exploração (partilha de produção para novos contratos no pré-sal e manutenção do regime de concessão para áreas de potencial menor, em terra ou no mar, fora do pré-sal, além dos contratos atuais).

Ontem, técnicos da Casa Civil e do Ministério das Minas e Energia estavam trabalhando no texto das propostas. O aval do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à redação definitiva dos três projetos de lei poderá ser dado ainda nesta semana ou assim que ele retornar de viagem à Suíça, Rússia e Cazaquistão, para onde embarca no sábado.

Como pilar do novo modelo, uma nova estatal, constituída com 100% de capital da União, funcionará em Brasília com não mais que cem funcionários, contratados por meio de concurso público. Caberá a ela, cujo nome não foi escolhido até agora, administrar as reservas do pré-sal que não foram licitadas.

Para a escolha da empresa responsável pela exploração dos blocos, a nova estatal fará licitações em que sairá vencedor quem oferecer a maior parcela da produção de petróleo à União. O pagamento deverá ser feito em óleo bruto, não em dinheiro. Foi a forma encontrada pelo governo de decidir o que fazer com a produção – exportar o óleo bruto, abastecer o mercado interno ou
transformá-lo em combustível, agregando valor ao produto.

O critério definido enfrentou oposição do ministro da Fazenda, Guido Mantega, que preferia que a empresa ganhadora da licitação fizesse um pagamento por meio de bônus no ato da contratação. Seria uma espécie de valor da outorga, que entraria direto no caixa do Tesouro Nacional, com fins de arrecadação fiscal. Prevaleceu o pensamento dos ministros de Minas e Energia, Edison Lobão, e da Casa Civil, Dilma Rousseff. Eles defenderam o recebimento de uma fatia da produção total.

O principal ganho do governo será com uma parcela da produção, mas haverá
cobrança de bônus – como nos atuais leilões de concessão da Agência Nacional de Petróleo (ANP) -, com valor "fixo" e "mínimo", segundo auxiliares diretos do presidente Lula, que não pesará na escolha da operadora. Os recursos arrecadados com bônus irão para o Tesouro Nacional.

Os recursos obtidos com a venda do petróleo e de derivados advindos da partilha serão destinados exclusivamente a um fundo para benefício de gerações futuras por meio de investimentos na área social. "Os recursos serão carimbados", revelou um participante das discussões. Cogitou-se inicialmente destinar uma parte do dinheiro para obras de infraestrutura, mas a ideia não avançou. O nome do fundo ainda não foi definido pelo governo, embora já se esteja falando abertamente em um "Fundo de Responsabilidade Social".

Os percentuais mínimos da partilha – ou seja, o piso a partir do qual as operadoras deverão oferecer suas propostas nos leilões da nova estatal – não farão parte dos projetos de lei. Serão definidos mais adiante, no decreto de regulamentação das novas leis. Isso permitirá ao governo calibrar esse piso de acordo com as descobertas de novas reservas, a dificuldade e o ritmo de exploração. Uma preocupação é trabalhar com percentuais que "não esmaguem os investidores", segundo assessores do presidente.

Uma cláusula da lei poderá ser livremente acionada pela nova estatal para escolher, sem licitação, uma operadora para explorar um determinado bloco do pré-sal. Em teoria, será uma medida sem distinção legal entre as petrolíferas, podendo beneficiar até mesmo estrangeiras. Trata-se, no entanto, de uma cláusula feita sob medida para proteger a Petrobras.

O temor do governo é que a estatal perca, por deficiência de capital, seguidas licitações, se houver apetite exagerado das multinacionais pelos futuros blocos do pré-sal. O dispositivo deverá ser usado com parcimônia, segundo promete do governo, que contornou obstáculos jurídicos para dar preferência à Petrobras. O modelo, segundo a comissão interministerial que discute o assunto, segue o adotado pela Noruega, que pode acionar cláusula semelhante para beneficiar a Statoil. "Essa cláusula já foi usada na Noruega, mas isso é raro", disse uma fonte envolvida nas discussões.