Por Rodrigo Leão* publicado na Revista Fórum
Estudos recentes tem apontado que as medidas recentemente adotadas no setor petróleo, tanto pela Petrobras, como pelo governo brasileiro significariam uma progressiva substituição da política de conteúdo nacional pela de conteúdo internacional. As mudanças regulatórias – como o esvaziamento da política de conteúdo nacional –, o abandono das políticas públicas favoráveis ao desenvolvimento da cadeia de fornecedores e os desinvestimentos da Petrobras redirecionariam a forma de atuação das operadoras de petróleo no Brasil.
Essa hipótese se baseava em duas premissas: por um lado, no próprio direcionamento de curto e médio prazo de esvaziamento da política industrial coordenada pelo governo e pela Petrobras e, por outro, na crescente ocupação das grandes operadoras estrangeiras de petróleo e de suas fornecedores de origem no mercado brasileiro. No entanto, tal hipótese carecia ainda de fatos e ações mais concretas a fim de comprová-la. Pois bem: uma análise mais detalhada dos eventos ocorridos nas ultimas duas semanas atestam esse movimento mais geral de fim da politica de conteúdo nacional e promoção de uma de conteúdo internacional.Em primeiro lugar, no dia 05 de janeiro, a Petrobras acertou a venda de duas unidades de perfuração, a P-59 e a P-60, construídas nacionalmente pelo consórcio Odebrecht/UTC/Queiroz Galvão por um valor de US$ 77 milhões ante um valor de construção de US$ 700 milhões, segundo informações da Brasil Energia. Coincidência ou não, no mesmo dia, a Petrobras e a Diamond Offshore fecharam um acordo judicial para a empresa americana encerrar a ação que movia contra a estatal brasileira. Em contrapartida, a Diamond Offshore viu seu contrato para afretamento de unidades de perfuração com a Petrobras ser renovado e estendido por mais dois anos (até 2020) pelo regime de stand-by por um valor diário de US$ 289, com a Petrobras antecipando à companhia americana um valor de US$ 20 milhões. Caso esse valor não seja utilizado até o fim do contrato, a Diamond deverá recompensar a estatal brasileira.
Numa avaliação realizada pela Brasil Energia com consultores e especialistas do setor, os termos do acordo favoreceram amplamente a Diamond Offshore uma vez que garantiu “a renovação do contrato quando o mercado de sondas está em baixa”, além de fornecer um considerável aporte financeiro à empresa americana a priori.
Em segundo lugar, no dia 08 de janeiro, a PetroRio – empresa contratada pela HRT O&G para operar no campo de Polvo – renovou o contrato com a BW Offshore para utilização da sua FPSO Polvo (floating production, storage and offloading) por mais um ano com possibilidade de extensão por mais três, ou seja, o novo acordo poderá vigorar até 2021. Cabe ressaltar que, diferente do que muitas vezes se argumenta para a utilização de equipamentos estrangeiras, a FPSO Polvo é um equipamento bastante antigo – fabricado em 1981 no Japão – e tem sido utilizado há muito tempo na operação deste campo.
Em terceiro lugar, no dia 09 de janeiro, a Queiroz Galvão Exploração e Produção (QGEP) informou a chegada da FPSO Petrojarl I responsável pela exploração e produção no campo de Atlanta da Bacia de Santos. Embora a QGEP seja proprietário de 30% do campo e responsável pela operação do campo, a plataforma construída no estaleiro holandês Damen Shiprepair Rotterdam será terceirizada para que a norueguesa Teekay administre sua exploração e produção.
Em quarto lugar, no dia 15 de janeiro, quando anunciou a assinatura de novos contratos com a empresa norueguesa DOF para fornecimento de ROVs (robôs submarinos remotamente operados), a Petrobras informou que não deve realizar até nos próximos anos novos contratos para a realização deste serviço, a despeito do crescimento das operações no campo do pré-sal. E mais: que os contratos assinados são para substituir equipamentos nacionais. Segundo matéria da Brasil Energia, “a frota de ROVs utilizados pela área submarina da Petrobras (cerca de 75 equipamentos) não deve crescer nos próximos anos. (…) as licitações para adquirir RSVs (embarcações de apoio equipadas com ROVs), (…) são basicamente voltados a repor contratos existentes, como de barcos estrangeiros substituídos por similares de bandeira nacional”.
Esses eventos refletem a postura estratégica da Petrobras no segmento de exploração e produção: a crescente substituição de equipamentos e unidades nacionais por estrangeiros, mesmo no caso de unidades prontas para utilização. Além disso, mostra que, a despeito das oportunidades abertas pelo pré-sal, as compras de bens e serviços da Petrobras não devem se expandir a taxas muito elevadas no curto prazo, pelo menos observando as notícias mais recentes.
Em contrapartida, as operadoras privadas e/ou estrangeiras tem feito um movimento agressivo de contratação de equipamentos e unidades estrangeiras para operação no Brasil, inclusive empresas privadas nacionais. Nesse caso, vale lembrar que as grandes operadoras estrangeiras, como a Statoil e a Total, tem feito contratações de bens e serviços, para sua atuação no Brasil, em seus países de origem.
No caso francês, por exemplo, um matéria recente assinada por Diana Viola no Oil&Gas Financial Journal, sugere que a internacionalização das empresas francesas se caracterizou como um eixo estratégico do desenvolvimento do setor energético francês por três razões: 1) garantir o suprimento de óleo e gás num país em que o volume de reservas é relativamente baixo para atender sua demanda; 2) aproveitar novas oportunidades no mundo no segmento de energia; 3) permitir a expansão da cadeia de fornecedores, inclusive de menor porte, em termos globais.
Essas são apenas alguns exemplos de informações que devem ser corriqueiras no mercado brasileiro de petróleo e gás daqui em diante. Notícias sobre aquisição de plataformas e equipamentos no exterior, integração das cadeias produtivas estrangeiras aproveitando-se do pré-sal e desinvestimentos no setor produtivo nacional a partir da Petrobras tendem a ser cada vez mais frequentes. A lenta recuperação do emprego do setor de petróleo e gás brasileiro, bem como a eliminação de várias indústrias locais completam um cenário desolador frente as imensas oportunidades e expectativas trazidas pela descoberta do pré-sal para a indústria brasileira.
*Rodrigo Leão é Economista (FACAMP) e mestre em desenvolvimento econômico (IE/UNICAMP). Atualmente, é um dos coordenadores do Grupo de Estudos Estratégicos e Propostas (GEEP) da FUP e pesquisador visitante do NEC-UFBA