Opera Mundi
Desde meados de dezembro do ano passado, os principais jornais venezuelanos – a grande maioria contrária ao governo – noticiam que há uma falta crônica dos principais itens da cesta básica nos supermercados do país. Açúcar, óleo vegetal, farinha de milho e leite, entre outros, estão em falta nas prateleiras e o que chega aos comerciantes estaria sendo vendido com ágio. As palavras “crise” e “desabastecimento” estampam as manchetes.
De fato, basta visitar um mercado de redes privadas em Caracas para comprovar que, se há abundancia de produtos como iogurtes, queijos e carnes, faltam os de primeira necessidade. Por outro lado, em estabelecimentos controlados pelo Estado, como o Gran Abasto Bicentenário – um hipermercado localizado próximo a Praça Venezuela na capital –, é possível encontrar esses itens.
A explicação para o atual cenário, de acordo com o governo do país, está no controle que grupos empresariais contrários ao presidente Hugo Chávez ainda detêm sobre a cadeia de abastecimento alimentar venezuelana. Com a economia baseada na extração do petróleo, o país sul-americano depende historicamente da produção agrícola ou industrial externa, tornando-se refém da importação. Apesar de ter empreendido medidas para corrigir esse problema e buscar a soberania alimentar, como a aprovação de uma lei de reforma agrária, a atual administração ainda depende de empresas privadas venezuelanas e estrangeiras para distribuir alimentos à população.
Para o governo, o momento atual se trata de uma estratégia de desestabilização empreendida por opositores. O ministro da Alimentação, Carlos Osorio, disse no dia 9 de janeiro que as falhas na distribuição de alimentos de primeira necessidade foram provocadas pela “direita venezuelana”. Segundo ele, as plantas de processamento, centrais açucareiras, armazéns e alguns pontos de comercialização privados retiveram produtos da cesta básica para gerar uma falsa crise.
Nesta segunda-feira (14), foram encontradas doze toneladas de açúcar escondidos em um mercado de Maracaibo, Estado de Aragua. Outros flagrantes foram feitos pelo governo desde o começo deste ano. Para combater o problema, foi criada uma linha 0800 para denúncias, e o Ministério Público do país mobilizou mais de vinte fiscais para monitorarem a situação.
“Já não somos o mesmo governo de 2002, agora temos leis, decretos e instituições que velam pelo normal processamento, armazenamento, distribuição e comercialização dos alimentos, não para criar ansiedade, ou especulação, ou retenção, mas para satisfazer a dieta dos venezuelanos”, afirmou Osorio.
Paro petroleiro
O ministro se referia à paralisação petroleira e comercial levada a cabo pela oposição em 2002 e 2003, em uma segunda tentativa de derrubar o governo chavista, após o golpe de Estado de 11 de abril. Durante 64 dias de locaute a população não teve acesso a combustível e alimentos por pressão dos empresários – o prejuízo somente do setor petroleiro contabilizou 15 bilhões de dólares.
Os empresários do ramo de alimentos culpam o governo pela dificuldade em distribuir os produtos. No mês passado, a Fedecámaras, federação empresarial do país e histórica desafeta de Chávez, disse que o governo precisa flexibilizar a entrega de divisas para que o setor possa abastecer a demanda nacional. Para eles, seria impossível cumprir os valores previstos em tabelas de preços frente ao controle atual do câmbio e à falta de reajustes.
“Há uma campanha midiática que fala de desabastecimento. Pedimos calma e que a população não faça compras nervosas”, reiterou Naudys, Vázquez, gerente geral de comercialização da Pdval, braço agrícola da petroleira PDVSA, que canaliza parte de seus lucros para programas de reforma agrária.