O economista do Dieese fala sobre a importância e o impacto das novas reservas de petróleo descobertas pela Petrobrás na camada de pré-sal


    Henrique Jäger é economista do Dieese e assessor político da FUP. O economista tem subsidiado nos últimos anos as campanhas da Federação e da CUT sobre a importância de um novo marco regulatório no setor petroleiro. Para assegurar os direitos dos brasileiros, a Federação dos Petroleiros e a Central dos Trabalhadores participam do Fórum Nacional de Luta Contra a Privatização do Petróleo e Gás, lançado no dia 15 de março na ABI. O Seminário tem como principal objetivo barrar os leilões de áreas produtoras de petróleo e gás e avançar na luta pela nacionalização dos recursos energéticos e naturais.

            O Fórum terá como principais eixos: barrar os leilões das áreas promissoras de petróleo e gás; mudar o marco regulatório do setor (Lei 9478/97, que acabou com o monopólio da Petrobrás); lutar pela nacionalização das reservas de petróleo e gás. Entre as principais propostas de ação, está a realização de um ato nacional, em junho, no Rio de Janeiro; o lançamento de um abaixo assinado contra os leilões de petróleo e gás que será entregue ao presidente Lula e à Casa Civil.

            Para nos representar nesta importante arma na luta contra a privatização, contamos com Henrique que também é responsável pela assessoria do Dieese à FUP, já foi Subsecretário de Trabalho do Estado do Rio de Janeiro. Ele fala nessa entrevista sobre a importância e o impacto das novas reservas de petróleo descobertas pela Petrobrás na camada de pré-sal.

 

Qual a importância para o povo brasileiro das novas reservas de petróleo recentemente descobertas pela Petrobrás?

 

Olhando especificamente para a magnitude das descobertas – a Petrobras divulgou estimativas para o campo de Tupi entre 5 e 8 bilhões de barris de petróleo e  posteriormente informou a descoberta de uma grande jazida de gás natural e condensado, a qual denominou Júpiter, com dimensões similares à observada no campo de Tupi – podem representar um crescimento de aproximadamente 100% de nossas reservas de hidrocarbonetos.

Para além do aumento imediato de nossas reservas, estas descobertas têm vários outros significados: Em primeiro lugar, é o coroamento da política de pesquisa e desenvolvimento adotada pela Petrobras à partir do ano de 2003. Só para se ter uma idéia, a Petrobras já descobriu, desde sua criação, cerca de 25 bilhões de barris de petróleo no Brasil, metade destes de 2003 em diante, sem considerar as duas últimas listadas acima. Em segundo lugar, estas descobertas, ao que tudo indica, parecem ser a ponta de um “iceberg”, que segundo a direção da Petrobras pode desembocar na descoberta de uma das maiores províncias petrolíferas do mundo, que se estende da costa do Espírito Santo até Florianópolis, colocando o Brasil como um dos países com as maiores reservas de petróleo do mundo.

 

Qual a dimensão dessas descobertas para o movimento sindical?

 

Primeiramente, é a confirmação para a sociedade de uma certeza que o movimento sindical e os trabalhadores da Petrobras sempre tiveram: de que a luta para preservar a Petrobras como empresa estatal foi um êxito. Isto porque nenhuma empresa privada do mundo ia investir mais de um bilhão de dólares em projetos de elevado risco como no caso dos campos de Tupi e Júpiter. Sem estes investimentos a possibilidade de identificar esta nova província petrolífera. Mais ainda, estas descobertas impõem a necessidade de se retomar o debate em torno do marco regulatório do setor de hidrocarbonetos no Brasil. A legislação atual, cunhada nos tempos liberais de FHC, quando o preço do barril do petróleo rondava a casa dos R$ 12,00, tinha como marco definidor a falsa suposição de que o país não tinha petróleo e que as atividades petrolíferas aqui eram de grande risco. Sem saber o que tinha embaixo da terra, os leilões de blocos para exploração, desenvolvimento e produção de petróleo realizados pela ANP já venderam 25% desta nova província petrolífera. Só que agora o barril do petróleo esta acima de US$ 100,00.

Agora é hora de parar todo este processo, olhar para frente de forma estratégica de modo que estas novas descobertas não sejam alijadas da população brasileira, passando à contribuir de forma contundente para a melhoria da qualidade de vida da parcela mais desprovida de nosso povo. Para atingir este objetivo a legislação do setor vai ter que mudar até mesmo os critérios para distribuição dos Royalties.

Logo após a divulgação do Campo de Tupi, o governo brasileiro declarou que as novas descobertas alteram completamente a atual política do setor petróleo. Há espaço para a FUP impor a agenda dos trabalhadores, que há anos tentam discutir um novo marco regulatório?

A FUP e os sindicatos de petroleiros sempre defenderam a suspensão dos leilões com a implantação imediata de um amplo debate com a sociedade brasileira para discutir um novo marco regulatório do setor de hidrocarbonetos no Brasil.

Como estas descobertas colocam o país em uma posição confortável em termos da relação produção versus reservas de petróleo (acima dos 30 anos), a direção da FUP entende que a decisão do governo de retirar os blocos da região pré-sal da nona rodada de licitações da ANP foi tímida, tomada sob forte influência das pressões exercidas pelos representantes das empresas privadas encastelados na ANP. Para a direção da FUP a medida correta seria o fim das rodadas de licitação de blocos exploratórios para a construção do novo marco regulatório do setor no país.

Mas, a direção da FUP reconhece que a retirada dos 41blocos localizados na região do pré-sal representa um grande avanço, principalmente se analisada em conjunto com as declarações de importantes autoridades do Governo Federal que evidenciaram a necessidade de se rever o marco regulatório do setor no país.

Sem dúvida alguma as descobertas dos campos de Tupi e Jupiter são mais um marco no setor petróleo do Brasil, assim como as primeiras descobertas de petróleo comercializável no sertão da Bahia, na década de 50 e  o início da produção “off Shore” da bacia de Campos, em meados dos anos 70, abrirão caminho para a auto-suficiência em petróleo alcançada pelo Brasil por meio da Petrobras, em 2006.

 

Algumas empresas estrangeiras são parceiras da Petrobrás nos campos descobertos na camada de pré-sal. Como será feita a divisão da produção? A Petrobrás corre risco de subsidiar o petróleo que será consumido por outros países?

 

No campo de Tupi, a Petrobras é a empresa operadora, detém 65% do investimento. As outras duas empresas entram com 35% dos investimentos e ficam com 35% dos resultados. O petróleo fica com a Petrobras. No Campo de Júpiter a Petrobras participa com 80% e a sua parceira é a empresa portuguesa Galp S.A.

 

E em relação à tão propagada crise do gás? Essas reservas tornarão o Brasil menos dependente do gás da Bolívia?

 

No curto prazo nada muda, as alterações só serão sentidas no começo da década que vem, quando a Petrobras estiver explorando Tupi e Júpiter de forma ativa. Quando chegar este momento nossa dependência da importação de gás natural vai se reduzir sensivelmente. Mas não podemos perder de vista a necessidade de se iniciar – concomitantemente com o debate para definir o novo marco regulatório do setor -, um debate para definir a matriz energética que queremos para o futuro do país, pensando no nosso projeto de desenvolvimento com distribuição de renda e trabalho descente. O brasileiro ocupa a 82° posição em termos de consumo de energia per-capita do mundo. Mas ocupamos posição de destaque quando comparamos o consumo de energia por cada dólar de Produto Interno Bruto, superando em três vezes o gasto no Japão e em um terço o que é gasto nos EUA. Isto ocorre porque as indústrias que se instalam aqui são intensivas em energia (siderúrgicas, papel e celulose, alumínio, etc) e produzem um baixo valor agregado. Vamos continuar com esse modelo? Assim vamos avançar no desenvolvimento com distribuição de renda e geração de trabalho descente?

 

As novas descobertas da Petrobrás podem alterar a Lei do Gás, que está em tramitação no Congresso?

 

Como já sinalizado antes, as descobertas são um importante elemento que reforça a necessidade de se retomar o debate sobre o marco regulatório do setor de hidrocarbonetos no país. Mas especificamente sobre a tramitação da Lei do Gás não tem muita interferência. Isto porque a referida Lei hora em tramitação no Congresso nacional esta mais preocupada com o processo de transporte e distribuição do Gás Natural do que com o processo de prospecção e produção desta importante fonte de energia primária