O dirigente da Fenupetrol fala sobre a situação dos petroleiros do Peru e a importância da interlocução com a FUP


O Peru é um dos países da América Latina em que a Petrobrás mais investe na área de produção e exploração. A empresa é hoje responsável por 12,51% do petróleo e gás extraídos do subsolo peruano e deverá multiplicar essa produção nos próximos anos, quando os demais campos que explora entrarem em atividade. As relações de trabalho em Talara, província petrolífera operada pela Petrobrás na costa Norte do Peru, são precárias e a FUP vem atuando, desde 2003, para que a empresa respeite os sindicatos locais e garanta melhores condições de trabalho para os petroleiros peruanos. O secretário de Relações Internacionais e Capacitação Sindical da Fenupetrol, Moises Ochoa, passou um mês no Brasil, conhecendo a organização sindical da categoria e acompanhando as intervenções da FUP. A Fenupetrol foi criada em 2003 e reúne 11 dos maiores sindicatos de trabalhadores do setor petróleo e energético do Peru. Em entrevista concedida durante o XIV CONFUP, Moises fala sobre a importância do intercâmbio com os brasileiros e detalha a situação do setor petróleo em seu país.

Que impressões você leva da nossa organização sindical e como esta experiência pode ajudar os petroleiros peruanos?

Eu, assim como outros petroleiros do Peru, já tinha uma ótima impressão dos companheiros brasileiros. Nossas participações no X e XIV CONFUP`s só aumentaram a admiração e respeito aos movimentos sindicais do Brasil, que são extremamente organizados, o que ajuda muito no incentivo à luta. O engajamento, o preparo e a unidade entre os trabalhadores são exemplos a serem seguidos pelos petroleiros peruanos. Nossas organizações sindicais estão sendo reconstruídas no Peru, após décadas de ataques dos governos autoritários e neoliberais. E o intercâmbio com a FUP e a CUT é fundamental nesta luta.

Como a FUP pode contribuir para que a Fenupetrol avance na organização dos petroleiros peruanos?

A Fenupetrol e a FUP fizeram um contato inicial em novembro de 2003, durante um evento em São Paulo. A partir daí, tivemos várias visitas de dirigente da FUP em Talara (província petrolífera no Norte do Peru, onde a Petrobrás atua), quando puderam presenciar as condições de trabalho praticadas na região. A FUP tem interagido fortemente em nossos fóruns e seminários. Ajudou na realização do I Congresso Nacional da Fenupetrol e tem atuado de forma decisiva na reconstrução dos nossos sindicatos, contribuindo para o fortalecimento da nossa organização. As intervenções da FUP junto a Petrobrás resultaram em algumas mudanças importantes, como a melhora da interlocução com a empresa, reconhecimento das organizações sindicais e o cumprimento de certas obrigações trabalhistas. Graças à atuação da FUP, realizamos a primeira negociação coletiva com empresas prestadoras de serviço para a Petrobrás e estamos conseguindo reverter algumas práticas anti-sindicais. São avanços importantes, porém ainda precisamos de muitas mudanças, pois são imensos os problemas que enfrentamos. Por isso, é muito importante que a FUP e a Fenupetrol continuem atuando de forma conjunta nesta luta.

Você falou que os sindicatos peruanos estão em processo de reconstrução. Como a classe trabalhadora está enfrentando esta luta?

O governo do ditador Fujimori praticamente acabou com as organizações sindicais. Mais de 44 mil trabalhadores foram demitidos durante as privatizações, dirigentes sindicais foram assassinados, a reforma trabalhista acabou com a estabilidade no emprego e os movimentos sindicais e sociais passaram a ser criminalizados. Com o atual presidente Alan Garcia não tem sido diferente. Assim como Fujimori, ele não respeita as organizações sindicais e os movimentos sociais e nada tem feito para restabelecer os direitos do povo peruano. Pelo contrário, Alan Garcia criou uma lei que permite ao exército e a polícia usarem armas durante manifestações de ruas, autorizando-os a atirarem contra os manifestantes. Os trabalhadores, portanto, ainda estão enfrentando muitas dificuldades para se reorganizarem. Muitos sindicatos nascem e têm pouco tempo de vida, pois não há estabilidade para os militantes, tampouco respeito à liberdade sindical. Apesar de toda a repressão, seguimos na luta por uma nova legislação trabalhista, pela revisão dos contratos que privatizaram as empresas estatais e por políticas públicas de inclusão social e redução da concentração de renda. Fizemos uma greve geral no dia 9 de julho e estamos organizando uma nova mobilização nacional.

Como está configurada a indústria de petróleo no Peru?

Todas as explorações e produções de petróleo e gás natural no Peru estão nas mãos de empresas multinacionais de vários países, como a China, EUA, Espanha, Itália e mais recentemente do Brasil, através da Petrobrás. A estatal PetroPeru, apesar de sucateada, ainda detém o controle das refinarias. Aproximadamente 165 mil barris de petróleo são produzidos no Peru, dos quais 81 mil são para consumo interno. Metade da produção é exportada pelas multinacionais, que pagam ao governo peruano oito dólares por cada barril produzido e vendem lá fora pelo preço internacional praticado no setor, em torno de 147 dólares. O povo peruano não tem qualquer benefício, pois nenhum centavo do petróleo e gás produzidos no país é revertido em políticas sociais. Os recursos energéticos do Peru foram apropriados pelas multinacionais, que lucram milhões de dólares enquanto o povo passa fome e o trabalhador é explorado.

Qual a atual situação dos petroleiros peruanos?

Os petroleiros no Peru, de uma forma geral, estão sujeitos a condições de trabalho precarizadas. A jornada de trabalho é muito longa. Pela lei peruana, deveria ser de 8 horas, mas na prática, eles fazem turnos de revezamento de 12 horas diárias, que totalizam 60 horas semanais. A situação é ainda pior para os trabalhadores das empresas que prestam serviço para as multinacionais. São mais de 200 empresas terceirizadas no ramo petrolífero. A maioria dos trabalhadores reside em lugares distantes e gasta por volta de 2 horas de viagem para chegar ao local de trabalho. Os equipamentos de proteção industrial que deveriam ser descartáveis, como fones de ouvido e luvas, acabam sendo reaproveitados, expondo os trabalhadores à contaminação por agentes químicos. Os campos de produção ficam em regiões desertas, áridas, com muita poeira e temperatura média de 38º. Os locais para alimentação são pequenos e sem condições apropriadas de higiene. O salário é totalmente defasado em relação ao s petroleiros de outros países, sem falar que não recebem pelas horas extras trabalhadas. A segurança nos campos de produção não existe. As empresas são extremamente exploradoras, os petroleiros não têm benefícios básicos, como a lavagem industrial dos uniformes, e sequer contam com um acordo coletivo de trabalho.

E em relação aos trabalhadores da Petrobrás?

A Petrobrás implementou alguns benefícios para os petroleiros, como ajuste de salário e verba para transporte e alimentação. Através da ação conjunta da FUP com as organizações sindicais do Peru, conseguimos atualizar o piso salarial dos trabalhadores da empresa. Hoje é proibido pagar menos de 680 Nuevos Soles. O salário mínimo no Peru é de 550 Nuevos Soles e a Petrobrás paga entre 700 e 1600 Nuevos Soles para seus empregados. No entanto, a empresa ainda deixa muito a desejar em relação às condições de trabalho, saúde e segurança. A falta de uma lavanderia em Talara, por exemplo, é um problema gravíssimo, já que os trabalhadores são obrigados a lavar seus uniformes em casa, contaminando seus familiares.

Como a Petrobrás atua no Peru?

A Petrobrás tem a concessão de 12 campos de petróleo no Peru, mas está produzindo apenas na província petrolífera de Talara, na costa norte do país. Os outros 11 campos estão ainda em fase de preparo para entrar em produção. Quando esses campos começarem a operarem, a Petrobrás irá torna-se uma das maiores empresas petrolíferas do Peru, pois os campos que tem concessão são regiões de grandes reservas de petróleo e, principalmente, de gás. Em Talara, a empresa já produz 14.174 barris de petróleo por dia e emprega 162 trabalhadores diretos, sendo que apenas 62 estão nas atividades de operação, atuando como fiscais de contrato com as terceirizadas, que são responsáveis pela exploração e produção dos mais de 100 poços da região. A Petrobrás em Talara tem cerca de 1.300 trabalhadores terceirizados, que têm salários diferenciados e condições precárias de trabalho e segurança.

A gestão da empresa no Peru age de forma autônoma ou segue as diretrizes da Petrobrás no Brasil?

A partir de outubro de 2007, a Petrobras Peru passou a reporta-se ao Brasil e não mais à Argentina (onde está localizado o escritório central da Perez Compac na América do Sul). Isso foi um grande avanço para os trabalhadores, pois a interlocução com as gerências do Brasil é muito melhor do que com os dirigentes da Perez Compac, cujos ativos foram adquiridos pela Petrobrás, mas o corpo gerencial permaneceu inalterado e com as mesmas práticas do passado.