Em entrevista ao Sindicato dos Químicos e Petroleiros da Bahia, o coordenador da FUP, Hélio Seidel, analisa o projeto de lei que trata da regulamentação da indústria de transporte de gás no Brasil. O projeto, conhecido como Lei do Gás, foi aprovado por uma Comissão Especial da Câmara dos Deputados Federais e seguiu para o Senado. A FUP fez pressão no Congresso Nacional e conseguiu derrubar algumas das armadilhas privatistas que estavam em discussão inicialmente no escopo do projeto, mas há vários problemas ainda que não foram resolvidos. É o caso, por exemplo, da definição de consumo próprio, que quebra a verticalização do ramo de gás natural na indústria de petróleo, ao obrigar as empresas produtoras de gás a repassarem o produto às distribuidoras estaduais. Nesta entrevista, publicada na última edição do boletim do sindicato baiano, Na Base, o coordenador da FUP avalia esta e outras questões relativas à Lei do Gás. Veja a íntegra da entrevista:
Quais são as principais preocupações da FUP e Sindicatos em relação ao atual projeto da Lei do Gás que tramita no Senado?
As preocupações maiores dizem respeito basicamente a dois aspectos que estão presentes no projeto, e que não conseguimos mudar. São a aprovação do sistema de concessão para construção de infra-estrutura, além do sistema de autorização já presente. O Ministério das Minas e Energia e a ANP definiram qual das duas modalidades serão utilizadas para os novos empreendimentos. Até hoje vigorava somente o sistema de autorização, e estava aberto a qualquer empresa, no entanto somente a Petrobrás tem investido na área. No sistema de autorização o empreendedor corre todos os riscos do empreendimento, no sistema de concessão geralmente existem mecanismos, para proteger os empreendedores, ou os capitalistas que deveriam de topar correr riscos e acatar o sistema de autorização, fizeram o maior lobby em prol do sistema de concessão, onde no final das contas o estado ou os consumidores darão salvaguardas para seu empreendimento.
O outro ponto polêmico e do qual temos muitas preocupações, é a chamada figura do CONSUMO PRÓPRIO, presente na lei. Pelo projeto aprovado na comissão especial, o produtor (a Petrobrás é quem produz quase hoje a totalidade do gás no país), não poderá utilizar o gás para seu próprio consumo, seja nas refinarias, termelétricas ou nossas FAFEN´s. Depois de muita pressão ficou assegurado nos artigos 55 e 54 do projeto, o atual regime de consumo (no momento da promulgação da lei), mas ainda temos dúvidas da eficácia desse mecanismo, quanto ao consumo para 100% da capacidade instalada bem como de futuras ampliações. O gás deverá ser repassado (negociado) com as companhias estaduais e depois recomprado. De qualquer forma novos empreendimentos utilizando gás natural, terão um gás bem mais caro do que é hoje.
Se aprovada a Lei como está, qual será o problema em relação ao regime de concessão pública para os futuros empreendimentos da indústria do gás natural?
Com relação ao regime de concessão pública, certamente todos os empreendimentos da Petrobrás na área de logística (pelo menos) da indústria de gás natural, bem como de exploração e produção, serão reavaliados, considerando a nova rentabilidade desses empreendimentos e as regras para cada desses empreendimentos de logísticas que poderão ter de ser compartilhado com até mesmo concorrentes. Essa situação poderá inviabilizar alguns empreendimentos, por que não interessa , mesmo que as vezes rentável, construir estruturas que poderão ser utilizadas por concorrentes, que não querem investir em infra-estrutura própria.
Após a tramitação no Senado, quais serão os próximos passos do projeto?
O projeto foi encaminhado ao senado federal que poderá acatar integralmente ou propor alterações ao mesmo, depois segue para a câmara novamente. Se chegar a câmara sem alterações, e não for debatido no plenário, a casa poderá considerá-lo aprovado e encaminhar para sanção presidencial. Caso seja levado ao plenário, o texto poderá sofrer novas alterações. O grande problema é o seguinte: com a composição conservadora e até mesmo pendendo mais a direita de nosso parlamento, chamar o mesmo para debate com intuito de mudar os pontos acima, poderá abrir flanco para a direita tentar retornar outros aspectos nefastos derrubados na comissão especial.
De que forma a Petrobras e a sociedade poderão ser prejudicadas com a aprovação da lei do Gás?
Com o projeto aprovado, certamente a rentabilidade que a Petrobrás obtém no Gás Natural será reduzida, e com isso como falamos acima muitos projetos poderão ser reavalidos. Não temos dimensão ainda do montante prejuízo à Petrobrás ou da perda de rentabilidade do Gás Natural para a empresa. Por outro lado, os governos estaduais, todos, fizeram um grande lobby junto com a Abegas (associação das empresas estaduais de gás) em prol da aprovação do mesmo. Nesse caso de olho na receita de ICMS para seus estados, e as companhias estaduais pelo lucro adicional que obterão. Vale ressaltar que muitas companhias estaduais foram privatizadas (concessão), entre as quais as principais, dos Estados do RJ e SP.
Que ações estão sendo realizadas pelo movimento sindical para contestar este projeto?
Nos estamos avaliando ainda, tentando obter dados completos junto a área de Gás e Energia da Petrobrás. Também entendemos a necessidade de fazermos um seminário nacional para discutirmos a questão e os possíveis passos a serem tomados. Entendemos que a discussão não deve ficar somente no Gás Natural, no qual não somos auto-suficientes e nem temos expectativas de nos tornamos autosufcientes a médio prazo. Temos de discutir a Industria Petroquímica, para a qual a Petrobrás está voltando, e de onde nunca deveria ter saído. È importante termos em mente que por essa situação de dependência com relação ao Gás Natural que o Brasil tem fica difícil pensarmos na industria Petroquímica a partir do gás natural. Sob essa lógica temos de pensar o setor e efetivamente o que priorizaremos na Lei do Gás Natural.