Rede Brasil Atual
Os nove vetos anunciados pela presidenta Dilma Rousseff ao projeto de lei aprovado em setembro na Câmara dos Deputados para alterar a Medida Provisória enviada pelo governo sobre o Código Florestal provocaram hoje (18) uma série de reações em todo o Brasil. Cada um por suas razões, ruralistas e ambientalistas rejeitam as mudanças. O primeiro grupo pretende ir à Justiça para fazer valer o que foi acertado entre os deputados, e o segundo considera insuficientes as mudanças propostas pelo governo naquilo que definem como a completa descaracterização do Código Florestal.
“Os vetos foram importantes e são uma sinalização de que a sociedade deve continuar se mobilizando e pressionando o governo, mas eles ainda são insuficientes”, diz Luiz Zarref, da direção do MST e da Via Campesina, destacando os vetos aos itens que “pretendiam acabar totalmente com a proteção na beira de rio para colocar o plantio de monocultura de frutíferas exóticas e que determinariam a diminuição da faixa mínima de terra que tem de ser recuperada à beira dos rios”.
Zarref, no entanto, aponta itens que permaneceram e são considerados críticos: “Um exemplo, coisa que é fundamental para a reforma agrária, é a descrição de pousio, que é o tempo em que a terra descansa sem ter cultura nenhuma. A MP do governo tinha colocado que o pousio poderia ser feito em 25% da área da propriedade a cada cinco anos, mas os deputados mudaram para 100% da área. Isso é a consagração do latifúndio improdutivo”, diz. Outra crítica diz respeito à manutenção da obrigação de só recuperar nascentes perenes: “É uma gigantesca agressão contra a maior caixa d’água do Brasil, que é o Cerrado, onde as nascentes são intermitentes e somem na época da seca”.
Advogado do Instituto Socioambiental (ISA), Raul do Valle também considera os vetos insuficientes e recorre a uma metáfora: “Imagina um cano cheio de furos, vazando água por todos eles, e você coloca o dedo em dois desses furos. É mais ou menos isso o que aconteceu. Com a sanção da presidente, após esses vetos, temos um novo Código Florestal que eu não gostaria de chamar de lei florestal. Eu a denominaria como a lei de legalização do desmatamento”, diz.
Valle discorda da afirmação feita pela ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, de que os vetos acabam com a possibilidade de anistia aos desmatadores: “O que a ministra está dizendo não corresponde à realidade. Vamos aos fatos. Na legislação antiga, que vinha desde 1934 até maio deste ano, os topos de morro tinham de ser restaurados, porque são áreas importantes para a recarga de aqüíferos. Na legislação nova, quem desmatou essas áreas não precisa restaurar nada, zero. Isso é anistia. Na legislação antiga, quem tinha desmatado uma nascente tinha de restaurá-la, ou seja, se tirou 50 tinha de devolver 50, e com floresta nativa, como era antigamente. Pela legislação nova, agora tem de restaurar só 15 metros em alguns casos, e em outros não têm de restaurar nada”.
Coordenadora de políticas públicas do Greenpeace, Renata Camargo também vê a continuidade da anistia aos desmatadores: “O texto do novo Código Florestal, que já era muito ruim, foi piorado no Congresso e caiu no colo da presidente Dilma. Já havia anistia no texto do governo, mas ele voltou para a presidente Dilma com a anistia ainda maior. Na nossa avaliação, ela pegou o texto, fez uns vetos, deu uma limpeza de forma que parecesse para a sociedade que estivesse preservando mais as florestas. Só que, na prática, a anistia continua nos textos. O governo continua dando uma sinalização de que não temos um Código Florestal, mas um código de consolidação de áreas agrícolas, desmatadas, inclusive, ilegalmente”, diz.
Batalha jurídica
Entre os ruralistas, a maior reação partiu do deputado federal Ronaldo Caiado (DEM-GO), liderança histórica do setor. Ele anunciou que seu partido dará entrada no Superior Tribunal Federal (STF) em uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) contra as medidas complementares anunciadas pelo governo para regulamentar o Código Florestal: “A presidente Dilma quer legislar e criar novas regras por decreto, mas não vamos aceitar. Esse instrumento existe para normatizar lei já existente, não para substituir leis aprovadas pelo Congresso Nacional”, disse.
Entre as medidas criticadas por Caiado, estão as novas normas gerais dos Programas de Regularização Ambiental (PRA) e do sistema de Cadastro Ambiental Rural. O deputado ruralista pretende cobrar da base governista o acordo firmado com a oposição antes da aprovação das alterações feitas na MP enviada à Câmara pelo governo: “Reitero a prerrogativa da presidente em vetar. Agora, legislar por decreto é um total desrespeito e invasão à soberania do Congresso Nacional. O produtor rural foi mais uma vez penalizado com regras incompatíveis à sua atividade”.
O advogado geral da União, Luiz Inácio Adams, contestou a ação de Caiado: “O próprio Congresso concordou que a regulamentação do PRA pode ser feita por decreto”, disse. A ministra Izabella Teixeira também demonstrou segurança: “Tenho a tranqüilidade de que nós estamos cumprindo a lei de acordo com o debate feito no Congresso Nacional. No texto que veio do Congresso está lá: nos demais casos, por intermédio do PRA, o Poder Executivo editará normas para a regra. Foi o que nós fizemos. O Congresso deu esse mandato para o Poder Executivo. Está escrito”, disse.