Mulheres de todo o mundo: uni-vos contra a violência





No próximo dia oito de março, mulheres de todo o mundo comemoram os cem anos do Dia Internacional da Mulher. Antes de ser oficialmente instituído pela ONU em 1975, este dia de luta ganhou caráter mundial a  partir de uma proposta da feminista Clara Zetkin durante a II Conferência Internacional de Mulheres Socialistas, realizada em Copenhague, na Dinamarca, em 1910.

Desde o final do Século XIX,  em vários países do mundo as mulheres já se organizavam para lutar pelo direito ao voto, por autonomia e igualdade, contra a opressão e a exploração.  Até o fim da primeira década do Século XX, as operárias americanas realizaram diversas greves, que foram duramente reprimidas. Em 1908, comemoraram o primeiro “Woman’s Day”, que reuniu 1.500 mulheres. Deste dia até a conquista do voto feminino nos EUA passaram-se doze anos. Durante este período, as mulheres da Europa também organizavam greves  e reivindicavam direitos, tendo participado ativamente das ações que deram origem à Revolução Russa.

No Brasil, conquistamos o direito ao voto em 1932, no entanto, até hoje ocupamos menos de 10% das vagas da Câmara Federal. Por aqui, as necessidades de um mercado nacional emergente ajudaram a libertar as mulheres do ambiente doméstico, mas sua inserção no mundo do trabalho permanece, ainda, marginalizada. Exceto as que estão no serviço público, as demais, ou estão concentradas em setores desvalorizados da economia, ou trabalham como “autônomas” no setor informal, sem nenhuma proteção social. Ao tempo que brigam por igualdade de salários e de oportunidades de ascenção em relação aos homens nas empresas, também brigam pelo reconhecimento e pela valorização do trabalho doméstico e de cuidados que continuam a realizar em suas casas. E por uma re-divisão sexual do trabalho. E por Políticas Públicas que façam o Estado assumir efetivamente sua cota de responsabilidade.

Entre avanços e retrocessos, conquistamos o direito ao divórcio e, mais recentemente, a Lei Maria da Penha. Mas será que nossas conquistas são permanetes? Como garantir que não teremos retrocessos?

Há cem anos, mulheres de todos os continentes celebram o Dia Internacional da Mulher como um dia de reflexão e de luta. Não podemos negar que o saldo deste primeiro século é bastante positivo; no entanto, apesar das inúmeras barreiras vencidas, a desigualdade, a opressão e a violência contras as mulheres persistem.

Nos surpreende pois, que em pleno Século XXI, o Superior Tribunal de Justiça do Brasil (STJ), que se auto intitula o “Tribunal da Cidadania”, contribua para a reprodução da violência contra as mulheres. Ao decidir (dia 24/02/2010) pela condicionalidade da representação da vítima para o ajuizamento de ação em casos de violência doméstica, o STJ “deforma” a Lei Maria Penha (Lei 11.340/06) e aumenta a vulnerabilidade das mulheres diante de seus algozes.

É óbvio que a vítima, seja qual for o tipo de violência doméstica que venha sofrendo, sentir-se-á intimidada em denunciar seu agressor. Em primeiro lugar porque mantem uma relação de afeto com ele, mas também porque pode dele depender financeiramente, o que permite a continuidade da  sujeição. Além disso, é comum que as mulheres sofram ameaças explícitas para não denunciar ou, quando conseguem oficializar a denúncia, sejam “orientadas” a desistir da ação pelo próprio advogado. Se conseguem levar o caso à juízo, muitas vezes ficam à mercê de Políticas Públicas inexistentes e de serviços de apoio que nunca foram adequadamente estruturados para recebê-las e ajudá-las a reconstruir suas vidas. E aqui não estamos falando de condições subjetivas, mas de questões bastante objetivas como o orçamento não destinado ou destinado e não aplicado nas casas abrigo, como o fato de, apesar da Lei Maria da Penha estar em vigência há quatro anos, juízes e tribunais continuarem se recusando a aplicá-la.

A Lei Maria da Penha não pode ser vista e interpretada por critérios frios e positivistas. Sua proposição e aprovação tiveram um caráter histórico e político. Seu conteúdo aponta para a reparação de uma injustiça secular cometida contra as mulheres, que é a privação de sua liberdade e autonomia pelos homens, através do uso da violência. Manter essa questão no ambiente privado é condenar as mulheres e o mundo a viver sob o jugo de um passado que queremos ter apenas como referência para o que não deve ser repetido. Esperamos que a decisão do STJ possa ser revertida para que as mulheres não tenham que pagar por mais este retrocesso.

Diante disso, ao comemorarmos os cem anos do Dia Internacional da Mulher, precisamos convencer o mundo que a violência contra as mulheres não pode sobreviver por mais um século, nem por uma década, nem por um mês.

Vamos às ruas neste 8 de março gritar que a nossa luta é todo dia; até o fim da violência contra as mulheres!