CUT
Cerca de mil manifestantes (estimativas não oficiais) encerraram o Dia Nacional de Lutas, organizado pelas centrais sindicais e movimentos sociais, com uma marcha pela regulamentação dos meios de comunicação através da avenida Luis Carlos Berrini, até a sede da TV Globo, em São Paulo, no fim da tarde de ontem (11). A marcha foi marcada pela diversidade de bandeiras de movimentos, sindicatos e partidos políticos, exigindo o fim da propriedade cruzada de empresas de mídia, a revogação de concessões pertencentes a políticos e a regulamentação do artigo 226 da Constituição Federal, que trata da comunicação.
O coordenador do Coletivo Brasil de Comunicação Social Intervozes, Pedro Ekman, explicou que a reivindicação é pela efetivação do que já está na Carta Magna brasileira. “A Constituição proíbe o monopólio e o oligopólio. Também proíbe a propriedade cruzada, ou seja, o mesmo dono ter emissoras de rádio e TV, revistas, jornais. Mas isso nunca foi regulamentado, não existe um conjunto de leis que explique o que fazer para impedir isso”, disse. Ekman afirmou que a escolha da Globo como alvo do protesto se deu por ela ser um símbolo de tudo que se quer transformar no sistema de comunicação do país, mas não exclui os outros grandes grupos de comunicação.
Mídia livre
Para Ekman, falar em censura quando se coloca a necessidade de regulamentar a mídia é um argumento empresarial para garantir o monopólio. “Nos Estados Unidos e na Europa há regulamentação. Temos um Projeto de Lei de iniciativa popular para democratizar a mídia que não tem uma linha que cite algum impedimento, ao contrário, proíbe absolutamente a censura prévia”.
Ele criticou inclusive a postura da presidenta Dilma Rousseff, ao propor os cinco pactos após as manifestações populares de junho, que não incluem a regulamentação da mídia. “Pode se falar de tudo no Brasil, menos de democratizar a comunicação”, afirmou.
Para o diretor do Centro de Estudos de Mídia Barão de Itararé, Altamiro Borges, a revolta dos manifestantes contra os meios de comunicação se dá pela própria forma como eles lidam com os acontecimentos. “Em um primeiro momento, no início das manifestações do mês passado, muitos veículos exigiram firmeza do governo estadual e da Polícia Militar paulista contra os manifestantes. Logo em seguida, mudaram de lado, tentando pautar o movimento. As pessoas vêm aqui hoje afirmar que não se aceita mais que apenas sete famílias controlem a mídia e o que pode ou não ser dito”, concluiu.
Portando faixas, cartazes e grandes bonecos representando os senadores José Sarney (PMDB-AP) e Fernando Collor (PTB-AL), que possuem concessões de televisão que retransmitem a TV Globo, respectivamente no Maranhão e Alagoas, os manifestantes seguiram pacificamente pela Berrini. Alguns colavam cartazes em paredes, muros e postes com as reivindicações, enquanto outros pichavam palavras de ordem pelo caminho. Ao chegar à sede da emissora, projeções onde se lia “Globo Mente” e “Globo Sonega” foram feitas usando a fachada do prédio como tela
Processo
O “sonega” fazia referência a um processo por sonegação fiscal, que a emissora responderia na Receita Federal, por não ter declarado valores repassados à FIFA pelos direitos de transmissão da Copa do Mundo de 2002. A emissora emitiu nota na tarde de ontem em que admite a existência do processo, mas afirma ter feito um acordo para pagamento dos tributos, estando em dia com o Fisco e ameaçando tomar medidas judiciais contra quem a acusar injustamente.
Mais cedo, um grupo de manifestantes projetou um feixe luminoso verde no estúdio do jornal SPTV, que tem como fundo a ponte estaiada Otávio Frias de Oliveira, chegando a atingir o rosto do apresentador Carlos Tramontina. “Um grupo de cerca de 400 pessoas fazem neste momento um protesto contra a TV Globo. Eles se reuniram em uma praça, na Zona Sul da cidade e caminham em direção à emissora. Os manifestantes pedem a democratização da mídia e a revisão nos contratos de concessões pública de TV. Eles gritam palavras de ordem contra a Globo. A manifestação é pacífica”, relatou o jornalista durante o SPTV 2ª Edição.
Repressão
Em frente à emissora, um grupo de 20 policiais militares do Batalhão de Choque aguardava os manifestantes, portando bombas de efeito moral e armas com balas de borracha. Ao constatar que eles não estavam identificados com as tarjas que trazem os nomes no uniforme policial, alguns manifestantes começaram a gritar “ditadura” e “PM assassina”. Questionado, o comandante da tropa, que se identificou como Major Sérgio Watanabe, também sem identificação, pediu que o grupo não se ativesse a “picuinhas e detalhes”. “Foi uma pequena falha no momento em que eles se equiparam. O responsável sou eu”, afirmou. Não houve confronto.
Em um ato simbólico, os manifestantes rebatizaram a Ponte Estaiada Otávio Frias de Oliveira, falecido proprietário do jornal Folha de S.Paulo, com o nome do jornalista Vladimir Herzog, morto em 1975 sob tortura de agentes da repressão, no DOI-Codi paulista. À época, ele era diretor de jornalismo da TV Cultura.