Por Júlio Turra, da Executiva Nacional da CUT
Governo ignora entidades e movimentos e abre mão de boa fatia do Pré-sal
O dia 21 de outubro ficará com a marca de ter sido a data da entrega de uma parcela importante do petróleo do Pré-sal para multinacionais e estatais chinesas, que juntas controlam 60% do único consórcio que se apresentou para explorar o megacampo de Libra, no qual a Petrobrás tem 40% (só 10% a mais dos 30% obrigatórios que teria por lei).
Enquanto bombas de gás e balas de borracha afastavam manifestantes que protestavam contra o leilão, no interior do luxuoso Hotel Windsor, na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, o ministro das Minas e Energia, Édson Lobão (PMDB) dizia debochadamente “enquanto tem barulho lá fora, estamos trabalhando”. Só não disse para quem, o que ficou evidente ao final do leilão.
Além da cortina de fumaça contra os manifestantes, há uma outra, depois do leilão, que é feita sobre a sua realidade.
A presidente Dilma falou à nação que 85% da renda ficará no Brasil, num malabarismo numérico destinado a acalmar descontentamentos ou mesmo a aliviar consciências pesadas.
O fato, como disse João de Moraes, coordenador da FUP, é que o “país ficou mais pobre”, pois era dono de 100% de um petróleo encontrado pela Petrobrás num campo com capacidade de produção entre 12 e 15 bilhões de barris, depois do leilão vai entregar mais da metade dessa riqueza a outras mãos.
Por que não utilizar o artigo 12 da própria Lei do Pré-sal?
Depois do discurso de Dilma, apareceram vários defensores do leilão argumentando que “não houve privatização”.
Ora, além do fato da própria Petrobrás não ser 100% estatal, mas uma empresa mista onde a União tem 50% mais um das ações com direito a voto (por isso nomeia o presidente), quem pode afirmar que multinacionais como a Shell e Total, além de estrangeiras como são as chinesas, não são empresas privadas?
Há também o argumento de que o regime de partilha da Lei do Pré-sal é muito melhor do que o de concessão, criado por FHC e em vigor nas áreas fora do Pré-sal até hoje.
Isso não se discute, a partilha em tese é melhor que a concessão, mas a própria Lei 12.531 de 2010 permite, em seu artigo 12, que a União contrate a Petrobras sem licitação para áreas estratégicas, definidas como aquelas de baixo risco e alta produtividade. Ora, e o que é Libra senão isso?
Como disse o economista Carlos Lessa, “nenhum país do mundo faz partilha de um campo já conhecido”, ainda mais um que é “ouro em pó”.
Por que não se utilizou o artigo 12, se a própria presidente da Petrobras, Graça Foster, afirmou em audiência pública no Senado que a empresa teria condições de assumir Libra?
Para o já citado Lessa, porque “o país quer aparecer para o capital financeiro mundial como bem comportado, para atrair mais capital de curto prazo para o Brasil”.
De toda forma, cedo ou tarde, a realidade de que uma expressiva parcela do patrimônio do povo brasileiro, que são as reservas do Pré-sal, foi entregue a mãos privadas e estrangeiras, vai se impor sobre cálculos percentuais que visam provar o contrário.
Mais do que isso, o fato de que uma presidente eleita com um discurso de que “privatizar o Pré-sal é crime” tenha feito o leilão de Libra, não ficará sem consequências políticas.