Rede Brasil Atual
Um dos pontos principais da discussão que envolve o Projeto de Lei (PL) 2126, de 2011, referente ao Marco Civil da Internet é a questão dos data centers, locais utilizados para armazenamento e gerenciamento de dados dos provedores de conexão, bem como provedores de aplicativo de internet estrangeiros. O texto terá um substitutivo em atendimento a decreto do Poder Executivo exigindo que tais instalações, mesmo em se tratando de provedores estrangeiros, deverão ficar localizadas em território brasileiro.
A exigência quanto a este aspecto do tema, feita depois da confirmação de que o governo norte-americano estaria monitorando e-mails e informações de agentes públicos do Brasil, também estabelece que o teor do PL terá de considerar questões como porte dos provedores, faturamento destas empresas no país e amplitude da oferta do serviço junto ao público brasileiro, o que provocou controvérsias, sobretudo perante os representantes das empresas do setor. Para o deputado Alessandro Molon (PT-RJ), relator da matéria, as novas regras foram incluídas no PL em atendimento a pedido do Palácio do Planalto, mais precisamente da própria presidenta Dilma Rousseff, depois das denúncias de espionagem dos Estados Unidos contra empresas e autoridades brasileiras.
Molon deixou claro que não pretende, com o seu projeto, estimular a implementação de data centers no Brasil, até porque sabe que há empresas com capacidade de armazenamento fora do país impossível de ser alcançado internamente. Porém, a intenção é contribuir para a preservação e a segurança destes dados.
Carestia e isolamento
Visto como comandante da resistência ao texto de Molon, o líder do PMDB na Câmara, deputado Eduardo Cunha (RJ), entende que o projeto apresenta dispositivos importantes que abordam a questão da defesa da privacidade dos usuários, mas é importante rever qualquer critério mais rígido em relação a essa questão dos data centers. “Não adianta a gente achar que vai se isolar do mundo porque resolvemos criar uma regulação e impedir que a população se beneficie por tudo de bom que aí está, pelos avanços da tecnologia.”
Representando a Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom) – entidade que representa grandes conglomerados da internet, como o Google e a Microsoft – o executivo Nelson Wortsman afirmou que o custo para criar e manter um data center no Brasil é, segundo ele, pouco competitivo e representa cerca de US$ 60 milhões como investimento inicial.
“Nos Estados Unidos, este mesmo tipo de investimento pode ser feito por US$ 43 milhões”, enfatizou. Ainda em relação aos equipamentos, Wortsman disse que para manter esse tipo de sistema no Brasil seria necessário um custo de US$ 1 milhão ao ano. O executivo sugeriu, em contrapartida, que o governo brasileiro passasse a estimular a instalação de data centers com incentivos fiscais, de modo a fazer com que a empreitada passe a ter um caráter mais atrativo para o setor.
Já o diretor jurídico da Associação Brasileira das Empresas de Software, Antonio dos Santos, ressaltou que o principal temor da entidade que ele representa é que a medida leve muitos provedores a deixarem de oferecer serviços básicos aos usuários brasileiros. “Os provedores podem não querer criar Data Centers no Brasil, porque o custo de manter esses bancos de dados no País é muito elevado”, frisou.
De acordo com o deputado Alessandro Molon, a obrigatoriedade é importante porque tem como objetivo mostrar claramente, às outras nações e às empresas, que o Brasil é contrário ao monitoramento de dados dos seus usuários. Atualmente, conforme deixou claro o deputado, as empresas de internet recorrem ao Judiciário brasileiro em casos que afetam a questão de violação de informações para argumentar que não se aplicam a elas as leis brasileiras referentes ao sigilo da comunicação, uma vez que os dados estão armazenados em outros países.
“É esse tipo de brecha que precisa acabar”, destacou o parlamentar ao acrescentar que, por conta disso, o seu substitutivo estabelece que os provedores deverão respeitar a legislação brasileira, “incluindo os direitos à privacidade e o sigilo dos dados pessoais, mesmo que a empresa seja sediada no exterior”.
O deputado acrescentou ainda, em resposta às críticas quanto ao teor do texto neste quesito, que o texto do PL não obrigará provedores de serviços na internet como Google e Facebook a guardar todos os registros de acessos a aplicativos, exceto em casos de ordem judicial. “Se obrigamos todos os provedores de aplicação a guardarem os registros de acesso a aplicativos, isso facilitaria a investigação criminal, mas geraria peso muito grande para os pequenos provedores de aplicações na rede, como os blogueiros”, disse. “No texto, o sigilo é a regra, e a exceção é a guarda de toda a navegação do usuário a partir da ordem judicial”, completou.
O deputado também explicou que o Marco Civil da Internet fortalecerá a privacidade dos internautas coibindo que dados pessoais passem a ser analisados e vendidos para terceiros, o que hoje tem acontecido. “Conforme estabelece o texto, sempre que os provedores de aplicativos de internet guardarem os registros de navegação dos internautas e seus dados pessoais, deverão deixar isso claro para o usuário. Hoje a navegação dos brasileiros é gravada, analisada e vendida, e isso passa a ser coibido”, enfatizou o relator do projeto.
Mesmo assim, o assunto não ficou totalmente esclarecido para os parlamentares. O deputado João Arruda (PMDB-PR), presidente da comissão especial que analisa o projeto, argumentou que, em sua avaliação, a medida não resolverá o problema da espionagem no Brasil. “A resposta que a presidenta Dilma Rousseff está buscando envolve investimentos no Serviço Federal de Processamento de Dados, o Serpro. Os data centers são instalados de acordo com o custo, consistem numa questão de mercado. Precisamos, isso sim, criar um ambiente favorável para essas unidades de processamentos de dados no Brasil, com desonerações.”
Já o líder do partido Solidariedade, deputado Fernando Francischini (PR), elogiou o texto de Molon, mas defendeu a obrigatoriedade de os provedores de serviços na internet guardarem os registros de acessos a aplicativos.