“Empresa conseguiu sustentar sua produção de petróleo e gás natural em função do aumento das vendas para o exterior”, afirmam pesquisadores do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), em artigo publicado na revista Carta Capital.
Por Rodrigo Leão, coordenador técnico do Ineep e pesquisador-visitante da Universidade Federal da Bahia, e Rafael Costa, pesquisador do Ineep e pesquisador visitante do NEC/UFBA
Em um ano marcado pela queda da demanda de combustíveis por conta da pandemia da Covid-19, a Petrobras conseguiu elevar tanto sua produção de petróleo e gás natural quanto de derivados.
Por um lado, a companhia se aproveitou do excelente desempenho do pré-sal e, por outro, conseguiu contornar a queda do consumo interno ampliando suas exportações de petróleo e derivados, principalmente de óleo combustível.
O aumento da exportação de derivados associado à maior demanda por nafta para atender a indústria petroquímica e ao aumento do fator de utilização do parque de refino da Petrobras fez com que a estatal elevasse a sua produção de combustíveis. Esse indicadores sugerem que o refino auxiliou a companhia no ano de 2020. É isso que mostra o Relatório de Produção e Vendas divulgado pela companhia no dia 02/02/2021.
A produção de petróleo e gás natural da Petrobras aumentou de 2,77 milhões de barris por dia (bpd), em 2019, para 2,84 milhões de bpd, em 2020, uma elevação de 2,4%. Isso se deveu ao pré-sal, onde a produção teve um aumento de 21,1%, saindo de 1,28 milhões de bpd para 1,55 milhões de bpd. Esse crescimento só não foi maior em razão da queda da produção do pós-sal em águas profundas e ultraprofundas. Na comparação anual, a extração de petróleo e gás natural dessa região caiu 120 mil bpd.
Esse desempenho é reflexo da atual estratégia da Petrobras para o segmento de exploração e produção (E&P) que tem focado quase exclusivamente no desenvolvimento da produção do pré-sal e abandonado as demais áreas de produção inclusive às de águas de profunda.
Os campos que puxaram a elevação da produção foram os de Búzios e Tupi. Em 2020, eles foram responsáveis por mais da metade da produção do pré-sal. Já a Bacia de Campos, que era a principal fronteira exploratória até a ascensão do pré-sal, tem tido uma queda vertiginosa nos últimos dois anos. Entre dezembro de 2018 e de 2020, a produção dessa região caiu 33,2% saindo de 1,3 milhão de bpd para 909 mil bpd.
A Petrobras conseguiu sustentar sua produção de petróleo e gás natural em função do aumento das vendas para o exterior. Isso fica evidente pelo aumento das exportações de petróleo e de óleo combustível, que subiram 238 mil bpd entre 2019 e 2020, mais do que compensando a queda das vendas de derivados no mercado interno (75 mil bpd).
Segundo a própria companhia, “o motivo desta grande variação foi a maior produção de óleo combustível de baixo teor de enxofre, aproveitando as oportunidades de mercado devido à regulamentação da Organização Marítima Internacional (IMO) de 2020”, que reduziu os limites de emissão de enxofre para combustíveis marítimos. Devido às características do petróleo do pré-sal, o óleo combustível marítimo fabricado nas refinarias da Petrobras se adequa às novas exigências de IMO e, por isso, conseguiu uma maior penetração no mercado internacional.
A exportação de óleo combustível, associada ao ganho de market share da estatal, permitiu à Petrobras elevar a fabricação de derivados e, consequentemente, aumentar o fator de utilização (FUT) das suas refinarias, apesar da pandemia da Covid-19.
O FUT saltou de 77% em 2019 para 79% em 2020, chegando a 83% no último trimestre de 2020. Isso deixa claro que a Petrobras conseguiu aumentar não apenas sua produção de petróleo e gás natural, mas também de derivados como forma de enfrentar a crise da pandemia, aproveitando-se de oportunidades existentes tanto no mercado interno, como externo.
Em 2020, a produção de derivados de petróleo da Petrobras cresceu 2,8% em relação a 2019, saltando de 1,78 milhão de bpd para 1,82 milhão de bpd. Os dois derivados que mais contribuíram foram o óleo combustível e o nafta, cuja fabricação cresceu, respectivamente, 88 mil bpd e 28 mpd. Como dito, o crescimento do óleo combustível respondeu às oportunidades no mercado internacional. A ampliação da produção de nafta foi explicada pelo aumento da demanda interno do produto, principalmente no início do ano quando houve uma forte queda do preço do petróleo.
Esse aumento do consumo respondeu, por um lado, ao crescimento das compras da Braskem nos primeiros meses do ano e, por outro, pelo maior uso do nafta ao invés do gás natural em alguns polos petroquímicos, como o polo Triunfo no Rio Grande do Sul. “No ano passado, a nafta chegou a custar, em média, US$ 500 por tonelada – em março, o preço estava na faixa de US$ 120, com tendência de queda. (…) a rentabilidade das plantas à base nafta deverá se manter enquanto o preço do petróleo permanecer baixo, o que deve durar, pelo menos, até 2021”, informou uma matéria do Jornal do Comércio de março de 2020.
Esses dados mostram, em primeiro lugar, que a Petrobras conseguiu resistir à crise da Covid-19 se aproveitando dos investimentos passados no pré-sal e pela existência de um amplo parque do refino. Esse conjunto de ativos permitiu à estatal adotar uma estratégia diversificada de enfretamento da crise, combinando aumento da produção a custos relativamente baixos com a venda de diferentes tipos de derivados para atender os mercados interno e externo.
Isso reforça a importância estratégica do setor de refino da Petrobras e coloca em dúvidas a atual política de desinvestimento da atual gestão para os próximos anos. De acordo com o Plano de Negócios e Gestão 2021-2025, a companhia pretende vender 9 das suas 14 refinarias nos próximos anos, incluindo a sua unidade de industrialização de xisto (SIX) e a refinaria Clara Camarão, o que deve expor a maior volatilidade em relação aos preços internacionais, além de limitar o aproveitamento de uma empresa integrada de petróleo. E também demonstra que os esforços anteriores na descoberta de petróleo foram centrais para garantir a sustentabilidade da estatal no longo prazo