Ineep: Após Lava Jato, engenharia brasileira foca na manutenção de plataformas e refinarias

[Do site do Ineep]

No último dia 7 de outubro, o Tribunal de Contas da União (TCU) declarou a inidoneidade da Mendes Júnior Trading e Engenharia para participar de licitações públicas por fraudar concorrências promovidas pela Petrobras para aquisição de bens e serviços à Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar).

A companhia já havia sofrido punições da côrte federal em 2016 e 2018 por compor um cartel junto a outras 22 empreiteiras investigadas pela Polícia Federal no âmbito da Operação Lava Jato: Alusa, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, Carioca Engenharia, Construcap, Egesa, Engevix, Fidens, Galvão Engenharia, GDK, IESA, Jaraguá Equipamentos, MPE, OAS, Odebrecht, Promon, Queiroz Galvão, Setal, Skanska, ‘TECHINT, Tomé Engenharia, UTC.

Já no final de dezembro de 2014, diante das denúncias da Lava Jato, a Petrobras bloqueou cautelarmente essas empresas, impedindo-as de fechar novos contratos com a companhia. A elas se juntaram, em março de 2015, a Schahin Engenharia e a TKK Engenharia.

Cerca de seis anos depois, seguem na chamada Blacklist da Petrobras a Odebrecht Ambiental, do grupo Odebrecht, além da Construtora Queiroz Galvão, MPE Montagens e Projetos Especiais, Tomé Engenharia, Galvão Engenharia e Schahin Engenharia (atual Base Engenharia e Serviços de Petróleo e Gás).

Dentre as empreiteiras que sofreram bloqueio cautelar da petroleira brasileira, ao menos onze estão ou passaram por processo de recuperação judicial: Alusa, Ecovix-Engevix, Galvão Engenharia, Jaraguá Equipamentos, Mendes Junior, OAS, Odebrecht, Schahin, Tomé Engenharia e UTC Engenharia.

Segundo matéria publicada pelo Valor Econômico em julho de 2019, as receitas das maiores construtoras brasileiras, que estiveram no coração da Operação Lava-Jato, caíram de R$ 71 bilhões para R$ 10,6 bilhões entre 2015 e 2018.

Diante das dificuldades financeiras vividas pelas empreiteiras locais, diversas obras de plataformas de produção da Petrobras acabaram sendo transferidas para o exterior, sobretudo à China.

Quando estourou a Lava Jato, estavam em execução, no Brasil, contratos de fabricação de módulos e/ou integração de FPSOs fechados pela Petrobras com os consórcios Iesa Óleo e Gás/ Andrade Gutierrez, Tomé Ferrostaal (Grupo Tomé + Ferrostaal), QGI (Queiroz Galvão e Iesa), MGT (DM Construtora, Technip/ Techint e TKK Engenharia) e Integra (OSX/ Mendes Júnior).

Para fabricação e conversão de cascos, a petroleira havia contratado, respectivamente, a Engevix (Ecovix) e o grupo Enseada Indústria Naval (Odebrecht, OAS e UTC Engenharia), que entrou com pedido de recuperação extrajudicial em 2017.

Na sequência, a flexibilização das exigências de conteúdo local no setor de óleo e gás a partir de 2017 assegurou, na prática, que as contratações seguintes de unidades de produção offshore fossem feitas fora do país. Hoje, os sete novos FPSOs encomendados pela Petrobras estão em construção na Ásia.

Outro reflexo dos bloqueios cautelares se deu no segmento de manutenção de plataformas marítimas. Até 2015, esse mercado era dominado pela UTC e pela Ocyan (então Odebrecht Óleo e Gás – OOG), que detinham os maiores contratos de construção e montagem (C&M) offshore da Petrobras, além da Skanska, Iesa e MPE. Nos anos seguintes, ganharam espaço empresas como a C.S.E. Engenharia, adquirida pela norueguesa Aker Solutions, a portuguesa Mota Engil Engenharia, a espanhola Cobra, a OEngenharia (antiga Orteng, adquirida pelo grupo francês Vinci Energies), além de brasileiras como a Imetame Metalmecânica, Estrutural Engenharia, Elos Engenharia, G&E Manutenção e Serviços, Elfe O&G e Mazza Engenharia.

No mid/downstream, um caso emblemático foi o da licitação da Unidade de Processamento de Gás Natural (UPGN) do Comperj, em Itaboraí (RJ), em 2017, para a qual a Petrobras contratou apenas empresas estrangeiras. Para justificar a exclusão de empreiteiras nacionais, a petroleira argumentou, na época, que 20 das maiores empresas de engenharia do país estavam impedidas de participar da licitação por envolvimento na Lava Jato. A concorrência foi vencida pelo grupo chinês Shandong Kerui, em consórcio com a brasileira Método Potencial, já que os contratos com estrangeiros exigem um parceiro nacional.

Quem está dando a volta por cima é a UTC Engenharia, agora sob o nome de Heftos Óleo e Gás. Cerca de dois anos e meio após o fim de seu bloqueio cautelar, no início de 2018, a empresa fechou, nos últimos três meses, dois contratos com a Petrobras – um de R$ 60 milhões para modernização de uma unidade de recuperação de enxofre da Refinaria Gabriel Passos (Regap) e outro de R$ 297 milhões para serviços de manutenção de plataformas na bacia de Campos – e um com a Trident Energy para manutenção das plataformas dos polos de Pampo e Enchova.

A empresa foi uma das 14 que apresentaram propostas comerciais em uma licitação promovida pela Petrobras para contratar serviços de construção civil e montagem eletromecânica de uma unidade de diesel da Reduc (RJ). Entre as demais participantes estão a Empresa Construtora Brasil, que ofertou o menor preço no certame, Engecampo, OEngenharia, Toyo Setal, Método Potencial e Norteng Engenharia.

E&P

Apenas três das 23 empreiteiras bloqueadas atuam na área de exploração e produção (E&P). 

Por meio da Ocyan, o grupo Odebrecht opera uma frota de cinco sondas de perfuração e dois FPSOs, em parceria com a Altera (ex-Teekay Offshore). Até 2019, era parte de uma joint venture com a TechnipFMC que operava embarcações de lançamento de dutos submarinos (PLSVs).

Pela Enauta (antiga QGEP), a Queiroz Galvão opera ou tem participações em ativos exploratórios e de produção, como os campos de Atlanta e Manati, enquanto, pela Constellation (ex-QGOG), opera oito sondas offshore e nove terrestres.

Ambas estão, hoje, em uma situação relativamente confortável, com boa parte de sua frota contratada pela Petrobras. A longa duração dos contratos de sondas e FPSOs deu fôlego às empresas para atravessar o período de bloqueio cautelar e as crises do barril de 2014-2016 e deste ano.

Já a Schahin (atual Base) teve sua falência decretada em 2018 após o não cumprimento das metas de seu plano de recuperação judicial impetrado dois anos antes. Em 2015, a Petrobras rescindiu cinco contratos de sondas de perfuração fretadas pela companhia, o que praticamente inviabilizou sua recuperação.

O Brasil pecou ao optar por punir as empresas investigadas pela Lava Jato em vez dos indivíduos diretamente envolvidos nos crimes, quanto mais em um setor tão estratégico como o da engenharia, pelo qual o Brasil vinha ganhando projeção internacional na América Latina e África.

Agora, aquelas que sobreviveram ao bloqueio cautelar tentam se restabelecer no setor de óleo e gás, mas em um cenário de maior competição, com novos players internacionais. Sem uma política de conteúdo local robusta na construção naval e offshore, devem se concentrar na manutenção de plataformas e em obras em refinarias e ativos de logística e gás natural, à exceção da Odebrecht e Queiroz Galvão, que seguem firmes na operação de sondas e plataformas.