CUT
Não faltou nem o frio e, como a três décadas atrás, ele não fez diferença nem diminuiu a disposição da militância. Sob um frio que lembrou a gelada noite de 28 agosto de 1983, mais de dois mil convidados ignoraram os oito graus (sensação térmica de cinco) e celebraram os 30 anos da Central Única dos Trabalhadores. O lugar também foi o mesmo: o Pavilhão Vera Cruz, em São Bernardo do Campo, onde a CUT foi fundada, em plena ditadura militar e no berço do chamado Novo Sindicalismo.
Na plateia, dirigentes, ministros, políticos e militantes quase que uniformizados de vermelho. Emocionados. No palco, atuais e ex-dirigentes nacionais da Central, convidados e homenageados discursaram sobre a importância da CUT para a classe trabalhadora e a construção de um Brasil mais democrático, igual e justo. Foram mais de duas horas de palavras que destacaram a força e as conquistas da maior central sindical da América Latina A solenidade foi encerrada com o um longo e esperado discurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
“A CUT não só ajudou a construir como continua a ser uma guardiã da democracia no Brasil”, (…) “A contribuição da CUT para o desenvolvimento e redução das desigualdades é inestimável”, disse Lula durante seu discurso que durou 51 minutos e 52 segundos e colocou fim ao ato político. Apresentação do cantor Arlindo Cruz fechou o evento, que prosseguiu durante toda esta quinta-feira (29) com a jornada cultural, que foi realizada no mesmo espaço Vera Cruz.
Os ex-presidentes da CUT Jair Meneguelli – que foi homenageado -, Vicentinho, João Felício, Artur Henrique e também o secretário-geral nacional, Sérgio Nobre e a de Comunicação Rosane Bertotti discursaram antes do atual presidente da Central, Vagner Freitas. Outra homenageada da noite foi Clara Ant, diretora do Instituto Lula e uma das fundadoras da CUT, que recebeu a homenagem das mãos do diretor da Executiva Nacional Julio Turra. Rui Falcão, presidente nacional do PT, também discursou em homenagem à Central.
TRANSFORMADORA– O presidente nacional da CUT, Vagner Freitas, em 20 minutos de fala, afirmou que “a CUT é grande, importante e diferente porque o grande construtor da CUT, o dono da CUT, a razão da existência da CUT é o trabalhador e a trabalhadora do campo, da cidade, do setor público, do setor privado”.
“A classe trabalhadora brasileira é a transformação da sociedade. Somos uma central de massa, de classe, transformadora da realidade. Recentemente para nosso orgulho, a OIT reconheceu a CUT como a uma das poucas entidades que têm a capacidade de mudar a realidade da classe trabalhadora”, lembrou. O presidente também destacou a pauta da classe trabalhadora, criticou o “famigerado” PL 4330, exaltou a importância dos dez anos do projeto progressista no governo federal e convocou a militância a se mobilizar: “Dia 30 estaremos nas ruas e faremos manifestação para que tenhamos a pauta dos trabalhadores respeitada”, disse se referindo ao Dia Nacional de Paralisação e Mobilização, amanhã (30), em todo o Brasil pela pauta da classe trabalhadora.
EX-PRESIDENTES– O prefeito de São Bernardo, Luiz Marinho, lembrou que na fundação da CUT, em 1983, delegados do Norte e Nordeste do País sofreram muito porque estava um frio de 3º. Tão gelado que foi necessário “muito quentão, fogueira e ajuda das pessoas com doação de cobertores e alimentos”. Marinho lembrou que foi delegado em 1983. “São 30 anos vitoriosos. Longa vida à CUT, longa vida aos trabalhadores”, disse o também ex-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e ex-ministro no governo Lula, que fechou sua fala rapidamente porque “todos, seguramente, querem ouvir Lula”.
O deputado federal Vicentinho afirmou em seu discurso que “a fundação da CUT foi uma honra e muito marcante”. “Aqui estamos 30 anos depois, comemorando este grande momento que é o momento da classe trabalhadora. Eu queria homenagear aqueles que perderam a vida pela nossa causa”, disse ao lembrar Margarida Alves e Chico Mendes.
O secretário de Relações Internacionais e ex-presidente da Central, João Felício, destacou que, nesses 30 anos, o mundo, o Brasil e a CUT mudaram muito. “O Brasil mudou e está muito melhor que à época em que fundamos a Central. A Central mudou, mas tem uma coisa que nos unifica: é a nossa vontade de mudar o Brasil, o mundo, a América Latina para uma sociedade mais justa”. “Tenho certeza absoluta que essa unidade é que causa a profunda admiração que a CUT tem do movimento sindical internacional”, afirmou Felício.
O Secretário-adjunto de Relações Internacionais Artur Henrique disse que seria breve porque “todos queriam ouvir Lula”. O também ex-presidente da Central falou do orgulho de ser cutista e de pertencer a uma central sindical “que teve coragem de nascer em plena ditadura militar para lutar por democracia e liberdade, liberdade inclusive de expressão”.
“Eu tenho orgulho de ter sido presidente da CUT num momento em que tivemos a grande satisfação de sermos recebidos em Brasília não pela polícia militar e cavalaria, mas sim por um presidente eleito pela maioria dos brasileiros para garantir uma política de valorização e aumento do salário mínimo. Nós temos orgulho daquele período e vamos continuar batalhando, trabalhando organizando a classe trabalhadora e sabendo que ainda falta muito para fazer, mas falta menos”, disse Artur Henrique.
Homenageado da noite, Jair Meneguelli (recebeu diploma de presidente de honra da CUT) contou passagens da sua trajetória na Central. Lembrou que, na fundação, temeram que não fosse ter muita gente. “Mas foram chegando ônibus de todo o Brasil e não tinha nem lugar nem alimento para todo mundo”. “La fora (do Vera Cruz) estava frio, mas aqui dentro estava quente, com muito calor humano e coragem dos trabalhadores da cidade e do campo”, recordou. Em 1994, quando eu deixei a CUT, naquele dia, convidei ao palco as minhas três filhas. E me lembro de ter dito que estava me despedindo da minha quarta filha, pois é assim que considerei e considero a CUT até hoje.”
JORNADA CULTURAL– “A ousadia e o sonho de construir uma experiência de comunicação que completou sete anos que é a Rede Brasil Atual, a ousadia e o sonho de construir uma bela experiência que é a TVT, que completou três anos; a ousadia e o sonho de construir a TV CUT. É com essa ousadia e com esse sonho e com essa capacidade de luta e de mobilização que convidamos a todos para participar da jornada cultural e viver a historia da CUT”, disse a secretária de comunicação da CUT nacional, Rosane Bertotti.
O presidente da Confederação Sindical dos Trabalhadores e Trabalhadoras das Américas (CSA), Victor Báez, também subiu ao placo e saudou os trabalhadores e trabalhadoras da CUT em nome de todos os sindicalistas das Américas e homenageou o ex-presidente Lula. “É um orgulho ter o Lula, um presidente operário que é referência para a esquerda mundial”.
LULA- Em quase uma hora de fala, Lula lembrou feitas a partir do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema (hoje do ABC), presidido por ele, nos anos 1970. Fez um passeio destacando fatos relevantes da história do Brasil nos últimos 30 anos entrelaçados a ação da CUT. Falou do passado e do presente. De sindicalismo e política, daqui e de fora.
O ex-presidente também citou a colaboração da CUT para o desenvolvimento do Brasil, no fortalecimento dos sindicatos e em momentos históricos como “Diretas Já”. Lula também exaltou a necessidade da luta continuar. “Está longe de acabar a missão para qual a CUT foi fundada. O que a gente queria lá atrás, é exatamente o que queremos hoje. Na medida em que os paradigmas são quebrados, as pessoas ficam mais exigentes e querem mais”.
Sobre a sua sucessora Dilma Rousseff, Lula disse estar confiante na capacidade de a presidenta dar respostas à população que se mobilizou em junho em torno de várias reivindicações. “Não tem que ficar preocupado quando as pessoas querem mais”, disse Lula para cerca de duas mil pessoas, entre as quais dirigentes políticos e sindicais, muitos deles de países da América latina, Europa e África. “Está todo mundo ficando mais exigente”, afirmou o ex-presidente.
Lula também falou da importância da reforma política e disse que “não existe nenhuma possibilidade de se mudar o País se não houve uma reforma política”. “Com o financiamento público, fica mais barato fazer campanha neste País. As campanhas estão cada vez mais caras e vai ficar cada vez mais difícil para um trabalhador se eleger”, defendeu o ex-presidente.
Para Lula, o momento mais difícil que viveu como presidente foi quando, em 2005, a CUT, o MST e outros movimentos sociais se mobilizaram para defendê-lo diante das pressões criadas com as denúncias do chamado Mensalão. “Foi quando o Feijóo (José Lopez Feijoó, ex-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e da CUT SP e ex-vice da CUT nacional) disse ‘Mexeu com o Lula, mexeu com a gente’. Isso colocou muita gente de orelha em pé”, falou Lula numa referência à tentativa de um impeachment ensaiado pela oposição ao seu governo
“Penso que a CUT adquiriu não apenas a capacidade de ser contestadora, mas também a capacidade de ao mesmo tempo ajudar a criar, a propor, e assim vai fazendo com que as coisas aconteçam neste país”, disse o ex-presidente. “Eu tenho o prazer de ter visto a CUT viver o seu momento mais difícil, no nosso governo, de contestar, apoiar e negociar sem abdicar de reivindicar. Eu talvez não tivesse sido um presidente tão bom, como vocês dizem, se não fosse a CUT contestando o que fazíamos no nosso governo”, disse.