Greve - 2001

A GREVE DE OUTUBRO DE 2001

Apesar dos recordes de lucro e dos excelentes resultados alcançados pelos petroleiros em 2001, a direção da Petrobrás não manifesta a menor disposição política em negociar a pauta de reivindicação. Após 52 dias de enrolação, a empresa apresenta uma proposta que não atende sequer a um dos pleitos dos trabalhadores. A FUP indica greve de cinco dias, com controle da produção.

Entre os dias 24 e 28 de outubro de 2001, os petroleiros realizaram a greve mais importante da categoria, desde o histórico movimento de maio de 1995. Os trabalhadores reduziram a patamares mínimos a produção de petróleo e gás na Bacia de Campos e pararam refinarias, terminais, unidades administrativas e demais áreas de E&P. Os petroleiros provaram que é possível realizar uma greve estratégica, com controle da produção e sem afetar a população.

A direção da Petrobrás, que desde 1995 de tudo fez para quebrar o espírito de luta da categoria, foi obrigada a admitir que os trabalhadores tinham o controle da produção e pela primeira vez aceitou negociar em greve. Mesmo após ter instaurado dissídio coletivo no TST. O Tribunal, historicamente um algoz dos petroleiros, foi mais uma vez derrotado.

Após cinco dias de greve, a categoria arrancou da Petrobrás uma proposta com avanços importantes, principalmente nas questões de segurança, além do compromisso da empresa de não demitir, punir ou descontar os dias parados. O acordo assinado garantiu o direito de recusa, o fim das discriminações entre novos e antigos no desconto da AMS, a participação de um representante da CIPA nas comissões de investigação de acidentes, cláusulas que asseguraram a discussão com os trabalhadores sobre recomposição do efetivo e revisão da política de terceirização, além de reajuste salarial acima da inflação.

Controle da produção

Garantir o controle da produção foi o grande desafio da greve. Pela primeira vez na história do movimento sindical petroleiro, o principal campo produtor de petróleo do país esteve desde o primeiro minuto do movimento sob controle total dos trabalhadores. Todas as plataformas da Bacia de Campos pararam. A produção de gás natural foi mantida em níveis mínimos, o suficiente para garantir o atendimento das necessidades imediatas da população. Segundo dados da Petrobrás, nos cinco dias de greve, a empresa deixou de produzir 4,5 milhões de barris de óleo.

Os petroleiros também controlaram a produção na maior unidade de refino do país e em um dos mais estratégicos terminais de distribuição da Petrobrás. Na Refinaria de Paulínia (Replan), dez dirigentes sindicais, dois grupos de turno e parte do pessoal administrativo permaneceram dentro da refinaria desde a manhã do dia 23, controlando a produção. O controle operacional do Terminal de Alemoa, na Baixada Santista, também esteve o tempo todo nas mãos dos trabalhadores durante os cinco dias de greve. O bombeio de produtos, que chegou a ser interrompido no início do movimento, foi criteriosamente controlado pelos petroleiros.A

A Federação Única dos Petroleiros (FUP) foi criada em 1994, fruto da evolução histórica do movimento sindical petroleiro no Brasil, desde a criação da Petrobrás, em 1953. É uma entidade autônoma, independente do Estado, dos patrões e dos partidos políticos e com forte inserção em suas bases.

Filiada à Central Única dos Trabalhadores, a FUP tem 13 sindicatos filiados em todas as regiões do país e representa atualmente mais de 100 mil trabalhadores do setor petróleo, entre ativos, aposentados e pensionistas do Sistema Petrobrás, além de petroleiros de empresas privadas.

Ao longo dessas duas décadas de existência, a Federação tem se consolidado na unificação e representatividade desses trabalhadores, cumprindo o objetivo de promover a organização nacional da categoria, expressando suas reivindicações e lutas, tanto do ponto de vista econômico, quanto social, cultural e político.

A FUP é nacionalmente reconhecida por sua atuação política e sindical no Brasil, sendo respeitada também fora do país pelo protagonismo na defesa da soberania energética e pela resistência aos projetos neoliberais, que resultaram em lutas históricas da categoria petroleira contra a privatização do Sistema Petrobrás e pelo seu fortalecimento como empresa pública e estatal.

Os pioneiros da Bahia

A primeira organização sindical dos petroleiros surgiu na Bahia, estado onde foi descoberta na década de 30 a primeira reserva de petróleo do Brasil, localizada no município de Lobato. Logo após a criação da Petrobrás, os petroleiros baianos fundaram a Associação Profissional de Trabalhadores na Indústria de Petróleo. Em 1957, foi criado na Bahia o primeiro sindicato da categoria: o Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Extração de Petróleo (Stiep). Em 1959, os trabalhadores do refino também fundaram o seu sindicato.

Na década de 60, surgiram sindicatos de trabalhadores da extração e do refino em vários outros estados do país. Pouco mais à frente, em1977, é criado o Departamento Nacional dos Petroleiros e Petroquímicos (DNPP), braço da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Indústria (CNTI), entidade que era controlada pelo governo militar. Tanto os sindicatos, quanto o DNPP, não representavam os interesses dos trabalhadores. As pautas de reivindicações eram decididas a portas fechadas e acordadas com a Petrobrás.

Mas, apesar da atuação pelega dos sindicatos da época, a primeira greve de petroleiros que temos conhecimento ocorreu justamente na década de 60, na Bahia, quando os trabalhadores da refinaria de Mataripe cruzaram os braços por 15 dias, reivindicando equiparação salarial com os trabalhadores da extração.

Petroleiros rompem com o velho sindicalismo

A organização sindical dos petroleiros, assim como ocorreu nas demais categorias, amargou durante anos o peleguismo herdado do período Getúlio Vargas e que foi ainda mais intensificado nos anos de chumbo da ditadura. As intervenções do governo militar nos sindicatos petroleiros gerou uma casta de dirigentes sem qualquer compromisso com a luta classista ou com a democracia. Mas, pouco a pouco, os trabalhadores foram se organizando, pressionando as direções pelegas a abrirem brechas para a participação da base nos sindicatos. Nos anos 80, os movimentos de oposição se fortaleceram e progressivamente foram conquistando as direções. Mas todo esse processo de renovação política e democratização da organização sindical dos petroleiros demandou um longo caminho.

Em 1977, era criado o Departamento Nacional dos Petroleiros e Petroquímicos (DNPP), braço da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Indústria (CNTI), entidade oficial controlada pelo governo militar. O DNPP não promovia a organização nacional da categoria, nem tampouco discussão com os petroleiros de base, que sequer realizavam congressos ou plenárias. Mobilização então, nem pensar. As pautas de reivindicações para negociações com a Petrobrás eram todas tiradas em reuniões fechadas, sem consulta às bases e acordadas posteriormente com a empresa. As “lideranças” sindicais dos petroleiros eram escolhidas nos próprios quadros das direções dos sindicatos.

Em 1983, a conjuntura começa a mudar. Desafiando a Lei de Segurança Nacional, em plena ditadura do general João Batista Figueiredo, os petroleiros das refinarias de Paulínia (Campinas) e Mataripe (Bahia) realizam uma greve histórica, colocando em xeque a política econômica recessiva do governo e o sindicalismo remanescente da Era Vargas. A classe trabalhadora brasileira vive um dos mais fervilhantes períodos de sua história. Oposições sindicais de várias categorias se unem em torno da criação de uma Central Única dos Trabalhadores, para sepultar a velha e ultrapassada estrutura sindical atrelada ao Estado. Assim, nasce a CUT, em agosto de 1983, defendendo um novo sindicalismo. Um sindicalismo classista, de base, autônomo e com uma estrutura interna democrática.

Neste mesmo ano, é realizado o primeiro Congresso dos Trabalhadores Petroleiros e Petroquímicos, em Cubatão (SP), onde a categoria decide que os dirigentes do DNPP devem ser eleitos em congresso, com a participação de delegados de base. O que só aconteceu de fato em 1984. Paralelamente, os petroleiros vinham desenvolvendo nos sindicatos um trabalho de oposição política e filiação à recém-criada Central Única dos Trabalhadores.

Os sindicatos de petroleiros de Campinas, do Paraná e de Minas Gerais são os primeiros a se filiarem à Central, ajudando a organizar o Departamento Nacional dos Petroleiros da CUT (DNP-CUT), criado em 1987. A partir de então, os demais sindicatos são, um a um, filiados à Central. O que leva os antigos dirigentes a criarem a Federação Nacional dos Petroleiros (FENAPE), entidade sem apoio da base e sem qualquer ação sindical.

Fortalecido com a adesão de vários outros sindicatos de petroleiros, o DNP-CUT decide no congresso nacional da categoria, em 1988, a não reconhecer a FENAPE. Os trabalhadores organizam, então, um comando de ação para representa-los nacionalmente nas mobilizações e negociações. Apesar da FENAPE continuar existindo, quem negociava e liderava greves em nome da categoria era o Comando Nacional dos Petroleiros, oficializado em dezembro de 1991.

Faltava ainda, no entanto, uma entidade nacional capaz de realizar um trabalho permanente de unificação dos trabalhadores em todo o país. Além disso, a Petrobrás, nos momentos de impasse, recorria às negociações paralelas com as direções sindicais ligadas à FENAPE, fechando acordos regionais com essas entidades. Os petroleiros decidem, então, criar uma nova organização nacional cutista da categoria e forçar a extinção da Federação pelega.

Assim nasce, em junho de 1993, a Federação Única Cutista dos Petroleiros – FUCP, criada no II Congresso Nacional dos Trabalhadores do Sistema Petrobrás, realizado na cidade de Santos. Os 350 delegados de base presentes elegem a direção colegiada da Federação, formada por 11 petroleiros, tendo como coordenador Antônio Carlos Spis.

No ano seguinte, os trabalhadores ocupam a sede da FENAPE, em Brasília, consolidando a extinção da entidade. Em junho de 1994, o III Congresso Nacional dos Trabalhadores do Sistema Petrobrás homologa o estatuto da nova organização, que passa a chamar-se Federação Única dos Petroleiros (FUP). Mas, somente em 1996, a Petrobrás reconhece a Federação no Acordo Coletivo de Trabalho, como representante legal dos sindicatos de petroleiros. A categoria, finalmente, é representada por uma única entidade nacional, uma instituição sindical cutista e combativa que passa a organizar os trabalhadores de toda a indústria brasileira de petróleo.