[Por Leonardo Fernandes e José Eduardo Bernardes, do jornal Brasil de Fato]
José Sérgio Gabrielli, 68 anos, foi o presidente mais longevo da Petrobras, entre 2005 e 2012, durante os governos de Lula e Dilma. Na última segunda-feira (9), o economista baiano visitou a vigília realizada por movimentos sociais no acampamento Lula Livre, na cidade de Curitiba (PR) em defesa da liberdade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Lula está preso na sede da Superintendência da Polícia Federal na capital paranaense desde o último sábado (7), quando decidiu se apresentar às autoridades. A perseguição política contra o ex-mandatário, o golpe de Estado em 2016 e os efeitos da atual situação política para soberania do país são os temas abordados por Gabrielli em entrevista exclusiva ao Brasil de Fato. Confira:
Gabrielli, como o senhor analisa esse momento político que estamos vivendo no Brasil?
Nós estamos vivendo um momento muito dramático do ponto de vista histórico, do ponto de vista da democracia. A prisão do presidente Lula é a prisão de um homem inocente, porque não tem crime confirmado nem tem provas do que ele efetivamente foi acusado. É um processo excepcional, em termos de velocidade, de prosseguimento e de respeito a direitos elementares dos cidadãos. E não atinge só a ele como indivíduo, mas atinge essencialmente os princípios da democracia e do direito que todos os brasileiros têm. Por exemplo, de ser considerado inocente até que se prove o contrário, o que não foi provado. O direito de ter um julgamento justo, o que não foi garantido, pois se atropelou os procedimentos, os prazos, se atropelou tudo. Então nós temos aí um problema de perseguição política clara contra o presidente Lula.
O que motiva essa perseguição, na sua opinião?
Porque ele representa uma ideia, ele representa uma concepção de transformação da sociedade, ele representa a possibilidade do povo brasileiro melhorar suas condições de vida, como foi demonstrado no tempo em que ele foi presidente e no tempo da presidenta Dilma. O golpe, portanto, contra a democracia, não é um golpe só contra o presidente Lula, mas é contra tudo aquilo que foi feito em benefício de muita gente no Brasil. E isso está sob ameaça nesse momento. Porque os golpistas que tiraram a presidenta Dilma estão encaminhando um desmantelamento de todas as políticas sociais, uma completa desestruturação da escola para o pobre, da saúde mais ampla, dos direitos das pessoas discriminadas, do direito dos trabalhadores melhorarem seus salários, das pessoas poderem consumir mais. Portanto, tudo aquilo que foi construído está sendo desmontado nesse momento. E entre outras coisas, nós estamos vivendo uma destruição do Estado, e uma destruição da soberania nacional.
De que modo o projeto golpista ameaça a soberania do país?
O que está acontecendo com o petróleo brasileiro, com a aceleração dos leilões do pré-sal, entregando as riquezas brasileiras para empresas internacionais, com a tentativa de privatização da Eletrobras, com a completa destruição da capacidade do estado brasileiro de influir, com a desmontagem do BNDES, com a desmontagem do Banco do Brasil, com a desmontagem da Caixa Econômica, nós estamos vendo ser ameaçada de forma dramática a soberania nacional. Porque isso coloca o país de uma forma muito fragilizada para enfrentar as ameaças internacionais que estão por trás de grande parte desses movimentos. Já existem evidências claras da intervenção do Sistema Nacional de Segurança americano na escuta da Petrobras, na escuta da presidenta Dilma, na colaboração entre os órgãos de inteligência, policiais e órgãos da justiça americana com os procuradores da Lava Jato, com seguimentos importantes da Polícia Federal.
Então nós temos aí uma intervenção direta dos órgãos internacionais sobre o Brasil, e estamos vendo, portanto, que lutar pela liberdade do ex-presidente Lula, lutar para que essa injustiça seja recomposta, é fundamental dentro de uma luta para garantir a soberania nacional e garantir a possibilidade do povo escolher nas eleições desse ano um candidato que possa não destruir o que foi feito, mas ao contrário, aumentar a inclusão social, aumentar e melhorar as condições de vida do nosso povo.
O senhor foi o mais longevo presidente da Petrobras. Como o senhor vê a gestão atual da empresa, sob esse ponto de vista da soberania do país?
A Petrobras está numa opção estratégica que eu acho equivocada, que busca fazer dela uma empresa pequena, focada apenas nas áreas que já estão com ela na produção do pré-sal brasileiro e realizando um processo de desmontagem da ideia de uma empresa integrada, que trabalharia não só com a produção de petróleo, mas na expansão do refino, na expansão dos biocombustíveis, nos fertilizantes, na energia elétrica, e portanto, uma empresa integrada de energia. E essa ideia está sendo desmontada e substituída por uma outra, focada no curto prazo, no pagamento de dividendos para os acionistas, abandonando completamente qualquer perspectiva de uma política de conteúdo nacional e que geraria milhares de empregos no Brasil, geraria capacidade de desenvolvimento tecnológico de uma cadeia produtiva de fornecedores da área de petróleo e gás e geraria a possibilidade de se acumular no Brasil grande parte dos ganhos da exploração dessa gigantesca riqueza nacional que é o pré-sal brasileiro. O que está sendo feito pelo atual governo é uma aceleração criminosa dos leilões e uma abertura muito intensa da possibilidade de que esses recursos, essa riqueza do subsolo, passe a ser explorada por empresas internacionais.
Como é possível reagir a essa ofensiva da direita golpista no Brasil?
Existem dois tipos de reação. Nos últimos tempos nós estamos vendo claramente claramente um aumento da indignação mobilizadora, da indignação das pessoas que estão indo pra rua demonstrar sua revolta contra essas medidas. Mas nós temos também uma resposta passiva da sociedade brasileira, que é a avaliação negativa do governo. A manifestação das pesquisas, que dão a preferência do ex-presidente Lula para as eleições mostra uma posição de grande maioria dos brasileiros contra o estado atual. E essa posição ainda não está nas ruas, ainda não está movimentando, mas está claramente manifestando sua opinião.
Eu acho que, nesse momento, nossa tarefa é intensificar a campanha pela libertação do presidente Lula, mostrando claramente e vinculando essa questão ao direito das pessoas terem uma escolha para o próximo presidente, vinculando a escolha desse próximo presidente à escolha das políticas que permitam enfrentar de fato os grandes problemas nacionais. Nós temos que diminuir a desigualdade, aumentar a capacidade do nosso povo suas condições de vida, nós temos que melhorar nossa educação, melhorar nossa saúde, viabilizar a agricultura familiar crescer, viabilizar a pequena e média empresa crescer, viabilizar, portanto, uma economia em que o povo tenha um protagonismo maior. Isso será possível se nós, não somente organizarmos essa resistência, essa raiva, mas também participarmos do processo eleitoral.
[Via Brasil de Fato]