Em entrevista à Rede Brasil Atual, o coordenador da FUP, José Maria Rangel, fala sobre os desafios que os petroleiros enfrentarão em 2020, como o avanço das privatizações no Sistema Petrobrás, entrega do petróleo brasileiro através do desmonte do regime de partilha do pré-sal e de novas tentativas de retirada de direitos da categoria.
Leia a íntegra:
O coordenador geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), José Maria Rangel, tem “as piores expectativas possíveis” sobre as políticas para a Petrobras em 2020. Ele destaca três temas para justificar sua avaliação. O primeiro é que a estatal tem plano de colocar cinco refinarias à venda: Landulpho Alves (RLAM), na Bahia; Abreu e Lima (RNEST), em Pernambuco; Alberto Pasqualini (Refap), no Rio Grande do Sul; Presidente Getúlio Vargas (Repar), no Paraná; e Gabriel Passos (Regap), em Minas Gerais. O segundo, uma possível mudança nas regras atualmente em vigor para os leilões do pré-sal. O terceiro, o acordo coletivo da categoria no ano que vem.
A empresa justifica a venda das refinarias sob o argumento de que quer se concentrar no Sudeste do país. Na semana passada, o presidente da companhia, Roberto Castello Branco, explicou a investidores estrangeiros, em Nova York, que “a Petrobras vai ser uma companhia bem focada em exploração e produção de petróleo e gás natural em águas profundas, geograficamente concentrada no Sudeste brasileiro, em três estados: Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Paulo”. Essa política não preocupa apenas a FUP e outras entidades que reúnem petroleiros, mas também governadores do Nordeste. Segundo o Dieese, com a venda dessas e outras refinarias serão demitidos 4.895 empregados. Mesmo que esses trabalhadores sejam recontratados, antes disso ficarão sem emprego.
Os campos do pré-sal também são tema de preocupação, diz Zé Maria Rangel. Não só por novos leilões, mas porque um novo projeto do senador José Serra (PSDB-SP) revoga o direito de preferência para a Petrobras nas licitações no regime de partilha de produção.
A avaliação do coordenador da FUP é a de que o fracasso (para o governo) do aguardado “megaleilão” realizado em novembro vai provocar um movimento de interessados na privatização e internacionalização dos ativos. “Acho, opinião minha, que eles não vão mais leiloar no sistema de partilha atual. Acredito que vão fazer um esforço para mudar a lei, aproveitando o projeto de Serra”, diz. “É uma avaliação que faço baseado no último leilão, que foi um fiasco.”
No leilão de novembro, a importante área de Búzios teve oferta única, do consórcio formado por Petrobras (90%) e as chinesas CNOOC Petroleum (5%) e CNODC Brasil (5%). O consórcio vai pagar R$ 68,194 bilhões. A área de Itapu, por R$ 1,766 bilhão, também foi arrematada pela estatal brasileira. No leilão, o governo arrecadou aproximadamente dois terços (R$ 70 bilhões) do que esperava (R$ 106,5 bilhões).
“O leilão foi positivo para a FUP, mas, para o modelo de pensamento entreguista que tem o governo, foi um desastre. Para a Petrobras foi um ótimo negócio. Mas a Petrobras só entrou e bancou porque senão o fracasso seria maior e o governo precisava de dinheiro para cobrir suas contas. Do contrário, a Petrobras também não entrava”, avalia Zé Maria.
Atualmente, pela lei de partilha, para vender campos de pré-sal a estatal tem preferência de comprar os blocos. O Conselho Nacional de Política Energética e a Agência Nacional do Petróleo (ANP) definem os blocos a serem leiloados e oferecem à Petrobras, que tem 30 dias para manifestar em quais tem interesse. Naqueles pelos quais manifestar interesse, ela é obrigatoriamente operadora e tem 30%. “Nos blocos em que não manifestar interesse, é a regra do leilão, quem pagar leva. Isso tem sido motivo de polêmica com as multinacionais. Na visão delas, todos têm que ter os mesmos direitos.”
É isso que o projeto de Serra introduz na legislação. O PL 3.178/2019 prevê acabar com a preferência da Petrobras. Projeto do mesmo senador tucano modificou a lei da partilha original, segundo a qual era obrigatório que a Petrobras tivesse 30% e fosse operadora única em todos os blocos. A lei flexibilizou para que a estatal, sendo ofertados os blocos, tenha preferência (e não obrigação) de escolher em quais pode ser operadora e ter os 30%. “Tem uma diferença entre ser obrigada e ter a opção”, diz o dirigente.
Em 2020 haverá ainda outro “embate duro”, mais para o meio do ano, aponta Zé Maria. Será a negociação de acordo coletivo da categoria. “Mas o início do ano vai ser muito puxado, por conta das refinarias.”
Rio Grande do Norte
A governadora Fátima Bezerra recebeu do Instituto de Estudos Estratégicos do Petróleo (Ineep) um estudo sobre os impactos da estratégia da Petrobras para a região Nordeste e o estado do Rio Grande do Norte. A FUP e O Sindipetro-RN apresentaram uma campanha para estimular a permanência da Petrobras no estado, intitulada “Pelo povo Potiguar a Petrobras fica no RN”.
Segundo o diretor-técnico do Ineep, William Nozaki, a estatal brasileira está abrindo mão de realizar cerca de R$ 4,2 bilhões em investimentos no estado. Essa política, diz, pode afetar mais de 100 mil postos de trabalho direta e indiretamente. “Em função dos desinvestimentos já realizados, há maior rotatividade no mercado de trabalho e os salários de quem atua em áreas de apoio e serviços da cadeia de petróleo têm sofrido redução, em média, de mais de 20%.”
A falta de investimentos provoca o declínio da produção. Consequentemente, a região e o estado arrecadam menos royalties do que poderiam. “O Rio Grande do Norte é autossuficiente em todos os derivados. Mas, com a abertura do mercado local, cria-se dependência de importações e o preço dos combustíveis aumenta”, avalia Nozaki.
[Via Rede Brasil Atual]