A cientista política Maria do Socorro Braga entende o voto útil como parte do jogo político democrático, que em cenários polarizados como no Brasil de hoje, é natural. “Sempre foi legítimo”, ela diz
[Da redação da CUT]
Na reta final da campanha para as eleições 2022, a disputa pelo chamado voto útil para presidente da República tem ganhando repercussão e atraído a curiosidade dos eleitores. É que este ano, o voto útil pode eleger o ex-presidente Lula (PT) já no primeiro turno, acabando com a tensão de uma das campanhas mais agressivas da história.
De acordo com todas as pesquisas eleitorais, o petista tem mais de 50% dos votos válidos. A eleição é definida em primeiro turno, quando um dos candidatos consegue 50% dos votos válidos mais um, totalizando a maioria dos votos. O cálculo é feito considerando apenas os votos válidos. Brancos e nulos não entram no cálculo, de acordo com critério da Justiça Eleitoral.
Esses dados levaram o PT e adeptos da eleição de Lula a fazer uma campanha pelo voto útil para, como se diz no meio político “liquidar a fatura no primeiro turno”.
O momento de mudar é agora!
.
O seu voto é muito mais que um voto útil, é uma rara oportunidade de livrar o Brasil dessa ideologia violenta, de sofrimento e intolerância criada pelo bolsonarismo.Juntos somos mais fortes! ✊🏾✊🏾
.#votoútil #eleicoes2022 #eleições #forabolsonaro pic.twitter.com/qe1QlSaWqO— Deyvid Bacelar (@deyvidbacelar) September 26, 2022
Mas o que significa mesmo o termo ‘voto útil’? ainda questionam alguns eleitores. O voto útil, segundo os especialistas, é uma tática utilizada para convencer o eleitor a votar em candidato que não é necessariamente a sua primeira opção, com o objetivo de terminar logo o processo eleitoral.
As opiniões sobre o voto útil se dividem na sociedade, principalmente, entre os candidatos sem chance de vencer o pelito, mas “faz parte do jogo político democrático”, explica a professora e cientista política da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar), Maria do Socorro Sousa Braga.
Segundo a professora, historicamente, o voto útil aparece quando há contextos políticos como o atual no Brasil, de polarização extrema da direita contra a esquerda. “Já existia a tendência à polarização e sempre se observou as duas candidaturas [Lula e Bolsonaro] se sobressaindo e as outras não chegando a dois dígitos”, ela diz.
Em uma disputa em que se tem duas forças, a tendência é o eleitor “não querer desperdiçar o voto e a tendência é migrar para uma das forças, em especial para quem temais chances de ocupar o cargo”, acrescenta a cientista política.
O voto útil é e sempre foi bastante legítimo. Não pode ser considerado uma atitude antidemocrática
Seguindo a mesma linha de raciocínio da professora, o secretário de Administração e Finanças da CUT, Ariovaldo de Camargo, afirma que o voto, acima de tudo, é uma escolha individual do eleitor.
“Em toda a democracia, o processo de escolha é individual. Cada um faz a sua opção. E faz parte do processo eleitoral democrático o candidato pedir votos para si”, diz o dirigente reforçando que a decisão final é sempre do eleitor.
Ari lembra que o fenômeno do voto útil tanto é natural que já aconteceu em outras eleições. “Isso já foi usado em 2018. A candidatura de Geraldo Alckmin derreteu na última semana antes do primeiro turno porque os votos foram transferidos para quem estava mais à frente, inclusive o próprio Ciro Gomes [candidato a presidente pelo PDT], que hoje ataca o voto útil, acabou sendo beneficiado e tendo mais votos do que sua candidatura comportava”.
Reclame aqui
Ainda que seja considerado por cientistas políticos como uma disputa justa e parte da democracia, o voto útil é criticado, em especial por candidatos que não conseguiram projeção nas pesquisas.
É o caso, nessas eleições, de Ciro e da senadora Simone Tebet (MDB-MS), que atacaram a mobilização feita por diversas personalidades em favor do voto útil em Lula.
“Normalmente, quem é contrário é justamente o candidato ou são os candidatos da ‘terceira via’ porque querem mostrar que têm fôlego para as próximas eleições. E na atual conjuntura, contrário também é o próprio Bolsonaro porque uma derrota no 1° turno será o pior dos pesadelos para ele”, diz Maria do Socorro Braga.
Em geral, os candidatos que figuram em posições em que a chance de crescimento é remota, têm por objetivo adquirir o que se chama de ‘capital político’. Desta maneira, mantendo-se em posições estáveis, ainda que abaixo de dois dígitos nas pesquisas de intenção de voto, conseguem se tornar mais conhecidos para eleições futuras.
“Essa é uma reclamação de candidaturas que não decolaram, não conseguiram se colocar alternativa, por isso, é natural que reclamem porque são seus votos que se deslocam para o primeiro colocado nas pesquisas, no caso, o ex-presidente Lula”, afirma Ariovaldo de Camargo.
Vitória no primeiro turno reforça a democracia
O dirigente explica ainda que uma votação expressiva no 1° turno, com mais de 50% dos votos, pode consolidar uma posição da sociedade sobre qual é a condução política desejada pela maioria.
“Determina que política a sociedade quer para o país. É uma demonstração de que a sociedade já fez a sua escolha, ainda que tenha se valido do voto útil. Mostra que a maioria dos eleitores quer um futuro diferente do que há hoje”, diz o dirigente
Decidir uma eleição em 1° turno é sinal sólido de qual é o desejo da maioria. É o movimento democrático mais intenso que pode acontecer nesse momento em que o país enfrenta ameaças sérias à democracia
Voto útil nas pesquisas
A última pesquisa Idec (antigo Ibope), divulgada nesta segunda-feira (26) mostra que 83% dos eleitores brasileiros afirmam estar decididos em quem irão votar nessas eleições. Os que afirmam que ainda podem mudar de voto são 17%.
Entre os eleitores de Lula, 90% dizem que a decisão de votar no petista é final. Nos que apontaram que vão votar em Bolsonaro, o percentual é 87%.
Os eleitores de Ciro Gomes e de Simone Tebet são os menos decididos sobre seu voto. Entre os eleitores do pedetista, 48% afirmam que ainda podem mudar de voto. O percentual de Tebet é de 45%.