Por Leandro Gaspar Scalabrin
O MAB, juntamente com a Federação Única dos Petroleiros – FUP, Federação Nacional dos Urbanitários – FNU, Sindieletro/MG, Sinergia SC, Federação Interestadual de Sindicados de Engenheiros – FISENGE, SENGE PR, STIU DF, Movimento dos Trabalhadores Sem Terra – MST, Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA e a Via Campesina integram a Plataforma Operária e Camponesa para a Energia e vêm lutando desde 2010 para que esta seja colocada efetivamente a serviço dos interesses do povo brasileiro, defendendo que o pré-sal seja utilizado na educação pública, lutando contra os leilões de petróleo e de hidrelétricas, exigindo a modificação do modelo de concessões públicas de petróleo e energia e propondo a realização de uma Conferência Nacional de Energia com participação popular da sociedade civil organizada.
A Plataforma, a CNBB e inúmeras outras organizações realizaram juntas, em 2013, o plebiscito popular em Minas Gerais que submeteu a soberania popular daquele estado várias questões relacionadas à redução da tarifa de energia, composição da conta de luz e a gestão da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), o qual obteve mais de 600 mil votos favoráveis a redução da tarifa de energia.
As militantes e os militantes do MAB, defensores de direitos humanos que são, têm mais uma tarefa histórica nos próximos dias deste 2014, que constitui um importante passo na afirmação dos DIREITOS DAS POPULAÇÕES ATINGIDAS POR BARRAGENS: o plebiscito popular por uma constituinte soberana e exclusiva para a reforma do sistema político.
Se o plebiscito contra a ALCA era pela soberania NACIONAL, o plebiscito pela reforma política é pela SOBERANIA POPULAR no controle social do Estado que hoje é manipulado e controlado por empresas privadas (poder econômico) e as burocracias partidárias, empresariais e de governos por elas eleitos. Seguidamente vemos a dança das cadeiras: presidentes e diretores de empresas passam a ocupar cargos chaves em governos e vice-versa, ocupantes de cargos no governo passam a trabalhar em cargos importantes em grandes empresas, nos quais deveriam ser impedidos de trabalhar por existir conflito entre interesses públicos e privados defendidos por estas pessoas.
Há tempos que o MAB vêm denunciando como as empresas, sejam elas grandes ou pequenas, nacionais ou multinacionais, têm se apropriado do Estado brasileiro. No caso do setor elétrico, denunciamos as privatizações; o financiamento de hidrelétricas com recursos do BNDES e do FGTS; o lucro das empresas assegurado pelos altos preços das tarifas de energia elétrica; os subsídios tarifários para grandes empresas; a criação e modificação de inúmeras leis em favor das empresas (marco regulatório); a criação de instituições de Estado como as agências (ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica) e empresas (EPE – Empresa de Pesquisa Energética), nas quais não há participação popular, mas há financiamento público, para que as mesmas atuem não no interesse público, mas no interesse privado de empresas do setor elétrico, como vimos recentemente na concessão de aumentos das tarifas pela ANEEL em índice superior ao solicitado pelas distribuidoras de energia elétrica.
A privatização do setor elétrico brasileiro, das telecomunicações e de empresas públicas como a Vale, nos anos 1990, representou a transferência de patrimônio público e trabalhadores altamente qualificados para o capital privado. A empresa Alstom foi denunciada por pagar propina de aproximadamente R$ 6 milhões para garantir a venda em 1999 de equipamentos para a Hidrelétrica de Itá, em Santa Catarina, a qual integrou o programa de privatização do governo do presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) em 1995. Com as privatizações, a produção e distribuição de energia transformaram-se em mercadorias controladas por grandes “consórcios” de empresas, criadas através da fusão de grandes bancos mundiais (dentre eles o Santander, Bradesco, Citigroup e Votorantim), com grandes empresas energéticas mundiais (como a Suez, AES, Duke, Endesa, General Eléctric, Iberdrola), grandes empresas mineradoras e metalúrgicas mundiais (tais como a Alcoa, BHP Billiton, Vale, Gerdau), empresas que produzem equipamentos (Siemens, Alstom), e grandes empreiteiras (entre elas a OAS, Camargo Correa, Odebrecht). No caso de Itá, em 1995 o consórcio era formado pela CSN (Companhia Siderúrgica Nacional), OPP Petroquímica e OPP Polietilenos (empresas do grupo Odebrecht) e a Companhia de Cimento Itambé, que se comprometeu a gastar R$ 658 milhões, obtidos em grande parte junto ao BNDES.
Temos afirmado a existência de uma enorme assimetria entre o marco regulatório, instituições de Estado e financiamento público para as empresas do setor elétrico, e o marco regulatório, instituições de Estado e financiamento público para os atingidos por barragens, trabalhadores e consumidores de energia. Como se instaura essa assimetria? Como as empresas conseguem isso tudo e os atingidos e trabalhadores sequer possuem um mísero decreto que estabeleça quais são os seus direitos? Isso acontece, em parte, porque o sistema político é, de certa forma, privatizado, porque o Congresso Nacional não representa os interesses dos atingidos e dos trabalhadores do setor elétrico e nem da população que paga uma das tarifas mais caras do mundo, mas sim representa os interesses das corporações que controlam o setor elétrico; não representa as mulheres, a juventude, os camponeses, e, representa em sua maioria absoluta os bancos, empresários e o agronegócio, porque as campanhas eleitorais são financiadas por empresas privadas.
Os maiores financiadores de campanhas eleitorais são justamente aqueles com interesse em licitações de serviços públicos, como a energia elétrica. As empreiteiras Odebrecht, OAS, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez – chamadas as “quatro irmãs” – são as maiores financiadoras das eleições. Alguma dúvida do porquê as empresas conquistam seus “direitos” sem precisar realizar qualquer tipo de mobilização, ocupação ou manifestação? São seus representantes parlamentares que elaboram as leis, criam as instituições políticas de Estado e indicam apadrinhados para ocupar cargos-chave em governos.
Por entender ser nossa tarefa lutar para reverter essa situação é que o MAB está engajado para que haja uma votação massiva no plebiscito popular que acontecerá de 01 a 07 de setembro de 2014, submetendo a soberania popular a seguinte questão: “Você é a favor de uma constituinte soberana e exclusiva para a reforma do sistema político?”.
O MAB é a favor da constituinte soberana e exclusiva para a reforma do sistema político, por defender que o Congresso Nacional e o Estado devem ser controlados pelo poder popular, o verdadeiro poder soberano. E para que esse possa se expressar somos contra o financiamento privado por empresas das campanhas eleitorais, uma das formas que estas possuem de se apropriar dos espaços públicos e de privatizarem a política.
Também somos a favor e estamos engajados juntos com a CNBB, OAB e a Coalizão Democrática para a Reforma Política e Eleições Limpas, na defesa do projeto de lei de iniciativa popular pela reforma do sistema político e orientando para que todos se engajem na coleta de assinaturas. A aprovação deste projeto de lei será outro importante passo rumo a soberania popular, pois o mesmo prevê que o povo decidirá soberanamente em plebiscito sobre a concessão de serviços públicos (água, energia, transporte público, saneamento), a alienação de empresas públicas, de potenciais de energia hidrelétrica e de jazidas de petróleo e outros minerais, o que significa afirmar nosso direito de RESISTIR e DIZER NÃO a todos projetos de política energética que não atendam aos interesses dos atingidos e de todo povo brasileiro.
Água e energia com soberania, distribuição da riqueza e controle popular!
Reforma política quando? Já!
* Leandro Gaspar Scalabrin é militante e membro da coordenação nacional do MAB.