Em crise, Unigel pede colo à Petrobrás

Depois de nadar de braçada durante a crise dos fertilizantes ocasionada pela guerra no Leste Europeu, a empresa que arrendou duas fábricas da Petrobrás pede ajuda para…. a própria Petrobrás.

Ex-operador da Fafen-BA, com passagem também pela Fafen-MS (UFN3), o diretor do Sindipetro Unificado de SP/MS/GO, Albérico Santos Queiroz Filho, atualmente lotado na Termelétrica de Três Lagoas, no Mato Grosso do Sul, relembra a trajetória de favorecimentos da Unigel e questiona a ação lobista da empresa para continuar garantindo lucros exorbitantes às custas do setor estatal.

“O que nos resta é cobrar o bom senso da Petrobrás e do governo federal em compreender que não há espaço para aventureiros quando o que está em pauta é a soberania alimentar de uma nação”, afirma Albérico.

Leia a íntegra do artigo, publicado originalmente pelo Sindipetro Unificado:

Acompanhando o desenrolar do setor de fertilizantes, deparamo-nos com o curioso caso da Unigel, arrendatária das fábricas de fertilizantes nitrogenados na Bahia e Sergipe. Não é novidade que o setor privado sobrevive sempre da mendicância do Estado; ora um financiamento maroto pelo BNDES, ora uma isenção fiscal facilitadíssima quando comparada com a dificuldade do pequeno negócio. Sabe qual a diferença? Uma máquina de lobby fantástica, que permite acessos que seriam impossíveis para a maioria dos mortais.

No caso da Unigel, tudo foi feito à luz do dia. O poder do lobby foi tão intenso que fez até com que o Senado Federal pressionasse o governo a atuar em favor da Unigel. Visto que entrou no mercado de fertilizantes em 2020 pela janela, não possui o tal “know-how” no setor e tampouco construiu alguma fábrica; pegou as unidades prontas e produzindo, apenas com manutenções de rotina a serem feitas. Parece, no entanto, que não fez o dever de casa, pois esqueceu da sazonalidade natural do setor de fertilizantes e o impacto do preço do seu principal insumo: o gás natural.

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Nadando de braçadas durante a crise dos fertilizantes, provocada pela guerra no Leste Europeu, teve lucro de brilhar os olhos. Lucro que foi construído vendendo fertilizantes para o mercado externo, aumentando ainda mais a escassez interna e a pressão inflacionária na produção de alimentos para consumo humano.

Podemos olhar para o papel que a Unigel desempenhou no setor como sendo um relacionamento abusivo, que serve exclusivamente aos interesses financeiros, mesmo que no pano de fundo estejam 33 milhões de brasileiros passando fome.

Entretanto, foi noticiado recentemente pela Petrobrás (em comunicação ao mercado financeiro) uma possível parceria com a Unigel na produção de fertilizantes e hidrogênio verde. Imagina você arrendar duas fábricas para uma empresa e depois propor uma parceria com essa mesma empresa? Pois é, a Petrobrás não pode ser muleta para suportar a ingerência da Unigel em conduzir um negócio altamente estratégico para o país.

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Investidores temem que ela entre em recuperação judicial, o que a Unigel nega. Apesar de negar, o ato de parar a produção em Sergipe e agora na Bahia e de passar o chapéu atrás parceiros para o negócio não dá nenhuma segurança para acreditarmos que está tudo bem por lá. Dentro desse contexto, uma parceria com a Petrobrás seria a tábua de salvação nesse navio afundando.

É fundamental observar que, quando mandamos fertilizantes para exportação, estamos esvaziando o abastecimento interno. Consequentemente, o preço sobe e nessa hora os grandes produtores de commodities agrícolas sentem o peso dos fertilizantes refletido no lucro. Enquanto isso, o pequeno agricultor, formado majoritariamente pela agricultura familiar, perde seu poder de compra e acaba optando por soluções menos eficientes e que reduzem a produtividade da lavoura.

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O resultado disso não é só o aumento inflacionário dos alimentos, mas, também, o aumento do trabalho escravo, do assédio moral no ambiente de trabalho, das condições degradantes em geral e consequentemente das doenças de ordem psicológica. Pois é o medo da fome que permite que o trabalhador se exponha em silêncio a todo tipo de humilhação.

Não precisamos de uma empresa que faça uma opção deliberada em empurrar a sociedade brasileira para o mapa da fome, priorizando o lucro em detrimento da vida. O que nos resta é cobrar o bom senso da Petrobrás e do governo federal em compreender que não há espaço para aventureiros quando o que está em pauta é a soberania alimentar de uma nação.

O histórico que temos até aqui nos mostra que o setor privado de fertilizantes não pode ser considerado se houver interesse real em atingir a produção interna de 50% do consumo de fertilizantes, conforme o atual Plano Nacional de Fertilizantes. Pois na primeira oportunidade, eles esquecem das diversas isenções e incentivos fiscais concedidos e vão exportar os fertilizantes nacionais para servir de lucro aos seus acionistas.