O deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ), que enfrentou o presidente da Câmara após sugestão de privatização da Petrobrás, contou em entrevista exclusiva como a discussão tem tramitado dentro do Congresso
[Por Andreza de Oliveira, do Sindipetro-SP]
Durante os ataques à Petrobrás proferidos pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), no dia 31 de maio, outro parlamentar, Glauber Braga (PSOL-RJ), fez uma defesa convicta do caráter público da empresa.
Com isso, contrapôs-se à ameaça do presidente da Casa de encaminhar um projeto de lei que retiraria do Estado a maioria das ações ordinárias (com direito à voto) da estatal, nos mesmos moldes da recente privatização da Eletrobrás.
“O senhor não tem vergonha?”, questionou Braga. Foi o suficiente para que um processo de quebra do decoro fosse instaurado contra o deputado do PSOL no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, em 14 de junho, podendo resultar em uma cassação de mandato.
Em entrevista exclusiva ao Sindicato Unificado dos Petroleiros do Estado de São Paulo (Sindipetro-SP), Braga esclarece como estão as discussões de privatização da petrolífera dentro do Congresso Nacional e como entende a medida adotada pela Câmara perante à sua indignação com o presidente da Casa, Arthur Lira.
Como estão as discussões sobre a privatização da empresa dentro do Congresso? Há chances de passar?
Há um risco grande porque Arthur Lira disse em uma reunião com líderes partidários que trabalharia para que essa matéria fosse votada no plenário.
Com a retirada de instrumentos de obstrução da oposição, que é um método para garantir que matérias não sejam votadas no plenário, Lira fez um procedimento rápido que permite apresentar um projeto a qualquer momento, hoje ou amanhã, e votá-lo com urgência.
A partir dessas circunstâncias, tem um risco, e vontade, do governo Bolsonaro votar esse tipo de matéria. Então, toda a atenção é pouca.
E se passar, a empresa pode ser privatizada ainda este ano? Como a oposição está se mobilizando para barrar essas eventuais tentativas?
Se existe uma autorização legislativa permitindo a entrega do controle acionário, isso já passa a ser uma privatização de fato se as ações de hoje, que são da União, forem repassadas ao setor privado.
Então, a gente não pode nem trabalhar com essa hipótese, tem que fazer de tudo para que eles não vendam ações e entreguem o controle acionário para o setor privado, que é aquilo que o Lira já deu indicativo de que pode fazer.
Como a oposição está se mobilizando para barrar essas eventuais tentativas?
Procurando dialogar com as pessoas e mostrar o que está acontecendo. Eu, por exemplo, quando vi que esse risco existia, perguntei para o Lira se ele não tinha vergonha de votar um projeto como esse, por maioria simples no plenário da Câmara. Isso fez com que ele desse entrada numa representação do Conselho de Ética da Câmara pedindo a cassação da minha atividade como deputado federal.
O importante é que isso serviu para politizar o debate, para que as pessoas soubessem da manobra fraudulenta que ele está tentando tocar por aqui, mas a gente tem que ampliar mais esses esforços para que essa seja uma pauta prioritária para todos os deputados da oposição, dos mais variados partidos, ou seja, a pauta de lutar contra a privatização da Petrobrás.
Como está lidando com a tentativa de cassação promovida pelo presidente da Câmara dos Deputados com o processo de “quebra de decoro”?
Como uma tentativa de silenciamento. Eu não posso perguntar se ele não tem vergonha de votar o projeto de privatização da Petrobrás, assim como criar uma salinha com orçamento secreto, que é uma vergonha evidente.
Não vou dar um passo atrás e não vou retirar uma palavra do que eu disse. O que eles estão tentando fazer aqui é uma vergonha e temos que nos mobilizar para que essa privatização não aconteça.
O que o processo de privatização da Eletrobras tem a ensinar? Ocorreu de maneira semelhante ao que querem promover contra a Petrobrás?
Ocorreu, infelizmente. E o que tiramos como lição é que não dá para colocar todas as expectativas na próxima esquina institucional, a luta tem que ser para já. Se o Bolsonaro privatizou a Eletrobras pra já, se está tentando privatizar a Petrobrás pra já, se está tocando corte na educação pra já, não dá para a gente esperar que isso só se reverta a partir do primeiro ano de 2023. A luta ativa, pressionando deputados para que não aprovem esse tipo de matéria também, tem que ser pra já.
Sobre 2023, como você visualiza a configuração do próximo Congresso Nacional? Esses projetos continuarão ecoando por lá?
Essa é, infelizmente, uma ameaça permanente porque existem filtros no sistema político brasileiro que faz com que essa turma do centrão, por exemplo, tenha muito peso e poder econômico para poder estar no exercício de mandato. O cara tem R$ 16 bilhões de orçamento secreto para irrigar suas bases eleitorais, isso é um absurdo dos absurdos.
Então, sim, esse tipo de agenda, infelizmente, pode continuar em pauta e a gente tem que fazer todos os esforços para eles não avançarem com as privatizações, e mais do que isso, tem que tensionar a esquerda para reverter as privatizações que eles estão tocando agora.
E sobre a CPI da Petrobras, há chances de acontecer? Como está essa discussão dentro do Congresso?
Essa discussão deu uma esfriada porque Lira e Bolsonaro fizeram, na verdade, um balão de ensaio. Eles quiseram terceirizar a culpa, como se a responsabilidade pelo aumento dos combustíveis não fosse deles, mas cooperam e sustentam a política de paridade de preço internacional. Então é uma mentira, a responsabilidade é diretamente deles e eles queriam dizer que não era.
Quando Lira fez a operação e conseguiu colocar alguém mais próximo a ele na presidência da Petrobrás, imediatamente eles esfriaram aquilo que a gente já dizia que ia acontecer, ou seja, que eles iam fingir querer tocar uma CPI da Petrobrás, mas na hora ‘h’ colocaram o pé no freio.
Na sua visão, como a sociedade pode se mobilizar para impedir a privatização da empresa?
Ocupando as ruas, participando das mobilizações e pressionando deputados e senadores. O abraço que foi feito na Petrobrás, no Rio de Janeiro, é importante, a mobilização que estudantes fizeram no dia 9 contra os cortes na educação é importante.
É necessário unificar essas lutas dos setores que estão sendo diretamente atacados por Bolsonaro agora e não esperar que tudo se resolva só com eleição, apoiando as greves que estão sendo tocadas por setores importantes e ampliando esse esforço de mobilização contra a política de distribuição de Bolsonaro.