Com o aumento das desigualdades sociais, extrema pobreza atinge 40% das crianças e adolescentes brasileiros com até 14 anos. No total, são 17,3 milhões de crianças e jovens com o futuro interrompido.
Os dados são da publicação “Cenário da Infância e da Adolescência no Brasil”, lançada nesta terça-feira (24) pela Fundação Abrinq, e se referem a 2016, ano do golpe de estado no Brasil, que destituiu uma presidenta legitimamente eleita – Dilma Rousseff – e colocou em seu lugar um grupo neoliberal, liderado pelo ilegítimo Michel Temer (MDB-SP), que passou a implantar uma pauta de retrocessos e de retirada de direitos sociais e trabalhistas.
Com a retirada de direitos, extinção ou redução de programas sociais, desemprego e aumento da informalidade, este último provocado pela reforma Trabalhista de Temer, que legalizou contratos precários de trabalho, os dados de 2018 podem ser ainda piores.
A administradora executiva da Fundação Abrinq, Heloisa Oliveira, disse, durante a apresentação da pesquisa, que o impacto da política de cortes de investimentos adotada pelo governo Temer ainda não foi medido e, “em função da limitação de gastos imposta pela Emenda Constitucional 95 [congelamento de gastos, em especial nas áreas da Saúde e da Educação], alguns investimentos já reduziram e vão se refletir num agravamento das estatísticas”.
“Esperamos que haja uma decisão política de mais investimentos na infância e que a gente não tenha que estar aqui no futuro falando que piorou”.
A administradora da Abrinq explicou que o estudo busca, a partir da compilação de todas as estatísticas públicas disponíveis, fazer um recorte sobre a população de crianças e adolescentes e criar indicadores que possam ser relacionados com as metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) – guia de ações de inclusão e sustentabilidade sugerida aos governos pela Organização das Nações Unidas (ONU) a partir dos debates realizados na conferência Rio+20. O ODS número 1 pretende erradicar a pobreza extrema em todo o mundo até 2030 e diminuir pela metade a população pobre mundial no mesmo período.
Extrema pobreza em São Paulo
No estado de São Paulo, o mais rico do país, a pobreza aumentou 23,9% de 2016 para 2017 e atinge 1,392 milhão de pessoas, em especial a parcela menos instruída da população e os pretos e pardos.
Os pretos e pobres são vítimas de um dos maiores retrocessos da história. Entre essa população, a miséria cresceu 61% (contra 13,6% da população branca). A região metropolitana de São Paulo, que concentra 39 municípios, tem 700.193 pessoas vivendo na pobreza extrema. Esse número é 35% maior do que era em 2016.
A LCA Consultores fez o levantamento com base no IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e mostra que são 180 mil pessoas a mais. A metodologia adotou a linha de corte do Banco Mundial, que considera em situação de pobreza extrema quem tem US$ 1,90 de renda domiciliar per capita por dia, corrigida pela paridade de poder de compra.
O economista da LCA Consultores, Cosmo Donato, autor do levantamento da Abrinq, disse, em entrevista ao jornal Valor Econômico, que os empregos informais não beneficiam a população mais pobre.
Segundo ele, o crescimento da pobreza extrema na Grande São Paulo, por exemplo, ocorre apesar da redução da taxa de desemprego na região – 14,2% no quarto trimestre do ano passado, o que representa 0,7 ponto percentual abaixo da verificada um ano antes. Para ele, “além de informais, esses empregos não beneficiaram a parcela mais pobre da população”.
“Estamos falando de pessoas que muitas vezes não conseguem se inserir nem na informalidade. É um problema mais estrutural. São pessoas com baixa qualificação, produtividade, e que conseguiram emprego no passado porque havia superaquecimento do mercado de trabalho. É um dado que não melhora com a recuperação cíclica do mercado de trabalho, vai exigir políticas sociais”, disse Donato.
Norte e Nordeste
Os piores índices de aumento da pobreza estão nas regiões Norte e Nordeste do Brasil, onde 54% das crianças e 60% dos adolescentes vivem em situação de pobreza.
Pobreza e violência
No Brasil, dos quase 57 mil mortos por homicídios em 2016, 18,4%, ou 10,7 mil pessoas, tinham menos de 19 anos, a maioria jovens pobres, negros e que vivem em regiões periféricas das grandes cidades. Ou seja, as estatísticas da violência refletem a ausência de investimento nas políticas sociais básicas e estruturantes do desenvolvimento das pessoas, segundo análise da Abrinq.
[CUT, com apoio Brasil de Fato]