A realização da I Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), chamada pelo presidente…
A realização da I Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), chamada pelo presidente da República e que ocorrerá de 1º a 3 de dezembro, abre a possibilidade de discutirmos temas há muito tempo "entalados" em nossa garganta, como o novo marco regulatório, que em sua atual conformação não tem espaço para a classe trabalhadora.
De olho nesta oportunidade, a CUT realiza seu 5º Encontro Nacional de Comunicação nos próximos dias 15, 16 e 17 de julho, em São Paulo. O encontro, que consolidará as propostas que a CUT vai levar para a Conferência, contará com a contribuição de todas as CUTs Estaduais e Ramos, engajadas na luta pela democratização das comunicações. A proposta é construir políticas públicas que estabeleçam mecanismos de controle social sobre as comunicações e combatam o monopólio, além da essencial formação de uma rede de comunicação cutista.
O presidente nacional da CUT, Artur Henrique, não tem dúvidas sobre a necessidade urgente de democratização dos meios de comunicação. Segundo ele, dentro desta nova concepção, "os meios estariam a serviço da sociedade e não dos grupos econômicos que, hoje, tratam o espaço das concessões públicas como meio privado de comercialização de seus produtos. É hora de consolidarmos instrumentos que possam colocar em pauta o projeto da classe trabalhadora".
Para a secretária nacional de Comunicação da CUT e integrante da Comissão Organizadora da Conferência Nacional, Rosane Bertotti, a questão principal é o controle social dos meios. "Parece-me lógico ter controle social em concessões que se dizem públicas. E o mais assustador é que este debate está sendo postergado há 50 anos. Precisamos estar atentos para não perdemos o bonde da história. A experiência da Conferência só será válida para nós se houver uma ampla unidade entre os movimentos sociais".
Em relação ao 5º Enacom-CUT, a secretária apontou a necessidade de investimento em novas tecnologias que possibilite uma visibilidade ainda maior às ações e posições cutistas. "Precisamos discutir e aproveitar as tecnologias digitais e convergência que pode nos proporcionar interatividade com rádio, TV e internet", ressalta Rosane.
Para o secretário de Comunicação da CUT São Paulo, Daniel Reis, o problema está na aversão da grande mídia, dominada por menos de uma dúzia de famílias, diante de qualquer anúncio de legítima apropriação dos meios de comunicação por parte dos movimentos sociais. "Acredito que o 5º Enacom será fundamental para integrar todas as nossas entidades em um espaço que já começamos a construir através de iniciativas como a Rede Brasil Atual", opina.
Na avaliação do diretor da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), José Torves, tanto o 5º Enacom-CUT como a Confecom serão extremamente importantes porque ampliam a discussão de um tema, até então, restrito às salas palacianas entre governos e empresários. "Devemos concentrar esforços para formular políticas que construam um efetivo controle social da mídia, que interessa a nós trabalhadores para enfrentar um poder desmedido da grande mídia oligopolista, que se comporta como partido político", acredita.
Para o jornalista Celso Augusto Schöreder, do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), o 5º Enacom é uma ótima notícia. "A CUT realizar um encontro de comunicação num momento único como este é extremamente positivo, porque trará um recorte inquestionável para a democratização, que é a visão dos trabalhadores".
E mais: "com a realização da Conferência teremos a chance de intervir em políticas conservadoras criadas pela ditadura militar que até hoje ditam regras e que sempre foram muito estruturadas", afirma.
Legislação caduca
Legalmente as concessões de rádios e de TVs no Brasil são públicas e concedidas às emissoras por meio de uma autorização do Estado. O mesmo acontece com a renovação. Todo esse processo é feito sem transparência e não segue as regras e muito menos é objeto de fiscalização. As renovações são feitas automaticamente. Concessões são dadas a grupos empresariais e a parlamentares sem consulta pública. Apesar de a Constituição Federal de 1988 reconhecer o sistema de radiodifusão como um serviço de bem público.
A CUT, que consolidará de forma detalhada sua pauta de reivindicações para a Conferência durante seu Encontro Nacional de Comunicação, já tem claras algumas posições. Veja a seguir algumas, entre as principais
– mudança na destinação das verbas publicitárias, que já foram quase exclusivamente reservadas a jornalões e grandes emissoras. Atualmente, o governo federal vem aumentando a parcela das verbas de empresas estatais e da própria União dirigidas a jornais regionais ou de bairros, mas ainda é preciso incluir jornais e programas alternativos, comunitários e étnicos;
– mudança do marco regulatório, impedindo a concessão ou renovação de concessão de canais de TV e rádio comerciais sem consulta pública;
– criação do controle social sobre os meios de comunicação, abrindo espaço para que representantes dos trabalhadores e de grupos organizados da sociedade em geral possam participar de avaliações periódicas dos grandes grupos de comunicação e indicar linhas de conduta;
– reserva de parcelas do horário de TVs e rádios comerciais para programas comunitários, educacionais, de saúde pública, de educação ambiental, direitos dos trabalhadores e dos consumidores, entre outros;
– garantia de acesso às tecnologias de informação e comunicação, em especial a internet, através de uma política pública nacional de inclusão digital;
– nova lei de imprensa, que determine de forma clara os limites e responsabilidades da mídia para com os indivíduos e grupos;
– direito à privacidade, com regulamentação do habeas data (instrumento jurídico que permite ao cidadão pedido de retificação de dados pessoais em cadastros ou publicações);
– liberdade aos canais comprovadamente comunitários de rádio;
– concessão de canais para o movimento social, com base na ampliação do espectro de faixas proporcionada pela tecnologia digital.
Outro tema que vai ser debatido no Enacom e na Confecom, sem dúvida, foi a recente decisão do STF que, segundo o próprio tribunal, teria derrubado a exigência de diploma para o exercício da profissão de jornalista.
A medida foi comemorada pelos donos de TVs, rádios e jornais. Mau sinal. Com a desregulamentação, sem dúvida o patronato espera precarizar ainda mais o mercado de trabalho no setor e, se possível, enfraquecer a ação sindical.
A Fenaj, ao comentar a decisão do STF, emitiu nota em que diz: " É um retrocesso institucional e acentua um vergonhoso atrelamento das recentes posições do STF aos interesses da elite brasileira e, neste caso em especial, ao baronato que controla os meios de comunicação do país. A sanha desregulamentadora que tem pontuado as manifestações dos ministros da mais alta corte do país consolida o cenário dos sonhos das empresas de mídia e ameaça as bases da própria democracia brasileira. Ao contrário do que querem fazer crer, a desregulamentação total das atividades de imprensa no Brasil não atende aos princípios da liberdade de expressão e de imprensa consignados na Constituição brasileira nem aos interesses da sociedade.
A desregulamentação da profissão de jornalista é, na verdade, uma ameaça a esses princípios e, inequivocamente, uma ameaça a outras profissões regulamentadas que poderão passar pelo mesmo ataque, agora perpetrado contra os jornalistas (…) A FENAJ assume o compromisso público de seguir lutando em defesa da regulamentação da profissão e da qualificação do jornalismo."