Com as expectativas de um novo superciclo de commodities e a taxa de câmbio sem sinais de alívio, cresce no mercado o apoio a medidas alternativas para proteger o consumidor da escalada dos preços dos combustíveis sem impactar as finanças da Petrobras.
Tanto Executivo quanto Legislativo avaliam medidas para suavizar os repasses das cotações internacionais do petróleo ao preço final dos produtos. As propostas vão desde a criação de um fundo de estabilização a alternativas tributárias.
A expectativa de uma solução que não impacte a Petrobras ajudou a impulsionar as ações da estatal nesta segunda (19), depois que o novo presidente da companhia, o general Joaquim Silva e Luna, sinalizou que a empresa continuará acompanhando as cotações internacionais.
As propostas em estudo consideram que a Petrobras já teve prejuízos bilionários quando foi usada para segurar os preços durante o governo Dilma Rousseff (PT), e que o estatuto da empresa hoje tem mecanismos para tentar impedir a repetição do problema.
Nesse período, estima-se que o prejuízo na venda de combustíveis somou entre US$ 40 bilhões e US$ 50 bilhões (cerca de R$ 80 bilhões a R$ 100 bilhões pelo câmbio da época).
O temor de novas ingerências derrubou as ações da companhia em meados de fevereiro, depois que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) anunciou a substituição de Roberto Castello Branco por Silva e Luna em meio a críticas pela escalada dos preços cobrados pela estatal.
O principal foco do governo hoje é viabilizar um fundo de estabilização com receita do petróleo, que poderia bancar parte da alta das cotações internacionais e seria reposto em caso de queda acentuada no mercado internacional.
A ideia inicial era usar os próprios royalties do petróleo como fonte de recursos para este fundo. Nas últimas semanas, o governo começou a estudar também a possibilidade de usar recursos de leilões de petróleo para garantir o colchão necessário para bancar as variações positivas.
Até 2002, as volatilidades internacionais eram suavizadas por um mecanismo semelhante, chamado PPE (Parcela de Preço Específica), que podia estar negativa em tempos de petróleo alto e positiva em tempos de petróleo barato.
Com a abertura do mercado de combustíveis, ela foi substituída em 2002 pela Cide, cujo valor também poderia variar de acordo com as cotações internacionais.
A Cide ainda existe: hoje a alíquota incidente sobre a gasolina é de R$ 0,10 por litro e a do diesel foi zerada como resposta à greve dos caminhoneiros de 2018. Mas a função de estabilizar preços, com a alíquota variando para baixo ou para cima, nunca foi usada.
Autor de uma proposta de retomada da função original da Cide, o deputado federal Christino Áureo (PP-RJ) sugere o estabelecimento de bandas de variação dos preços. Caso o petróleo suba dentro dessa banda, o imposto é diminuído para reduzir o repasse pelas refinarias.
Em caso de queda, o imposto é elevado para recuperar a arrecadação perdida, mecanismo semelhante à proposta do fundo.
Caso as variações sejam maiores do que a banda, o consumidor passa a pagar a conta. “É mecanismo de atenuação, não de solução a qualquer preço. Mas é muito mais conforável que o ambiente de selvageria que temos hoje”, defende.
O mercado de combustíveis, que já foi mais avesso a esse tipo de solução, começa hoje a ver com bons olhos. “A gente deveria encontrar algum mecanismo que não interfira na Petrobras”, afirmou, em entrevista em março, o presidente da Cosan, Luis Henrique Guimarães.
“O que se espera de um bom governo é um equilíbrio”, escreveu também em março o economista Franco Montoro. “Não é possível penalizar a Petrobras, como foi feito no governo Dilma Rousseff (PT), mas o governante tem a obrigação de proteger e defender o consumidor brasileiro.”
Coordenador técnico do Ineep (Instituto de Estudos Estratégicos em Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), o economista Rodrigo Leão também é partidário de mecanismos de estabilização, mas defende a criação de um imposto sobre a exportação de petróleo para financiar um eventual fundo.
Outra medida defendida pelo setor de combustíveis é a mudança na legislação do ICMS, passando de um percentual sobre o preço final para um valor fixo em reais. Hoje, o imposto estadual tem efeito retroalimentador dos preços: se a gasolina sobe nas bombas, o valor em reais do imposto sobe também, empurrando a gasolina para nova alta.
O professor do Instituto de Economia da UFRJ, Edmar Almeida, defende o debate sobre a carga tributária para “corrigir distorções” como a retroalimentação da alta pelo ICMS, mas avalia que a discussão sobre preços só ocorre por que não há competição no mercado.
“Só discutimos a Petrobras porque ela é monopolista e todo o mundo sabe que ela pode baixar os preços”, diz, frisando que soluções artificiais de preços têm impactos em outros setores da economia, como a indústria de etanol, que viveu quebradeira generalizada durante os anos de controle de preços da gasolina.
“O cardápio de experimentos nessa linha já se esgotou. Já se tentou de tudo, preço abaixo, preço acima, preço diário, e nada deu certo.”
Via Folha de São Paulo