Em artigo publicado no portal Opera Mundi, a representante dos trabalhadores no Conselho de Administração da Petrobrás, Rosângela Buzanelli, mostra como o prejuízo contábil resgistrado pela empresa no primeiro trimestre é mais um passo para a privatização integral da companhia. Rosângela foi eleita pelos petroleiros no primeiro turno da eleição para o CA da Petrobrás e aguarda a posse para iniciar o seu mandato.
Veja a íntegra do texto:
Prejuízo do 1º trimestre da Petrobrás escancara erros de gestão para além da pandemia
Rosangela Buzanelli*
Um olhar dissonante sobre os prejuízos anunciados. A notícia que a Petrobrás teve prejuízo de R$ 48,5 bilhões no primeiro trimestre abala o mercado financeiro e toda a população. Mas é preciso compreender mais a fundo o que isso significa e quais são os erros tomados pela atual gestão da companhia, para visualizar não só o cenário que se apresenta como também que ainda está por vir.
O prejuízo divulgado pela direção da Petrobrás é um prejuízo contábil, não operacional. E o que isso quer dizer? Significa que as operações da empresa deram lucro nesse período, inclusive com melhor resultado se comparado ao mesmo período de 2019. Aliás, ao decidir rever o fluxo de caixa futuro atualizando o preço do barril do petróleo, muito mais baixo, o saldo da conta se inverte, pois essa revisão gerou uma desvalorização dos ativos (impairment) em R$ 65,3 bilhões.
O que chama a atenção nesse resultado é a ordem de grandeza desse impairment quando comparado com outras petrolíferas.
Culpar unicamente a pandemia da covid-19 pela queda dos preços e por esse resultado negativo da empresa é mais oportuno do que correto. A pandemia tem parcela de responsabilidade quando reduz drasticamente o consumo de petróleo e derivados, e acirra a disputa pelos mercados, principalmente asiáticos, catalisando a crise entre Arábia Saudita e Rússia e derrubando o preço do barril.
Mas nenhuma grande petrolífera anunciou tamanho prejuízo. E é com as gigantes que ainda nos comparamos. E por que elas não amargaram tamanho prejuízo? Porque são empresas integradas, verticalizadas, e é nesse quesito que estamos perdendo sistematicamente.
Ao promover o desmonte da Petrobrás, seu esquartejamento, sua desintegração, enfim, seu “apequenamento”, as recentes e a atual direção da empresa não permitem que as diferentes áreas contrabalancem os resultados entre si e equilibrem o resultado final.
A estratégia adotada pela direção da Petrobrás, anunciada em “Nossa Visão” (“A melhor empresa de energia na geração de valor para o acionista, com foco em óleo e gás e com segurança, respeito às pessoas e ao meio ambiente”), de concentrar suas atividades na exploração, produção e exportação de petróleo cru do pré-Sal, condena a companhia e o país a reféns das oscilações geopolíticas e de preço.
A estreiteza dessa visão e a pequenez desse pensamento propõem reduzir a maior empresa do país, e uma das maiores do mundo no setor petróleo, a uma empresa cuja principal missão é gerar valor financeiro para os acionistas privados, ao invés de atender o povo brasileiro, seu acionista majoritário, abastecendo o mercado interno com preços justos e competitivos, sem perder sua lucratividade.
A atual crise do petróleo agravada pela pandemia da covid-19 evidenciou o absurdo, o colossal erro da direção da Petrobras na sua condução, seja em relação ao parque de refino ou em relação ao transporte e distribuição, especialmente à BR Distribuidora.
A queda do preço e do consumo, o excesso da oferta de petróleo no planeta e no país, forçaram a Petrobras a rever suas estratégias. Para conseguir sobreviver, a empresa tem recorrido ao seu parque de refino, inclusive às refinarias que colocou à venda, com destaque a RLAM e RNEST, para a produção do GLP, visando atender ao mercado interno, e do bunker (combustível marítimo), ainda com demanda no planeta. Neste último caso, nosso produto tem muita aceitação no mercado, pois o óleo do pré-sal tem baixo teor de enxofre, nos permitindo oferecer o bunker que atende a nova regulação da IMO, que a partir de janeiro de 2020 reduziu os teores de 3,5 para 0,5 ppm.
Portanto, fica claro e cristalino o erro estratégico da atual direção quando decide reduzir seu parque de refino colocando à venda 8 das 13 refinarias.
Na distribuição, destaca-se a venda do controle acionário da BR, um erro crasso, injustificável, pois a BR, a segunda maior empresa do Brasil, além lucrativa, representava o “caixa” da empresa, detendo o maior mercado consumidor e a missão estratégica da distribuição dos combustíveis em nosso país de dimensões continentais. Venderam a segunda maior empresa do país e mais do que isso, seu mercado cativo, o maior do país no setor. Um ativo que será pago pelo seu próprio lucro em poucos anos e cujos resultados modificariam substancialmente os resultados da Petrobras.
O acúmulo de estoques de petróleo e derivados, causado pela queda brutal do consumo em função da pandemia, gera uma corrida mundial por tanques de estocagem. Nesse contexto, tanto a Petrobras, como as demais empresas petrolíferas, se lança na disputa por tanques para estocagem dos derivados, recorrendo às empresas distribuidoras de combustíveis. Como não é mais a sócia majoritária da BR, terá que disputar a tancagem disponível com as demais empresas distribuidoras que atuam no país.
As maiores empresas de petróleo e energia do mundo, estatais ou privadas, são empresas integradas, pois é essa integração que as torna gigantes, permitindo que, diante das mudanças geopolíticas e das oscilações de preços e das demandas do mercado internacional, as diferentes atividades compensem umas às outras.
A desintegração e o apequenamento da Petrobrás não servem à visão empresarial, muito menos à Nação Brasileira e seu povo, seu maior acionista, mas a interesses outros, imediatistas e altamente questionáveis.
Os resultados anunciados seriam muito diferentes se a Petrobras se mantivesse na missão de ser uma das maiores empresas de energia do mundo, pública, forte e integrada como os reais patriotas a concebem.
#PrivatizarFazMalAoBrasil
É PETROBRÁS, É DO POVO, É BRASIL.
* Rosangela Buzanelli Torres é engenheira geóloga formada pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e tem mestrado em Sensoriamento Remoto pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Trabalha há 33 anos na Petrobras. Em breve, assumirá o mandato no Conselho de Administração (CA) da companhia, como representante dos trabalhadores, a fim de defender uma Petrobras pública, forte, integrada e que valorize seus funcionários.