Após cinco anos da primeira ação da operação Lava Jato, em março de 2014, o país ainda sente seus impactos na economia e ainda não se recuperou do desmonte do setor industrial do país.
O advogado Walfrido Warde Jr., autor do livro “O espetáculo da corrupção”, pontua que a Lava Jato instalou um novo paradigma de combate à corrupção, baseado na repressão, mas que não conseguiu agir nas causas do problema.
“Esse novo modelo traz uma revolução na detecção e na punição da corrupção, mas ao mesmo tempo pouca solução para empresas envolvidas. Ou seja, elas demoraram para virar a página e muitas delas ainda não viraram. E, de fato, isso causou um problema para a economia do país”.
Warde afirma que, embora a recessão econômica tenha outros fatores, a operação Lava Jato foi responsável pelo desmantelamento de praticamente todo o setor de infraestrutura do país. Nos primeiros três anos de operação, foram mais de 2,5 milhões de demissões ligadas ao paralisação de obras de empresas alvos da operação ou as que mantinham contratos com elas.
Em dezembro de 2013, por exemplo, a Petrobras tinha mais de 446 mil funcionários. Três anos depois, a estatal do ramo petrolífero contava com pouco mais de 186 mil – uma redução de 58%.
No setor privado, uma das empresas mais afetadas foi a Engevix. Entre 2013 e 2016, a companhia demitiu 85% de seu quadro funcional. Em dezembro de 2013, ela empregava 17 mil pessoas. Três anos depois, tinha apenas 3 mil funcionários.
O Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval), afirma que, em 2018, houve uma redução de 5 mil empregos em estaleiros na comparação com o ano anterior.
Este número representa uma queda de 64% em comparação a dezembro de 2014, pico da atividade no país, quando 42 estaleiros nacionais empregavam 84 mil trabalhadores. Hoje, o número é de apenas 25 mil. O setor ganhou fôlego com o início da exploração do petróleo da camada pré-sal, em 2010.
Os cortes no setor continuam. A expectativa da entidade é que esse número seja reduzido ainda mais, para cerca de 6 mil pessoas até 2020. O sindicato relaciona a perda de postos de trabalhos à falta de investimentos na Petrobras.
A passos lentos
O ritmo de recuperação da indústria segue lento. A produção industrial cresceu 1,1% em 2018, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Já a Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostrou que o faturamento do setor industrial em 2018 teve crescimento de 4,1% no acumulado de janeiro a dezembro, em comparação ao mesmo período de 2017.
Esses índices de crescimento da produção industrial brasileira são pequenos e, inclusive, desacelerou. Em 2017, a produção industrial cresceu 2,6%, após três anos de recuos consecutivos. O que não recupera o período em que acumulou uma perda de 16,7%, entre 2014 e 2016.
A taxa média de desocupação no país caiu de 12,7% em 2017 para 12,3% em 2018, depois de quedas consecutivas desde 2015. Mas a informalidade tem batido recordes e está no patamar mais alto da da série histórica iniciada em 2012 pelo IBGE. O número de empregados sem carteira assinada no setor privado, excluídos domésticos, chegou a 11,2 milhões.
O presidente da Confederação Nacional dos Metalúrgicos (CNM-CUT), Paulo Cayres, afirma que a operação evidenciou seu caráter de perseguição política, com a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em abril de 2017, e a indicação de Sérgio Moro como ministro da Justiça. Segundo ele, a operação se mostrou como fraude.
“É um absurdo. Você tem que punir CPF e não o CNPJ. Você não pode atacar as empresas, você teria que atacar o cara que é corrupto”.
Perspectivas
Cayres destaca que o desmantelamento da indústria nacional, principalmente em relação às estatais, entra em uma nova etapa com a eleição de Jair Bolsonaro (PSL).
“Nem os empresários que apoiaram o governo Bolsonaro têm perspectivas para a indústria. Ele não tem plano nenhum. Plano zero de pensar na indústria. O plano dele é privatizar tudo. Ou seja, entregar nossas indústrias, como já fizeram com a Embraer, estão fazendo com a Petrobras”, argumenta.
Na mesma linha, Walfrido Warde Jr. acrescenta que ainda é cedo para falar em recuperação industrial e o rumo da política econômica do Brasil no governo de Jair Bolsonaro (PSL).
“Nós temos mensagens que são contraditórias nesse governo. Nós temos tendências liberais em alguns personagens, mas temos também tendências nacionalistas e protetivas em outros”, diz. “Me parece concreto que nós não teremos um modelo liberal tradicional. O ministro Paulo Guedes parece ter planejado inúmeras atuações no estado e na economia. Temos que esperar um pouco para saber o que vai acontecer. Quais serão as políticas macroeconômicas adotadas por esse governo”.
O advogado não identifica a superação de um modelo repressivo de combate à corrupção para um modelo que combate as causas. Ele ainda afirma que a organização empresarial concentrado, da maneira como é hoje, intensifica o problema.
“Não há uma base acionária pulverizada, tradicionalmente, por de trás das empresas brasileiras. E isso torna muito mais difícil, diante de um problema de corrupção, resolver o problema separando o controlador, o administrador, de um lado; e a empresa de outro para tentar punir responsáveis sem destruir valor, empregos e a atividade empresarial de um modo geral. Eu acho que nós não conseguimos superar esse segundo problema”, avalia.
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[Via Jornal Brasil de Fato]