‘Chega de chantagem’, diz Dilma

Por Najla Passos, da Carta Maior

A presidenta Dilma Rousseff se pintou para a guerra e, nesta quarta (2),  decidiu não se submeter a chantagem feita pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que ameaçou acolher o pedido de impeachment contra ela, caso os três deputados petistas com assento no Conselho de Ética da Câmara decidissem votar pela admissibilidade do processo de cassação dele.

Ela avalizou a decisão do PT de apoiar a abertura do processo de cassação de Cunha, anunciada no início da tarde, após reunião da bancada do PT. “Chega de chantagem”, disse a parlamentares próximos. O peemedebista imediatamente cumpriu a ameaça: convocou uma coletiva de imprensa e, no final da tarde, deflagrou o início do processo de impeachment. Segundo ele, sua decisão é “técnica” e “atende a um pedido das ruas”.

Antes disso, a retomada da reunião do Conselho de Ética que irá analisar a abertura do processo contra Cunha, marcada para esta quarta, já havia sido protelada para a próxima terça (8), devido a uma sucessão de manobras do próprio presidente da Câmara e da sua tropa de choque. Mas uma conta simples já demonstrava que os três votos petistas seriam suficientes para garantir o processo. O placar atual é de 7 votos favoráveis contra 1 – e o coletivo tem 21 membros, sendo que o presidente só vota em caso de empate.

Na terça (1), quando a votação teve início, os três petistas chegaram a anunciar que iriam se submeter à chantagem. O deputado Zé Geraldo (PT-PA) disse até que eles votariam “com uma metralhadora no pescoço, apontada por Cunha”. Mas a mobilização geral os convenceu do contrário. O próprio presidente do PT, Rui Falcão, pediu, via Twitter, que os deputados se posicionassem pela abertura do processo cassação. Um abaixo-assinado, que reuniu 34 dos 60 deputados do partido, defendeu a mesma posição.  

Dilma não é Cunha!

Na noite desta quarta (2), Dilma fez um pronunciamento, do Palácio do Planalto, para dizer que recebeu “com indignação” a notificação da Câmara sobre a abertura do processo. E partiu para cima de Cunha com a altivez de quem tem a faca e o queijo na mão para não ser julgada pela mesma régua que o mede. “Não paira contra mim nenhuma suspeita de desvio de dinheiro público. Não possuo conta no exterior. Nunca coagi e nem tentei coagir instituições em busca de satisfazer os meus interesses”, afirmou.

A presidenta também deixou claro que não se submeteria a uma negociação com o presidente da Câmara para salvar o pescoço de ambos. “Eu jamais aceitaria ou concordaria com quaisquer tipos de barganha, muito menos aquelas que atentam contra o livre funcionamento das instituições democráticas do meu país, bloqueiam a Justiça ou ofendam os princípios morais e éticos que devem governar a vida pública”, ressaltou.

A bancada do PT na Câmara anunciou que irá interpelar Cunha no Supremo Tribunal Federal (STF). A alegação é que o presidente de um dos poderes da República não pode usar do expediente da “chantagem” para governar. Os deputados do partido alegam também que não existe nenhuma base jurídica para o acolhimento de um pedido de impeachment contra uma presidenta sob a qual não pesa nenhuma denúncia.

A ameaça vem é da economia

O cientista político Wanderley Guilherme dos Santos, professor aposentado da UFRJ, acredita que a oposição não tem hoje condições de conseguir os dois terços dos votos dos deputados,  necessários para garantir o impeachment da presidenta. Para ele, o problema real que este governo tem para enfrentar é a crise econômica.

“Eu não acredito que a oposição consiga dois terços dos votos da Câmara. A situação econômica está, sim, muito difícil. Mas em relação ao tema do impeachment, o que continua é este processo de desgaste do governo que vem desde a eleição. Não creio que se chegue a um termo favorável à oposição”, afirmou.

De acordo com ele, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, está completamente desmoralizado e não possui mais legitimidade para conduzir um processo desta natureza. “Como pode um presidente da Câmara ameaçado de prisão a qualquer momento deflagrar um processo de impedimento contra uma presidenta em relação a qual não existe nenhuma acusação?”, questiona.

Para Santos, a desmoralização de Cunha atinge também sua tropa de choque. “Os personagens principais deste novelão não têm mais apoio nem mesmo de boa parte do eleitorado da oposição. Cunha fez chantagens às claras, e isso foi chocante para qualquer pessoa que não esteja agindo de má fé. E eu não acredito que a maioria dos eleitores da oposição – as pessoas comum – aja de má fé”, argumentou.

Para ele, o que surpreende é a maioria da população e mesmo do parlamento se assustar com o cumprimento da ameaça do presidente da Câmara. “Este é um movimento golpista, porque não existe nenhuma justificativa para isso. E não acredito que estes golpistas tenham condições de mobilizar nem a metade do número de pessoas que foi na última passeata pró-impeachment, que já foi um fracasso”, acrescentou.