“As perseguições que os petroleiros sofreram no governo FHC só são comparáveis aos anos de chumbo da ditadura”

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Nos quase 30 anos em que trabalhou na Petrobrás, o engenheiro de petróleo Jorge Eduardo Nascimento pautou sua trajetória pela resistência contra a privatização e o sucateamento da empresa e em defesa da soberania nacional. Nascido em Garanhuns, Pernambuco, ele entrou por concurso público na Petrobrás em 1976 e trabalhou nos estados da Bahia, Sergipe, Alagoas, Rio Grande do Norte, Ceará e Rio de Janeiro. Participou da fundação da FUP, foi diretor do Sindipetro-RJ, do Sindicato dos Engenheiros e da Aepet. Nos anos 80 e 90, foi vítima de uma série de perseguições políticas e assédios morais violentos em função das denúncias de irregularidades e tráficos de influência na companhia. Nesta entrevista, Jorginho, como é conhecido entre os companheiros de trabalho e de militância, fala sobre o envolvimento do PSDB em esquemas que nunca foram devidamente investigados na Petrobrás e o retrocesso que representaria a volta dos tucanos como gestores da empresa.

Fale um pouco sobre as “relações perigosas” do PSDB na gestão da Petrobrás durante os anos 90

Eu e outros petroleiros fomos punidos por denunciarmos uma série de irregularidades em contratos firmados pela Petrobrás durante as gestões Collor, Itamar e FHC e, em função disso, sofremos desvios de função e até 29 dias de suspensões. O desmonte sofrido pela empresa nos governos do PSDB foi escandaloso e tinha por objetivo a privatização da Petrobrás. A campanha de 2002 de Geraldo Alckmin ao governo do Estado de São Paulo recebeu R$ 1 milhão da Brastubos, empresa que havíamos denunciado em 1996 por fornecer tubos defeituosos para a Petrobrás, mas que os gestores da empresa fizeram de tudo para abafar. Outro esquema que trouxemos à tona nos anos 90 foi o da empresa Marítima, suspeita de favorecimento em diversas licitações de plataformas na Petrobrás. Na época, chegou-se a suspeitar de que parte do dinheiro “arrecadado” da Marítima foi utilizado para a reeleição de FHC.

Por que o governo de FHC não investigou o afundamento da P-36?

O Relatório final do CREA-RJ, resultado da comissão de investigação do acidente, apontou uma série de irregularidades que levaram ao afundamento da P-36 e à morte de 11 trabalhadores. O CREA encaminhou o documento ao Congresso Nacional para que os parlamentares instaurassem uma CPI que investigasse não só o acidente da P-36 como vários outros que ocorreram na época. Mas o governo do PSDB não teve interesse em apurar os fatos e preferiu afundar a investigação com a plataforma.

Nota da FUP: A P-36, que custou na época à Petrobrás 350 milhões de dólares, foi reformada pela Marítima, sem licitação. Quando o relatório do CREA foi encaminhado à Câmara do Deputados Federais, o presidente da Casa era Aécio Neves, que atuou para impedir a instalação da CPI, usando como argumento que a investigação já havia sido feita pela ANP, cujo diretor era o então genro de FHC, David Zylbersztajn. 

Que legado o PSDB deixou para a Petrobrás?

O sucateamento foi absurdo, além das perseguições políticas contra os trabalhadores e que só podem ser comparadas com os anos de chumbo da ditadura civil-militar. Mas considero que o pior legado do PSDB foram os gravíssimos acidentes ocorridos na época, como os vazamentos de óleo na Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro (os dutos que ligam a Reduc ao Terminal de Ilha d`Água se romperam em 1997, derramando 2,8 milhões de óleo, e novamente em 2000, vazando 1,3 milhão de óleo), o afundamento da P-36, em 2001, e o acidentes na Baía de Paranaguá, em outubro de 2001, no Paraná, que derramou 392 mil litros de óleo. Este legado de mortes e acidentes ambientais do governo FHC só é comparado ao trágico ano de 1984, no final da ditadura civil-militar no governo do general Figueiredo, quando tivemos três acontecimentos horríveis: o incêndio na Vila Socó, em São Paulo, com 93 mortes e milhares de desabrigados, a tragédia na plataforma de Enchova, que matou 37 trabalhadores, e a morte de 18 jornalistas durante um acidente aéreo quando se dirigiam a uma plataforma da Petrobrás para cobrir o recorde de produção de 500 mil barris de petróleo.

Qual foi o maior enfrentamento que você teve na empresa?

Foi quando eu dei uma entrevista à Folha de S. Paulo, em agosto de 1984, cobrando a investigação das causas do acidente em Enchova. Mas, infelizmente, a direção da Petrobrás na época não permitiu que o Sindicato dos Engenheiros, do qual eu fui diretor, participasse das investigações. A empresa forjou um laudo isentando de responsabilidades a Pozzos, empresa norte-americana responsável pelo projeto da plataforma. Para tentar me calar, os gestores da Petrobrás chegaram a me oferecer cargos, que eu recusei, pois preferi continuar denunciando os mal feitos na empresa. Por isso, sofri durante anos perseguição política, mas nunca desisti de lutar para que a segurança e a vida dos petroleiros fossem sempre prioridade em qualquer projeto de engenharia.

Que riscos correm os trabalhadores e a Petrobrás, caso o PSDB vença a eleição?

Os trabalhadores correm riscos de desemprego, assim como foi na época de FHC, quando as plataformas eram construídas no exterior. Foi o que aconteceu com a P-36, que afundou e matou 11 petroleiros. Os concursos públicos que empregaram milhares de petroleiros pelo país afora certamente serão interrompidos. A Petrobrás corre o risco de ser privatizada e o pré-sal deixará de ser nosso grande passaporte para o futuro. Os programas sociais e culturais da Petrobrás, que têm levado cidadania aos rincões mais esquecidos do norte-nordeste e às periferias das grandes cidades, também estarão na linha de corte do PSDB. As relações de trabalho ficarão comprometidas e os petroleiros correm o risco de voltarem a sofrer perseguição política como aconteceu durante todos os oito anos governados pelo PSDB. Um período só comparável aos anos de chumbo da ditadura civil-militar.