Artistas fazem ato no Rio em defesa da democracia

O ato político “Teatro Pela Democracia”, contra o impeachment da presidente Dilma Rousseff, reuniu mais de mil artistas na Fundição Progresso, na Lapa, na segunda (21/3), segundo os organizadores.

Estiveram presentes Leonardo Netto (da Cia. dos Atores), Elisa Lucinda (de “Parem de Falar Mal da Rotina”), Luisa Arraes (de “Santa Joana dos Matadouros”), João Pedro Zappa (de “A Importância de Ser Perfeito”), Gregorio Duvivier (de “Portátil”), Adriana Schneider (do Reage, Artista!), Paulo de Moraes (da Armazém Cia. de Teatro), Jitman Vibranovski (de “Silêncio!”), Julio Adrião (de “A Descoberta das Américas”), Paulo Verlings (da Cia. Teatro Independente), Amir Haddad (do Teatro Oficina), Emiliano D’Ávila (de “Os Javalis”), Chandelly Braz (de “Clandestinos”), entre outros, além de estudantes da Escola Técnica Estadual de Teatro Martins Pena. Também participaram intelectuais, professores e jornalistas, e houve transmissão ao vivo pela Internet.

Organizado por Angela Leite Lopes (de “Teatro de Ouvidos”), Enrique Diaz (de “Cine Monstro”), Flora Sussekind, Gabriela Carneiro da Cunha (de “S’imbora, o Musical”), Ivan Sugahara (de “El Pánico”), Lívia Paiva (de “Domínio do Escuro”), Patrick Sampaio (de “A Conferência dos Pássaros”) e Tárik Puggina (de “Marco Zero”), o evento defendeu a democracia e se posicionou contra o que chama de “golpe jurídico-midiático”. No palco, havia uma faixa com a frase “não vai ter golpe!”. Dito apartidário, o ato defendeu conquistas sociais do governo PT e exigiu “a continuidade do governo eleito” em seus discursos.

Foram vários depoimentos, dos mais diversos artistas e intelectuais. Em sua oratória, Gregorio Duvivier ressaltou que a reunião não era de adesão ao governo Lula-Dilma. “Mas a direita nos colocou nesse paradoxo: defender o indefensável, porque é impossível não defendê-lo. Não é um ato de defesa de Lula e Dilma, e sim um ato de defesa do voto de 53 milhões de pessoas que votaram nesse projeto. Que isso seja lembrado: não são votos menores ou piores”, discursou. Outros nomes também criticaram posicionamentos do PT, como a aliança com o PMDB. 

O ator e diretor musical Claudio Botelho, defensor do impeachment, foi lembrado no evento – por conta do episódio recente envolvendo a apresentação de “Todos os Musicais de Chico Buarque em 90 Minutos” em Belo Horizonte. Muito criticado, ele foi um dos alvos do discurso de Elisa Lucinda, que disparou: “Claudio Boteho, a casa caiu”. Lendo um texto todo voltado contra ele, a atriz associou-o ao facismo, criticou a comparação que ele fez com “Roda Viva”, chamou-o de ignorante e racista (pelo conteúdo da conversa vazada com Soraya Ravenle). Foi muito aplaudida.

Amir Haddad também fez referência à polêmica do Claudio, com uma metáfora sobre “zika vírus social, que contamina sem que você se dê conta que está contaminado”. Segundo o diretor, o zika vírus social faz com que todos fiquem com o mesmo discurso, repitam o mesmo e, na fase final da doença, se tornem extremamente violentos. O vetor da doença é, na sua opinião, os meios de comunicação de massa. “Mesmo o teatro sofre eventuais contaminações do zika vírus. Vocês viram o ataque em cena há pouco tempo, viram a manifestação da peste em cena, no palco, de uma maneira violenta, assustadora. Viram como se manifestou. É espantoso! Ao mesmo tempo, vimos uma coisa maravilhosa: a plateia inteira se levantar e dizer ‘não, não, não, não, não’. Aquela gente de Minas Gerais disse não. O negro filho da **** disse não, não, não”, opinou, em alusão ao confronto de Claudio Botelho com parte de plateia de “Todos os Musicais…” no último fim de semana.

Veja na íntegra o manifesto:
 
Teatro pela democracia
Pela legalidade democrática.
Pelo estado democrático de direito.
Contra o golpe jurídico-midiático.
Contra o impeachment.
 
Este ato surge da necessidade de grupos ligados ao trabalho em teatro de resistir ao golpe em curso e defender a democracia.
 
Ato aberto e apartidário para o qual conclamamos artistas de outras áreas, profissionais de outros campos e todos aqueles que, como nós, não permitirão que a ameaça ganhe mais terreno.
 
Vimos repudiar enfaticamente os acontecimentos que atentam contra o estado de direito e a legalidade democrática.
 
Vimos nos posicionar pela defesa dos direitos civis e das garantias individuais.
 
Vimos reconhecer a importância das recentes conquistas do povo brasileiro, entre elas a diminuição significativa da secular desigualdade social; a saída do Brasil do mapa da fome; o aumento do acesso das classes populares à educação fundamental, técnica e universitária; o desenvolvimento de políticas pela igualdade e diversidade racial, religiosa e de gênero.
 
Vimos exigir a continuidade do governo eleito e o avanço das políticas de distribuição de renda e demais pautas tão fundamentais quanto urgentes para uma maior justiça social e ainda carentes de atenção, entre elas a demarcação e defesa de terras indígenas, maior regulação do agronegócio, a defesa do Estado laico, a real reforma política, a democratização dos meios de comunicação, a descriminalização dos movimentos sociais, a aprovação da PEC 150-421 que garante o mínimo de 2% do orçamento federal para a Cultura.
 
Nós, artistas, que desempenhamos papel histórico fundamental na resistência à ditadura militar, não faltaremos com nossa contribuição em um momento como o que se apresenta. Não se trata de partidarismo. O fazer político não pressupõe filiações institucionais. Tomaremos partido!
Experimentados em dramaturgia que somos, nos afronta a farsa mal armada, o subtexto medíocre, a direção mal intencionada.
 
Um golpe está sendo montado, podemos ver, mesmo que os refletores apontem para o outro lado e as armas sejam outras.
 
Não permitiremos que caia o pano da jovem democracia brasileira. Nosso fazer não diz respeito à arte somente, mas a todos aqueles que vivem e têm voz. A todos os que acreditam na importância de ter suas palavras ouvidas e livres, ou virão a delas se servir.
 
Um palco incendiado põe em risco todos os atores e narrativas. Não admitiremos a reencenação de um triste e – julgávamos – superado período histórico.
 
No teatro, os que realmente veem e ouvem não permanecem calados por muito tempo. Vemos suas vozes se erguendo em cada vez mais alto e bom som.
 
Não vai ter golpe. Nunca mais.
 
Fonte: Agência Petroleira de Notícias (APN)