Debate que abriu o segundo dia do XIX Confup mostrou que as lutas políticas e por direitos não podem ser dissociadas, pois ambas são alicerce da defesa da Petrobrás, enquanto empresa pública e socialmente responsável
[Por Vitor Menezes, da imprensa do Sindipetro NF]
A Petrobrás completa 70 anos no dia 3 de outubro deste 2023. Sua trajetória, marcada desde o início por resistência popular aos interesses estrangeiros do setor petróleo, continua a impor vigilância e defesa, como demonstra mesa que debateu o tema, na manhã de hoje, durante o XIX Confup (Congresso da Federação Única dos Petroleiros).
Segundo painel do evento que começou ontem e segue até o próximo domingo, “os 70 anos da Petrobrás: passado, presente e futuro que queremos” foram debatidos pelo ex-coordenador da FUP, João Antônio de Moraes, e pelo diretor técnico do Ineep (Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), Mahatma Ramos dos Santos, com moderação da coordenadora do Sindipetro-BA, Elisabete Sacramento, e do diretor do Sindipetro-NF, Marcelo Nunes.
Moraes traçou uma panorâmica histórica da Petrobrás, partindo da centralidade das lutas dos petroleiros e das petroleiras pela manutenção do papel público e social da companhia ao longo das décadas, com destaques para as greves de 1963, 1983 e 1995.
Antes, no entanto, o sindicalista reconheceu o grande papel da pressão exercida por toda a sociedade na criação da companhia. “A história da nossa empresa é essencialmente uma história de luta política. Não há nenhum outro caso que tenha tido tanta disputa política quanto a Petrobrás […]. Getulio Vargas foi pressionado pela sociedade. Inicialmente ele era contra, não só à criação, mas ao monopólio. A luta tomou tal tamanho que a disputa ficou para quem apresentava o projeto mais avançado”, relata.
Moraes relembra que, na greve de 1963, além da equiparação de direitos entre refinarias privadas e as duas refinarias da Petrobrás, a categoria reivindicava a própria encampação das refinarias privadas pela companhia — o que virá a acontecer no governo João Goulart mas será revertido pela ditadura implantada pelo golpe de 1964.
Na greve de 1983, após uma redução brutal nos direitos dos trabalhadores, a categoria petroleira acabou por gerar uma onda de solidariedade, somando metalúrgicos, bancários e metroviários, que foi essencial para enterrar de vez o regime militar.
“Os metalúrgicos estavam em um congresso em Piracicaba e decretaram greve de solidariedade aos petroleiros. A revolta do sistema com a solidariedade foi ainda maior. Levando ao fechamento de sindicatos de petroleiros, metalúrgicos, bancários, metroviários, mas aquela greve foi a pá de cal do regime. A greve se encerra melancolicamente, mas acaba por levar a uma greve geral que fundou a CUT”, expõe Moraes.
E em 1995, sob o governo de Fernando Henrique Cardoso, na greve que cobrou o cumprimento de acordo firmado no governo anterior, de Itamar Franco, a categoria realizou uma grande resistência à privatização. A greve, considerada maior do setor petróleo no mundo, durou 32 dias e enfrentou reação governamental violenta.
“Há quem diga que foi a maior greve no mundo no setor petróleo, com 90% de adesão, paralisou tudo, um enfrentamento muito forte ao governo. No dia 24 de maio, na tentativa de abalar o movimento, o governo ocupou quatro refinarias com tropas militares, três em São Paulo e uma no Paraná, mas a greve continuou e no dia 26 de maio o TST julgou a abusividade da greve, que apesar de ser uma greve basicamente pelo cumprimento do acordo, tinha também como pauta a não privatização da Petrobrás”, explica.
“O que resta desse resgate dos 70 anos da Petrobrás, com certeza, a lição mais importante, é a da importância da luta política agregada às lutas pelos direitos imediatos. Não podem ser dissociadas. Em defesa da classe trabalhadora e em defesa do país”, conclui o sindicalista.
Cenário atual e perspectivas
Após o mergulho histórico proporcionado pela exposição de João Moraes, a mesa de debate entrou, com a fala do pesquisador Mahatma Ramos, em uma avaliação de conjuntura e uma identificação de uma mudança de rumo para a Petrobrás.
O diretor técnico do Ineep afirmou que “há uma crescente tensão entre as nações mais poderosas e a questão energética e do petróleo estão no centro desses embates no mundo, em plena mudança geopolítica, mudança tecnológica, de ampliação de rota tecnológica, avanços de uma agenda de pesquisas e debate, mas sobretudo de política de transição energética”.
Defendendo a centralidade do país e da Petrobrás neste cenário, Mahatma lembrou que “o Brasil está hoje na condição de ser o 9º maior produtor de petróleo, com 3,3% da produção global, é o 8º maior consumidor, o 9º em capacidade de refino, o 16º em reservas provadas de petróleo. Não é um país qualquer e a Petrobrás não é uma empresa qualquer”.
O pesquisador demonstrou que a empresa passou em sua história recente por um grande ciclo de crescimento, com a descoberta do pré-sal, com grande aumento dos investimentos e dos empregos, seguido, após o golpe de 2016 e da Operação Lava Jato, de um ciclo de desmonte e desnacionalização.
Agora, sob o terceiro governo Lula, a própria iniciativa privada clama pelo retorno de um protagonismo da Petrobrás. “Hoje, depois de um processo de desmonte e desnacionalização, fala-se em neoindustrialização do Brasil. É a primeira demanda do setor privado, que em 2016 foi colocado como vanguarda e estão falando hoje que não têm capacidade de investimento, que a Petrobrás tem que investir, como a galinha dos ovos de ouro”, afirma.
Neste primeiro semestre de 2023, algumas mudanças sinalizam uma virada de perspectiva para a Petrobrás. Houve anúncio de lucro de R$ 28,7 bilhões, uma queda de 47% no lucro líquido, em razão da queda do preço do barril do petróleo no mercado internacional e da mudança da política comercial da companhia, que resultou na redução de preços ao consumidor. Houve ainda redução de 83% na distribuição de dividendos aos acionistas.
A companhia, portanto, passou a refrear os impulsos por lucros de curto prazo e distribuições de dividendos vultosos aos acionistas, e a assumir um papel mais estratégico na defesa dos interesses nacionais, que se reflete, por exemplo, no crescimento de quase 6% no volume de investimento no segundo trimestre de 2023, na comparação com o segundo trimestre de 2022. “Vemos mudanças que apontam na direção das demandas histórica da FUP”, avalia o pesquisador.
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