“A venda de oito refinarias da Petrobrás significa a entrega de metade do mercado brasileiro de derivados”

Exmo. Sr.

Dr. EDSON FACHIN

D.D. Ministro do Supremo Tribunal Federal

Senhor Ministro,

A AEPET – Associação dos Engenheiros da PETROBRÁS, entidade civil, com 59 anos, reúne mais de 5200 profissionais das diferentes categorias universitárias do SISTEMA PETROBRÁS, sede no Rio de Janeiro tem como objetivos estatutários a defesa da PETROBRÁS, de seu CORPO TÉCNICO e da SOBERANIA NACIONAL.

No momento em que o Supremo Tribunal Federal examina a representação do Congresso Nacional sobre as refinarias da PETROBRÁS, julgamos de nosso dever enviar a V.Exa. os seguintes esclarecimentos sobre o assunto.

Cabe registrar que a pretendida venda de oito refinarias da Companhia, com capacidade de processamento de 1,1 milhão de barris/dia é, na verdade, a entrega de METADE DO MERCADO BRASILEIRO DE DERIVADOS DE PETRÓLEO, o sexto maior do mundo. Cerca de 400 milhões de barris/ano ou algo como 65 bilhões de litros.

A Constituição Federal deu ao mercado interno o status de patrimônio nacional.

“Art. 219. O mercado interno integra o patrimônio nacional e será incentivado de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e sócio-econômico, o bem-estar da população e a autonomia tecnológica do País, nos termos de lei federal.”

A operação pretendida pela direção da PETROBRÁS afronta a Carta Magna na medida em que resultará na entrega de parte significativa do PATRIMÔNIO NACIONAL, a empresas e/ou Fundos de Investimentos estrangeiros, agravando a avassaladora desnacionalização de nossa economia.

Estudo recente do Departamento de Engenharia Industrial da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro concluiu pela alta possibilidade da formação de monopólios privados regionais, uma vez que as refinarias em questão foram planejadas e implantadas para abastecimento de áreas bem definidas geograficamente. O estudo aqui mencionado pode ser acessado em:

http://www.mme.gov.br/documents/36220/1049490/2020-05-19+-+Comercializacao+de+Biodiesel+-+Brasilcom+%28PUC%29.pdf/6066bbf9-1594-ee34-453f-642076eae714

A formação de monopólios privados em uma indústria como a do petróleo – produto estratégico – fundamental para a segurança energética, econômica e militar do país certamente não é conveniente para os consumidores. Tampouco para a SOBERANIA NACIONAL. 

Os Constituintes de 1988 registraram as suas preocupações quanto às ameaças indicadas acima, conforme cautelas insculpidas na Carta Magna.

A SOBERANIA NACIONAL, artigo 1º da CF é o primeiro dentre os princípios fundamentais da República. A ORDEM ECONÔMICA (Título VII também deve observar o Princípio da SOBERANIA) (Artigo 170 Inciso I) e os abusos do Poder Econômico devem ser reprimidos pelo Estado, conforme artigo 173 Parágrafo 4º:

“A Lei reprimirá o abuso do Poder Econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.”

Desnecessário registrar que a posição dominante da PETROBRÁS, QUE EXERCE O MONOPÓLIO CONSTITUCIONAL DA UNIÃO, é absolutamente diferente dos malefícios causados pelos monopólios privados estrangeiros. A posição da PETROBRÁS no mercado decorre do interesse público, do interesse nacional e é legitimada pelos artigos 173 e 177 da CF.

“Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.”

“Art. 177. Constituem monopólio da União:

II – a refinação do petróleo nacional ou estrangeiro;”

Para a AEPET não há dúvidas de que a pretendida transformação das refinarias em subsidiárias, não passa de manobra mal intencionada, para burlar decisão desse Egrégio Tribunal que impõe a apreciação legislativa ao processo de desestatização de empresas-mãe estatais.

As refinarias sempre foram UNIDADES OPERACIONAIS da PETROBRÁS e transformá-las em subsidiárias é artifício enganoso para entregá-las ao capital privado.

Veja-se o caso da RLAM – Refinaria Landulpho Alves de Mataripe, a mais antiga da Companhia, que está completando setenta anos. Nunca houve necessidade de transformá-la em subsidiária como se pretende fazer agora!

Sobre o sucesso da RLAM como Unidade Operacional da PETROBRÁS, transcrevemos, abaixo, resumidamente, notícia de O ESTADO DE SÃO PAULO, 30.06.2020:

“A crise global tem provocado uma reviravolta na indústria petroleira. No Brasil, gerou uma reconfiguração nas refinarias da Petrobrás. Pela primeira vez em uma década, uma unidade da Bahia lidera hoje a produção de combustíveis, assumindo posição antes ocupada por São Paulo. Isso acontece porque a Rlam, instalada no município de São Francisco do Conde (BA), é a mais capacitada para fabricar os derivados de consumo marítimo que têm sustentado a estatal neste período de escassez – o bunker oil e correntes de óleo combustível de baixo teor de enxofre (bte).”

A direção da PETROBRÁS negocia a venda da RLAM com o Fundo de Investimentos estrangeiro MUBADALA, dos Emirados Árabes Unidos ao qual foi, estranhamente, concedida exclusividade nos entendimentos.

Os que defendem a venda das Refinarias argumentam ser necessário atender ao TCC – Termo de Compromisso de Cessação, que a Companhia firmou com o CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica.

Sobre este argumento a AEPET julga necessário esclarecer que o TCC resultou de denúncias apresentadas ao CADE pela ABICOM – Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis, entidade fundada recentemente, em 2017, integrada por oito empresas. A ABICOM acusou a PETROBRÁS de práticas anticoncorrenciais. O CADE instaurou procedimento preliminar, que nada apurou, sendo o processo arquivado, pois a direção da PETROBRÁS, SEM DEFENDER A COMPANHIA DAS ACUSAÇÕES, INEXPLICÁVEL E ESPONTANEAMENTE OFERECEU-SE PARA CELEBRAR O TCC COMPROMETENDO-SE A SE DESFAZER DAS OITO REFINARIAS E DE OUTROS ATIVOS ESTRATÉGICOS E MUITO LUCRATIVOS. Registre-se que, em nenhum momento, a ABICOM pleiteou ou s ugeriu a venda das Refinarias. Acrescente-se que, contra a celebração do TCC, em votos vencidos (3 x 2) manifestaram-se dois Conselheiros do CADE (PAULA FARANI DE AZEVEDO SILVEIRA e JOÃO PAULO DE RESENDE).

A AEPET entende ter ficado esta situação não resolvida, cabendo as seguintes indagações:

– Considerada a denúncia da ABICOM por que o CADE não levou as investigações até o final?

– Por que a PETROBRÁS não se defendeu, provando serem as denúncias improcedentes e, nesta hipótese, processando a ABICOM?

– A omissão dos dirigentes da PETROBRÁS, não defendendo a Companhia limitando-se a oferecer, espontaneamente, a venda de valiosos ativos, FAVORECENDO CONCORRENTES, não configura ABUSO DO ACIONISTA CONTROLADOR, conforme previsto na Lei das Sociedades Anônimas (Lei 6404/76)?

– A ABICOM denunciou a PETROBRÁS para defender a concorrência, em benefício dos consumidores, ou motivada por interesse em apossar-se do mercado da PETROBRÁS, obrigando-a a praticar preços mais elevados, decorrentes da política de preços, estabelecida, em 2016 na administração PEDRO PARENTE, prejudicial aos consumidores, à economia nacional, ao país e à própria PETROBRÁS (veja-se, a propósito, o artigo VENDER MAIS BARATO É CRIME, de autoria do engenheiro DIOMEDES CESÁRIO DA SILVA, ex-presidente da AEPET).

https://www.aepet.org.br/w3/index.php/conteudo-geral/item/2170-vender-mais-barato-e-crime#:~:text=Quando%20a%20Petrobras%20%C3%A9%20acusada,est%C3%A1%20tomando%20o%20caminho%20errado.&text=Quanto%20aos%20acionistas%2C%20est%C3%A3o%20tendo%20a%20lucratividade%20que%20o%20neg%C3%B3cio%20permite.

Cabem aqui considerações sobre o argumento de que a venda das Refinarias, estimulando a concorrência, com entrada de novos atores, beneficiaria os consumidores.

Desde a Lei do Petróleo (9478/97), portanto há mais de 23 anos, não há restrições legais à implantação de refinarias no Brasil. Qualquer empresa, privada ou estatal, nacional ou estrangeira, pode fazê-lo, desde que se disponha a investir. As condições são favoráveis. O mercado brasileiro, além da grande dimensão, tem consumo per capita moderado, (cinco vezes menor que o da NORUEGA). Boas perspectivas de crescimento.

Os grupos, quase todos estrangeiros, nada investiram. Preferem adquirir as Unidades da PETROBRÁS. Em operação, amortizadas, com retorno financeiro imediato. Exigem PREÇOS DE PARIDADE DE IMPORTAÇÃO (PPI) e não admitem qualquer controle ou regulação governamental. Tais condições são favoráveis aos consumidores? Compatíveis com a SOBERANIA do Estado Brasileiro que não pode abrir mão de um mínimo de regulação sobre uma indústria estratégica como a do petróleo?

Por outro lado, a privatização das refinarias, uma mera troca no controle dos ativos, nada acrescenta à capacidade de processamento do país, hoje já importador de derivados.

A construção de novas refinarias, inclusive em parcerias com a PETROBRÁS, estimularia o emprego, a renda, novas tecnologias, a contratação de serviços de engenharia e a aquisição de materiais e equipamentos.

As sucessivas gestões da PETROBRÁS, desde 2016, cometem grave erro estratégico, limitando os investimentos em refino exclusivamente à manutenção e operação.

Com o crescimento acelerado da produção de petróleo do PRÉ-SAL, aumentará muito a exportação de cru, sem beneficiamento, e, também, a importação de derivados. O Brasil perde nas duas operações.

Esperando ter levado a V.Exa. informações úteis sobre matéria da maior relevância para o país, permanecemos a disposição para os esclarecimentos adicionais julgados necessários.

Receba V.Exa. nossas atenciosas saudações.

Ricardo Moura de Albuquerque Maranhão

Diretor

AEPET – Associação dos Engenheiros da PETROBRÁS