Não se deve levar muito a sério a atitude recente de um humorista de TV que, dublê de frentista de posto de combustível, fez campanha contra os impostos brasileiros. Até pode parecer uma atitude patriótica, altruísta, mas na verdade presta-se a escamotear um ataque coordenado, por parte de parcelas do empresariado, às políticas sociais e de transferência de renda.
Um dos argumentos mais comuns para atacar os impostos é de que o governo gasta demais com o funcionalismo e o "inchaço da máquina". Vejamos dados recentes, divulgados pela Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda. Em 2002, último ano de FHC, o governo federal gastava 4,81% do PIB com pagamento de pessoal. Em março de 2010, depois de tanta "gastança", "irresponsabilidade", "aparelhamento" e outras imprudências atribuídas ao governo Lula, a União gastava com a folha de pagamento dos servidores, bem, como dizer, os mesmos 4,81% do PIB. Houve investimentos na reconstrução do sistema público, mas acompanhando – e estimulando – o crescimento econômico.
Por outro lado, na rubrica programas de transferência de renda, em 2002, o governo anterior investia 6,4% do PIB. Em março de 2010, esses investimentos saltaram para 9,1% do PIB. Uma diferença e tanto.
Então, se aumento real há em relação ao PIB, é o dos investimentos em políticas sociais. Exigir queda brusca dos impostos significa querer sacrificar diretamente os programas sociais. É isso que a propaganda enganosa do fim dos impostos quer esconder.
Outra argumentação que não se sustenta diante dos dados é a de que o governo anterior era mais comedido na tributação. Entre 1998 e 2002, período do segundo mandato FHC, marcado por momentos de forte retração da economia, a carga tributária da União subiu 3,32%. Em sete anos de governo Lula, a quantidade de impostos arrecadados pela União subiu 1,02%. O apetite tributário dos tucanos é maior, como se vê pelo comparativo. Quando voltarmos a este espaço no GLOBO, poderemos deixar isso ainda mais evidente, a partir das políticas do ex-governador Serra em São Paulo.
Para a classe trabalhadora, mais importante é debater a qualidade dos gastos, as prioridades, e garantir que o Estado esteja realmente a serviço da maioria. E também mudar a estrutura de tributos atual, em que famílias que ganham até dois salários mínimos pagam quase 49% de sua renda mensal em impostos, enquanto quem ganha acima de 30 salários mínimos por mês paga 26,3%. Então, outro desafio é criar um modelo tributário progressivo: quem ganha mais, paga mais. Quem ganha menos, paga menos. A CUT sempre defendeu uma reforma tributária que acabe com a regressividade. Recentemente, o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social – composto por representantes de diversos segmentos da sociedade, incluindo o empresariado – aprovou a proposta, incluída na Agenda para o Novo Ciclo de Desenvolvimento. Portanto, cresce a adesão à ideia.
*Artigo publicado originalmente na edição do dia 12 de julho do Jornal O Globo